Será que o TikTok está ajudando a “fritar” nossos cérebros?

As redes sociais estão constantemente monitorando nossa atenção e usando esses dados para nos manter viciados nas plataformas. Mas isso tem um custo

Crédito: Antonio Solano/ iStock

Colin McCormick 5 minutos de leitura

É sabido que as redes sociais podem ter um impacto negativo na saúde mental, fato inclusive reconhecido por uma pesquisa interna vazada do Facebook. No entanto, os efeitos que podem ter sobre nossas habilidades cognitivas são menos conhecidos.

Como doutorando em ciência cognitiva, estudo os diversos processos que nosso cérebro utiliza para manter o foco. A atenção não é um mecanismo único, mas sim o resultado de vários outros, em diversas áreas do cérebro.

Um deles é a função executiva, definida como a capacidade de focar em uma determinada tarefa e filtrar distrações. Mas é claro que nem todas as tarefas são iguais. É mais fácil manter o foco quando elas são envolventes e divertidas.

PROJETADO PARA ATRAIR A ATENÇÃO

Para nos manter entretidos, as redes sociais monitoram constantemente todo o conteúdo com o qual interagimos. Isso inclui não apenas o que “curtimos”, mas também o tempo que passamos em cada um deles. Dessa forma, o aplicativo sugere conteúdos relacionados para fazer com que os usuários fiquem na plataforma pelo maior tempo possível.

nem todas as tarefas são iguais. É mais fácil manter o foco quando elas são envolventes e divertidas.

O modo como as redes sociais apresentam o conteúdo é crucial, já que muitas utilizam o formato de rolagem infinita. O objetivo é que o usuário entre em um “estado de fluxo”, no qual ele se sente tão envolvido que perde a noção do tempo.

Embora possa ser extremamente vantajoso no ambiente de trabalho – uma vez que ajuda a manter o foco e aumenta a eficiência – as redes sociais tentam induzir esse estado para que seja mais difícil para os usuários saírem da plataforma.

Resumindo, elas estão constantemente monitorando nossa atenção e usando esses dados para nos manter viciados. Com a maioria dos usuários acessando as redes sociais pelo menos uma vez por dia e um terço dos adolescentes usando esses aplicativos “quase constantemente”, surge a questão de se elas estariam prejudicando nossa capacidade de atenção.

O CUSTO DA ALTERNÂNCIA DE TAREFAS

Muitas pessoas entram em modo multitarefa durante o dia, alternando entre o trabalho e as redes sociais. De acordo com uma pesquisa realizada com estudantes do ensino médio e fundamental, adolescentes costumam acessar plataformas sociais menos de seis minutos após começar uma atividade.

Sem dúvida, alguns tipos de multitarefa são inofensivos, como caminhar e mascar chiclete ao mesmo tempo. No entanto, não é possível fazer o mesmo quando as atividades compartilham mecanismos cognitivos. Nesses casos, entramos na chamada “alternância de tarefas”, que envolve intercalar duas atividades relacionadas.

toda vez que você abre as redes sociais enquanto estuda ou trabalha, fica mais lento e propenso a erros.

Imagine tentar ler enquanto conversa. Não é possível sem interromper uma dessas atividades, já que ambas envolvem processamento de linguagem. As redes sociais e a maioria das nossas obrigações no trabalho se enquadram nessa categoria.

Um dos problemas de intercalar tarefas está no “custo de alternância”, um termo usado para descrever o efeito negativo que retomar uma atividade tem na cognição. Isso significa que toda vez que você abre as redes sociais enquanto estuda ou trabalha, fica mais lento e propenso a erros por algum tempo.

Não é surpreendente que pessoas que consomem vários formatos de mídia ao mesmo tempo demonstrem queda na atenção sustentada, ou seja, na capacidade de manter o foco. Vinte minutos seguidos de trabalho é muito melhor do que blocos de quatro ou cinco minutos alternados com pausas para acessar redes sociais.

E QUANTO À FUNÇÃO EXECUTIVA?

Pesquisadores têm alguma noção sobre como o vício em redes sociais pode afetar a cognição. A dependência de um usuário é determinada com base em um questionário com perguntas sobre como as plataformas sociais afetam o humor, se a pessoa experimenta sintomas de abstinência e se isso causa algum impacto negativo em diferentes áreas da sua vida.

pessoas que consomem vários formatos de mídia ao mesmo tempo demonstram queda na atenção sustentada.

Aqueles que se encaixam nesse perfil tendem a ser mais impulsivos do que usuários não viciados, conforme medido por uma avaliação de risco. Costumam fazer escolhas mais arriscadas, que estão associadas a perdas a longo prazo.

No entanto, em geral, indivíduos dependentes de redes sociais apresentam o mesmo nível de desempenho em avaliações cognitivas, o que indica que o principal componente da cognição afetado é a impulsividade.

TRENDING TOPICS COMO MEDIDA DE ATENÇÃO

Até que haja mais pesquisas sobre o uso das redes sociais e seus efeitos na atenção, podemos examinar fontes alternativas de dados para fazer algumas previsões preliminares.

o principal componente da cognição afetado pelas redes sociais é a impulsividade.

Um grupo de cientistas analisou quanto tempo as hashtags permanecem no top 50 para avaliar o tempo de atenção. Eles descobriram que, em 2013, uma hashtag permanecia no topo, em média, por 17,5 horas.

Esse número diminuiu gradualmente para 11,9 horas em 2016. Isso pode refletir como a capacidade de atrair nossa atenção diminui à medida que mais conteúdos se tornam disponíveis.

Recentemente, surgiu uma tendência no TikTok de usar a tela dividida para assistir a vários vídeos ao mesmo tempo. Trata-se de um novo comportamento multitarefa em relação a mídias, no qual um espectador pode desviar o olhar para outra fonte de conteúdo assim que sentir algum nível de tédio.

Embora mais pesquisas sejam necessárias para determinar possíveis custos cognitivos associados a esse novo estilo de mídia, a tendência sugere uma crescente preferência por conteúdo que demande menos esforço de atenção.

Este artigo foi publicado originalmente em The Conversation e reproduzido sob licença Creative Commons. Leia o original.


SOBRE O AUTOR

Colin McCormick é doutorando em ciência cognitiva na Dalhousie University. saiba mais