Transporte público sob demanda pode substituir os velhos ônibus

Agências de trânsito querem se tornar mais flexíveis, oferecendo uma alternativa para acabar com as longas esperas nos pontos de ônibus

Crédito: Egor Litvinov/ Unsplash

Jenni Bergal 5 minutos de leitura

Shudiara McMillian não tem carro e depende do transporte público de sua cidade, Wilson, na Carolina do Norte, para se locomover, seja para chegar ao trabalho, fazer compras ou ir a uma consulta médica.

Há dois anos, isso significava esperar por muito tempo em um ponto de ônibus, já que eles passavam de hora em hora. Além disso, muitas vezes ela era obrigada a cruzar toda a cidade, enquanto o ônibus pegava e deixava passageiros, para finalmente chegar ao seu destino.

Agora, quando Shudiara, funcionária do departamento de serviços públicos da cidade, precisa de transporte, pode solicitá-lo através de um aplicativo em seu smartphone. Uma minivan Toyota Sienna do serviço municipal de trânsito RIDE vai buscá-la em um local próximo e levá-la ao seu destino.

O transporte público sob demanda, também chamado de microtrânsito, está se tornando cada vez mais popular nos Estados Unidos, principalmente em pequenas cidades, nos subúrbios e em áreas rurais.

Inspirada na Uber e na Lyft, a ideia é dar a opção de a pessoa solicitar uma corrida – geralmente em uma pequena van ou ônibus – por aplicativo ou telefone, pagando uma pequena tarifa. O motorista pega o passageiro e o deixa em um ponto próximo de onde ele quer ir.

As agências de trânsito querem se tornar mais flexíveis e responsivas, oferecendo uma alternativa aos passageiros para acabar com as longas esperas nos pontos de ônibus. Também esperam atrair novos passageiros que moram longe das rotas do transporte público.

Algumas cidades estão usando o microtrânsito para cobrir áreas que nunca tiveram acesso a transporte público.

“Essa iniciativa está tentando tornar o transporte público o mais relevante possível em comunidades que não conseguem manter linhas de ônibus fixas com intervalos curtos entre um e outro”, explica Scott Bogren, diretor executivo da Community Transportation Association of America (Associação de Transporte Comunitário da América), um grupo comercial que representa operadores menores de trânsito.

CUSTO/ BENEFÍCIO

Alguns analistas argumentam que o microtrânsito é um mau negócio para órgãos públicos, por ser caro e ineficiente. Segundo essa visão, as agências de trânsito deveriam se concentrar em aumentar o número de passageiros nas rotas atuais, adicionando serviços mais frequentes e fazendo melhorias.

Um número cada vez maior de agências de trânsito está repensando a maneira como operam, especialmente a partir da pandemia de Covid-19, período em que tiveram que lidar com a queda expressiva no número de passageiros, perda de receita e trabalho remoto. Também perceberam que precisavam melhorar o serviço para trabalhadores essenciais, que necessitavam do transporte público durante a pandemia.

As agências estão usando o microtrânsito para cobrir áreas que nunca tiveram acesso a transporte público ou para ampliar o serviço que já prestam. Algumas estão substituindo rotas de ônibus com baixa ocupação pela opção sob demanda. Outras estão eliminando inteiramente algumas rotas fixas e substituindo-as pelo microtrânsito. 

Cidades grandes também estão experimentando essa alternativa. Em Austin, no Texas, a CapMetro opera o Pickup, um serviço sob demanda em 11 zonas da cidade. Eles substituíram uma rota de ônibus, redirecionaram outras e adicionaram serviços que não havia antes.

Algumas agências passaram a oferecer serviços sob demanda comprando softwares de empresas privadas, mas utilizando seus próprios funcionários e veículos. É assim que a SporTran, de Shreveport, na Louisiana, opera. Ela conta com 47 pontos onde os passageiros podem utilizar o transporte. O principal objetivo é dar acesso a áreas rurais fora das rotas padrão.

A iniciativa busca tornar o transporte público o mais relevante possível em comunidades que não conseguem manter linhas de ônibus fixas.

Outras agências contratam empresas privadas para operar todo o serviço sob demanda. É o caso da cidade de Shudiara, onde os ônibus cobriam apenas 40% do território da cidade e transportavam 1.450 passageiros por semana, em média. Agora, o RIDE cobre quase 100% da cidade e transporta entre 3,7 mil e 3,9 mil passageiros por semana.

A cidade gasta cerca de US$ 1,7 milhão por ano no programa, contra US$ 1,3 milhão do modelo anterior. Os passageiros do RIDE pagam US$ 1,50 por viagem ou podem comprar um passe de US$ 10 para 10 viagens. Idosos ou pessoas com deficiência têm desconto e podem pedir para que o transporte as pegue em casa.

DESVANTAGENS

O microtrânsito, no entanto, tem limitações inerentes. De acordo com o TransitCenter, um grupo de pesquisa sem fins lucrativos, o serviço envolve trajetos mais longos, um número menor de passageiros transportados e custo muito mais alto do que uma rota comum de ônibus.

A entidade argumenta que cada dólar gasto em microtrânsito é um dinheiro que as agências deixam de aplicar em estratégias mais econômicas para ampliar o número de passageiros, como aumentar a frequência nas principais rotas ou fazer melhorias nos pontos de ônibus.

O microtrânsito envolve trajetos mais longos, menos passageiros transportados e custo muito mais alto do que o dos ônibus.

O serviço sob demanda é uma saída ruim para atender a maioria dos passageiros, alerta Hayley Richardson, diretora de comunicação da TransitCenter. “Estamos sempre ouvindo que seria a solução para a queda na quantidade de passageiros. Não é”, afirma. Para rotas com menos de seis passageiros por hora pode fazer sentido, segundo Hayley, mas a maioria transporta mais gente que isso.

Na última década, algumas agências de trânsito descobriram que o microtrânsito não atraía passageiros suficientes ou era muito caro. Muitas, no entanto, estão apostando nessa alternativa mais uma vez. Bogren, do grupo de operadores de trânsito, diz que as agências estão interessadas em aprender com seus acertos e erros.

“A oposição ao microtrânsito é míope. Dizer ‘criamos uma rede de rotas fixas e cabe à população se adequar a elas’ é algo que não funciona. Uma boa parte da população simplesmente não vai fazer isso e deixará de ser atendida.”

Bogren afirma que a maioria dos 1,2 mil membros de seu grupo está explorando opções sob demanda para ver se fazem sentido. “Este é o futuro. A maioria das agências de trânsito está usando o microtrânsito ou se preparando para adotá-lo. Aqueles que continuarem a ignorar isso, sairão perdendo.” 


SOBRE A AUTORA

Jenni Bergal é jornalista e cobre as áreas de transporte, infraestrutura e cibersegurança. saiba mais