Um campo no qual inteligência artificial não é melhor que humanos: previsão do tempo

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Russ Schumacher e Aaron Hill 5 minutos de leitura

Há um século, o matemático inglês Lewis Fry Richardson propôs uma ideia surpreendente para a época: construir um sistema baseado em matemática para prever o clima. Em seu livro de 1922, “Previsão do tempo por processo numérico”, Richardson tentou escrever uma equação que pudesse usar para resolver a dinâmica da atmosfera com base em cálculos.

Mas não funcionou porque não se sabia o suficiente sobre a ciência da atmosfera naquela época. “Talvez algum dia seja possível realizar cálculos de forma mais rápida e a um custo menor. Mas isso é só um sonho”, concluiu.

Um século depois, as previsões meteorológicas se baseiam nos cálculos complexos que Richardson imaginou e se tornaram ainda mais precisas. Especialmente nas últimas décadas, o progresso constante em pesquisa, dados e computação permitiu uma “revolução silenciosa da previsão numérica do tempo”.

Como em muitos outros campos da ciência, a proliferação de ferramentas como inteligência artificial e machine learning proporcionou um grande avanço para a previsão do tempo. Vimos um pouco do que é possível na nossa pesquisa sobre a aplicação de machine learning em previsões. Mas também acreditamos que, embora essas ferramentas abram novas possibilidades para melhores previsões, grande parte do trabalho é feito melhor por pessoas experientes.

PREVISÕES BASEADAS NO HISTÓRICO

Hoje, as principais ferramentas meteorológicas são modelos numéricos de previsão do tempo. Esses modelos usam observações do estado atual da atmosfera vindas de fontes como estações meteorológicas, balões meteorológicos e satélites e resolvem equações sobre o movimento do ar.

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Eles são excelentes na previsão da maioria dos casos, mas, quanto menor for um evento climático, mais difícil será de prever. Por exemplo, uma tempestade de um lado da cidade e nenhuma chuva do outro. Além disso, meteorologistas experientes são excepcionalmente bons em sintetizar o enorme volume de informações que precisam ser consideradas, mas a memória humana e a capacidade de processar tantos dados não são infinitas.

A inteligência artificial e o machine learning podem ajudar com alguns desses desafios. Hoje, os meteorologistas usam essas ferramentas de várias formas, inclusive fazendo previsões de clima de alto impacto (inundações, secas, tempestades e ondas de calor) que os modelos numéricos não podem fornecer.

Em um projeto que começou em 2017 e fez parte de um artigo científico de 2021, focamos em chuvas fortes. Claro, parte do problema é definir o que é “chuva forte”. Usamos observações de grandes acúmulos de chuva em cada área dos Estados Unidos, junto com um histórico de previsões feitas usando um modelo numérico.

Adicionamos todas essas informações a um algoritmo de machine learning conhecido como “random forests”, que usa várias árvores de decisão para separar conjuntos de dados e prever a probabilidade de resultados diferentes. É uma ferramenta que prevê chuvas fortes o suficiente para causar inundações repentinas.

Previsão de chuvas excessivas feita pelo sistema de machine learning da Colorado State University para chuvas extremas associadas aos remanescentes do furacão Ida nos estados norte-americanos do meio do Atlântico, em setembro de 2021. À esquerda, a probabilidade de chuvas excessivas, disponível na manhã de 31 de agosto, mais de 24 horas antes do evento. À direita, as observações resultantes de chuvas excessivas. O programa de machine learning destacou corretamente o corredor onde ocorreriam chuvas fortes e inundações generalizadas

Os pesquisadores também estão incorporando o machine learning em modelos numéricos de previsão do tempo para acelerar tarefas que podem ser feitas por computação, como prever como o vapor de água é convertido em chuva, neve ou granizo.

É possível que o machine learning possa substituir completamente os modelos tradicionais de previsão do tempo. Em vez de resolver um conjunto de equações complexas como fazem, processariam milhares de mapas de clima para aprender como os sistemas climáticos tendem a se comportar. Então, usando dados atuais, fariam previsões meteorológicas com base no que aprenderam.

Alguns estudos mostram que os sistemas de previsão baseados em machine learning podem prever padrões climáticos gerais, assim como modelos numéricos de previsão do tempo, usando apenas uma fração do poder de computação que exigem.

Previsão do sistema de machine learning da Colorado State University para o surto de clima severo, em 15 de dezembro de 2021, no meio-oeste dos EUA. As imagens ilustram a progressão de oito (canto inferior direito) a três dias de antecedência (canto superior esquerdo), juntamente com indicadores de clima severo (tornados em vermelho, granizo em verde, vento prejudicial em azul)

O PAPEL DA EXPERIÊNCIA HUMANA

Há também razões para ter cautela. Ao contrário dos modelos numéricos, os sistemas de previsão que usam machine learning não se baseiam nas leis da física. Portanto, é possível que produzam resultados irreais – por exemplo, prever temperaturas extremas além dos limites da natureza. E não está claro como eles se comportarão durante fenômenos climáticos altamente incomuns ou sem precedentes.

Outra questão central é como incorporar esses novos avanços na previsão. Encontrar o equilíbrio certo entre ferramentas automatizadas e o conhecimento de especialistas tem sido um desafio na meteorologia. Os rápidos avanços tecnológicos só tornarão as coisas mais complicadas.

O que esperamos é que a IA e o machine learning permitam que os meteorologistas façam seu trabalho com mais eficiência, gastando menos tempo em previsões de rotina e mais na comunicação das implicações e dos impactos para o público ou para seus clientes. Acreditamos que a colaboração entre cientistas, meteorologistas e o público geral é a melhor maneira de alcançar isso e gerar mais confiança nas previsões feitas por máquinas.


SOBRE O AUTOR

Russ Schumacher é professor associado de ciência atmosférica e climatologista e Aaron Hill é cientista pesquisador, ambos na Colorado ... saiba mais