Como e por que a ansiedade consegue matar a criatividade

Dependendo da situação, o medo e a ansiedade podem inspirar ou bloquear

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Arash Javanbakht 4 minutos de leitura

Os transtornos de ansiedade afetam cerca de 374 milhões de pessoas em todo o mundo. Sendo assim, não é de surpreender que um bom número de artistas e escritores também sofra com ansiedade e depressão.

Mas enquanto alguns críticos enxergam, as pinturas impressionistas de Van Gogh como o reflexo de sua psicose, ou a poesia confessional de Sylvia Plath como produto de sua depressão, eu evito romantizar esse assunto. Para mim, a produção brilhante desses artistas aconteceu apesar de – e não por causa de – seus sofrimentos psíquicos.

O medo, a ansiedade e o trabalho criativo estão mais interligados do que se imagina. Dependendo da situação, o medo e a ansiedade podem inspirar ou bloquear a criação. Mas, quando a ansiedade se torna insuportável, o trabalho criativo geralmente fica paralisado.

ANSIEDADE COMO OBSTÁCULO

A maneira mais comum pela qual a ansiedade pode atrapalhar a criatividade é desviando a atenção do trabalho para medos e preocupações. Se um escritor estiver preocupado com a possibilidade de perder o emprego, será mais difícil para ele se concentrar na escrita. A ansiedade excessiva impede a realização de qualquer tarefa não relacionada a ameaças, e as pessoas regridem para o modo básico de sobrevivência.

A maior parte da atenção, do pensamento e das emoções vai ficar focada em lidar com a fonte do perigo, seja ela real ou imaginária. E as mentes criativas são especialmente hábeis em imaginar coisas.

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Como o medo é uma questão de sobrevivência, as pessoas se tornam menos flexíveis e mais cautelosas quando estão ansiosas. Nessas horas, seguir por um caminho conhecido é muito mais atraente do que correr riscos e se aventurar no desconhecido. E a aversão ao desconhecido não leva ninguém a descobertas criativas.

Outra maneira pela qual o medo pode prejudicar a criatividade tem a ver com o temor da rejeição. Para criar algo realmente original, um artista precisa, muitas vezes, romper com o status quo. Portanto, é natural que qualquer esforço criativo leve ao medo de críticas, rejeição ou fracasso.

A estrada menos percorrida pode ser também a mais perigosa. E pode ser ingrata. Às vezes, o custo é a própria vida: o filósofo italiano Giordano Bruno morreu queimado em uma fogueira, em parte, por suas afirmações "profanas" de que a Terra não era o centro do universo.

QUANDO A ANSIEDADE INSPIRA

Isso não quer dizer que ser despreocupado seja um requisito para ser um artista. Algum nível de ansiedade pode servir a um propósito. Embora o medo possa ser paralisante, o tédio e a preguiça podem acabar com a motivação. Há um nível ideal de ansiedade que, de fato, estimula a motivação e a cognição e direciona toda a atenção para a tarefa em foco.

A maneira mais comum pela qual a ansiedade pode atrapalhar a criatividade é desviando a atenção do trabalho para medos e preocupações.

Com a aproximação do prazo de entrega de meu último livro, senti uma pontada de ansiedade que me levou a acelerar em direção à linha de chegada: Decidi me refugiar em um resort por duas semanas e trabalhar 12 horas por dia. A ansiedade de não cumprir o prazo foi suficiente para me inspirar a fazer o que era preciso.

Além disso, há o fantasma da morte. Ninguém escapa dela. No entanto, mesmo quando gênios como Michelangelo ou Charles Dickens tiveram o mesmo destino de seus semelhantes, suas pinceladas e palavras se tornaram eternas. O trabalho criativo é uma forma de alcançar um certo nível de imortalidade – arte, livros e artigos que perduram além da vida de quem os produziu.

Esse pavor existencial motivou autores e artistas a buscar uma forma de imortalidade por meio de seu trabalho. Para mim, é reconfortante saber que, depois que eu morrer, algumas de minhas descobertas científicas e escritos poderão continuar vivos por intermédio de outras pessoas.

CULTIVANDO A CRIATIVIDADE

Se você deseja criar algo, mas se sente inibido por algum bloqueio, hesitação ou insegurança, pense no tipo de medo que pode estar impedindo sua criatividade. É o medo do fracasso ou do julgamento? Medo de sua própria autocrítica? Ou há outro problema ou responsabilidade cotidiana que está consumindo a maior parte da sua atenção?

Dependendo da situação, o medo e a ansiedade podem inspirar ou bloquear a criação.

Depois de identificar a causa da ansiedade, veja se você consegue ressignificar o medo de uma forma mais objetiva que o liberte de suas limitações. Talvez você admita o fracasso como uma possibilidade, mas como algo que, no fim das contas, não vai te matar. Sempre é possível tentar mais uma vez. 

Outra opção é acionar o circuito de recompensa do cérebro – por exemplo, pensar nos possíveis resultados positivos do seu trabalho. Ou você pode usar o medo a seu favor, lembrando-se de um prazo ou de uma promoção que pode depender do trabalho ou da sensação desagradável de não concluir uma tarefa. Dividir o trabalho em partes também fará com que ele pareça menos assustador.

Assim como há muitos caminhos a serem seguidos em um processo criativo, há uma série de estratégias para combater ou aproveitar todos os pequenos medos que surgem ao longo do caminho.

Este artigo foi publicado originalmente no "The Conversation" e reproduzido sob licença Creative Commons. Leia o artigo original.


SOBRE O AUTOR

Arash Javanbakht é professor associado de psiquiatria na Wayne State University. saiba mais