Varíola dos macados: TikTok ajuda médicos a combater desinformação

Dois anos e meio depois do início da Covid-19, médicos voltam a utilizar as redes sociais para alertar sobre o surto de varíola dos macacos

Crédito: Branimir Balogović/ Unsplash/ Freepik/ CDC

Jessica Bursztynsky 4 minutos de leitura

Por quase um minuto, os usuários do TikTok podem ouvir uma pessoa chorando com o som de um chuveiro ligado ao fundo, dizendo que nem consegue descrever a dor. O vídeo é coberto por um grande balão de texto, ofuscando o rosto do paciente. Na legenda, o gastroenterologista Carlton Thomas faz um alerta honesto e assustador: “a agonia da varíola dos macacos é real”.

Thomas vem publicando regularmente conteúdos sobre a doença desde o final de junho, o que significa que ele começou a compartilhar informações com seus quase 270 mil seguidores do TikTok semanas antes de a Organização Mundial da Saúde (OMS) declará-la emergência global de saúde.

“Acho que ouvir o sofrimento e ver histórias reais sobre o que está acontecendo ajuda a acabar com a falsa narrativa de que se trata de uma doença indolor e mostra o quão séria ela é”, diz ele. “Essa doença não deve ser menosprezada e os vídeos mostram exatamente isso.”

Thomas é apenas um dos muitos médicos que usam o TikTok para alertar os usuários sobre os riscos da varíola dos macacos, compartilhar informações sobre vacinas, incentivar testes e combater a desinformação.

É um fenômeno não muito diferente do que vimos nos primeiros dias da pandemia de Covid-19, quando médicos e outros profissionais de saúde provaram que as redes sociais são um recurso indispensável para a saúde pública. Dois anos e meio depois, eles estão mais uma vez utilizando as redes para alertar sobre o surto de varíola dos macacos.

Nos primeiros dias da pandemia de Covid-19, as redes sociais se mostraram indispensáveis para a saúde pública.

A maioria das pessoas ouve falar de um vírus que causa feridas extremamente dolorosas e aparentes, que chegam a durar semanas, e imediatamente se perguntam como podem se proteger.

Coisas do dia a dia como experimentar roupas em uma loja, usar uma toalha da academia, ir à manicure ou encostar em um assento de banheiro público passaram a causar ansiedade. “As pessoas estão muito preocupadas em contrair a doença em situações normais”, explica a Katrine Wallace, epidemiologista com quase 268 mil seguidores no TikTok.

DESINFORMAÇÃO E HOMOFOBIA

Grande parte da missão dos médicos no TikTok é desmentir a narrativa perigosa e homofóbica de que a varíola dos macacos é uma doença que apenas homens gays ou bissexuais contraem.

Como o vírus está se espalhando principalmente entre homens que fazem sexo com outros homens, as autoridades precisam manter um delicado equilíbrio entre direcionar recursos para a comunidade de maior risco e, ao mesmo tempo, não promover a falsa mensagem de que o mal só se espalha entre pessoas gays sexualmente ativas.

“Não há nada biológico em ser gay que faça com que você tenha um risco maior de contrair a varíola dos macacos. Acontece que essa ideia está se espalhando pelas redes sociais”, diz Wallace.

Parte da missão dos médicos no TikTok é desmentir que a doença atinge apenas homens homo ou bissexuais.

A necessidade de vídeos fáceis de entender surge no momento em que alguns passam a dizer que o governo falha em conter um vírus – uma alegação extremamente preocupante, já que os EUA têm o maior número de casos da doença no mundo.

É parecido com o que vimos nos primeiros dias da pandemia de Covid-19, quando havia longas filas de espera para testes e vacinas. Até o momento, o governo federal enviou mais de 600 mil doses da vacina contra a varíola dos macacos para os estados, de acordo com o Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos EUA.

Milhões mais estão a caminho, mas levará meses para que essas doses sejam produzidas e distribuídas. Isso levou alguns especialistas em saúde a se preocuparem com a possibilidade de os EUA não serem capazes de conter o surto – uma ansiedade gerada que comprova a importância das redes sociais.

CHECAGEM E REMOÇÃO

“Uma das razões pelas quais passei a usar redes sociais – e eu meio que culpo um pouco minha profissão por isso – é porque não havia pessoas ensinando sobre saúde”, conta Berry Pierre, clínico geral com 29 mil seguidores no TikTok. “Havia apenas gente que não sabia do que estava falando.”

A disseminação de informações falsas tornou-se algo comum. Algumas contas usam o TikTok para promover teorias conspiratórias, como a ilusão de que o surto foi criado para interferir nas eleições de meio de mandato de 2022.

O TikTok diz que está trabalhando com parceiros de checagem de fatos para ajudar a avaliar as postagens.

As diretrizes do TikTok proíbem a desinformação prejudicial, definida como conteúdo impreciso ou falso, incluindo “o enfraquecimento da confiança em instituições e processos cívicos, como governos, eleições e órgãos científicos”.

“Estamos removendo conteúdos que infringem nossas políticas. O TikTok não permite conteúdo que viole nossas diretrizes sobre desinformação médica. Estamos trabalhando com parceiros de checagem de fatos para ajudar a avaliar as postagens”, disse um porta-voz da rede social.

Para Wallace, o desafio é fazer com que os usuários entendam a diferença de magnitude entre a Covid-19 e a varíola dos macacos. “Quando você ouve falar de uma nova doença, fica com medo e pensa que vai pegá-la”, diz ela.

“Não estou dizendo para não se proteger e não se preocupar. Mas há muito mais risco de se contrair Covid em todas as situações que as pessoas me apresentam do que de pegar a varíola dos macacos”, garante a médica.


SOBRE A AUTORA

Jessica Bursztynsky é redatora da Fast Company e cobre economia gig e outras empresas de internet de consumo. saiba mais