Como transformar a resistência a mudanças em uma fonte de inovação

O verdadeiro avanço acontece quando você deixa de enxergar a resistência como inimiga e começa a ouvir o que ela está tentando dizer

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Amy Radin 3 minutos de leitura

Por muito tempo, achei que a resistência era algo a ser superado. Algo que você precisa enfrentar, ultrapassar, derrubar. Grande parte da minha carreira em transformações digitais foi baseada nessa ideia: tratava qualquer tipo de resistência como um obstáculo a ser eliminado, e não como uma oportunidade. Até que um projeto mudou completamente minha forma de enxergar as coisas.

Imagine a situação: 2006, uma grande empresa do setor financeiro e um projeto inovador para transformar a experiência digital dos clientes. Tínhamos a tecnologia, uma visão clara e o apoio da liderança. Só faltava uma coisa: adesão.

Foram dois anos enfrentando resistência interna até conseguirmos a aprovação para um teste-piloto. “É muito complicado”. “O setor de compliance nunca vai aprovar isso”. “Isso pode comprometer os resultados ‘garantidos’ do nosso modelo atual”. Era resistência por todos os lados.

Tentamos de tudo: apresentações, cases de sucesso, argumentos bem estruturados. Pressionamos. Insistimos. E nada. Quanto mais forçávamos, mais difícil ficava. O que eu não percebi era que estávamos seguindo um modelo que já não funcionava mais.

O PONTO DE VIRADA

Tudo começou a mudar em uma reunião particularmente difícil. No meio da frustração, ouvi um comentário que, em vez de parecer uma barreira, me soou como um pedido.

Quando disseram “não confiamos nessa ideia”, percebi que o que realmente precisavam era de segurança – queriam ter certeza de que aquela inovação não colocaria em risco a qualidade e a confiabilidade que sustentavam o sucesso da empresa.

Aquela “resistência” era, na verdade, um recado claro:

  • “Isso pode comprometer os resultados” virou “precisamos mostrar como a inovação pode fortalecer nosso histórico de sucesso”.
  • “É muito complicado” virou “precisamos de um plano de implementação que reduza os riscos”.
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  • “O setor de compliance não vai aprovar” virou “precisamos atualizar nossas políticas de governança para lidar com os novos riscos”.

Foi aí que deixei de tentar vencer a resistência e passei a escutá-la de verdade. Em vez de buscar convencer os céticos, percebi que o meu papel era criar uma ponte entre o que a tecnologia pode fazer e o que as pessoas precisam para confiar nela.

O MODELO DE ADVOCACIA ESTRATÉGICA

A partir dessa e de outras experiências, desenvolvi o que hoje chamo de advocacia estratégica – uma abordagem que substitui o antigo modelo hierárquico de gestão de mudanças por um processo mais colaborativo, que considera diferentes pontos de vista. Funciona mais ou menos assim:

  1. Encare a resistência como um recurso: toda objeção traz uma informação importante sobre o que é preciso para que a mudança aconteça. Se alguém desconfia de decisões baseadas em IA, isso indica que precisamos oferecer mais transparência. Se há medo de demissões, é sinal de que precisamos de um plano claro de transição.
  1. Entenda onde está a influência real: nem sempre quem tem cargo alto é quem influencia de fato. Muitas vezes, o poder está em redes informais – como aquele gerente que, mesmo sem estar no topo, tem a confiança de toda a equipe.
  1. Busque valores em comum: em vez de discutir detalhes técnicos ou funcionalidades, fale sobre princípios que todos compartilham. “Valorizamos a transparência”. “Apoiamos a criatividade humana”. “Adaptamos processos com responsabilidade”. Valores criam conexões que argumentos racionais, sozinhos, não conseguem.

DA RESISTÊNCIA À ADESÃO

Hoje, depois de mais de duas décadas trabalhando com inovação, posso afirmar: o modelo tradicional de gestão de mudanças – fragmentado e baseado em hierarquia e imposições – não funciona quando o objetivo é transformar de verdade.

após uma reunião difícil deixei de tentar vencer a resistência e passei a escutá-la de verdade.

Esse modelo parte do princípio de que a resistência é irracional e pode ser superada com mais comunicação ou treinamento. Mas a verdadeira mudança só é possível quando conseguimos unir diferentes pontos de vista e usar a resistência como bússola. Não se trata de impor, mas de articular. De criar alianças, não de controlar.

Não tente vencer a resistência. Aprenda a escutá-la. As pessoas que estão resistindo estão, na verdade, mostrando o caminho. Elas estão dizendo quais valores precisam ser respeitados, quais preocupações devem ser consideradas e quais pontos exigem mais atenção.

Então, pare e pense: qual resistência você está ouvindo na sua organização? E que pontes ela está pedindo para você construir?


SOBRE A AUTORA

Amy Radin é especialista em marketing, digital e inovação, consultora, palestrante, sócia da Pragmatic Innovation Partners e professor... saiba mais