Como treinar sua capacidade de liderar em situações desconfortáveis

Encarar as situações de desconforto promove a clareza necessária para resolver conflitos antes que eles aumentem

Crédito: Johnny Greig/ iStock

Rajkumari Neogy 5 minutos de leitura

A toxicidade no ambiente profissional é um problema grave, que certamente terá consequências negativas no futuro do trabalho. Um estudo realizado em 2022 pela McKinsey revelou que, em 15 países, o comportamento tóxico no local de trabalho foi o maior responsável pelo esgotamento e pela vontade de abandonar um emprego. A toxicidade representa mais de 60% dos fatores que contribuem para outros resultados negativos no trabalho.

Ninguém procura um emprego que o faça se sentir ansioso, desvalorizado, menosprezado ou inseguro. Então, como o comportamento tóxico se fez tão presente no espaço profissional? E, mais importante, o que podemos fazer para reduzir a toxicidade nesses espaços? 

o comportamento tóxico no local de trabalho é o maior responsável pelo esgotamento e pela vontade de abandonar um emprego.

Respondendo à primeira pergunta, o que leva a essa situação é uma desconexão entre funcionários e empregadores. As lideranças geralmente acham que a saúde mental e o bem-estar dos trabalhadores estão muito melhores do que estão na realidade.

Respondendo à segunda pergunta, as lideranças precisam urgentemente desenvolver a capacidade de encarar o desconforto de frente.  

O desconforto é muito... desconfortável. Instintivamente, buscamos nos distanciar dele e, por isso, essa não costuma ser a estratégia mais comum para a resolução de problemas. No entanto, o ato de encarar o desconforto de frente leva à clareza necessária para resolver conflitos antes que eles se agravem a ponto de prejudicar os resultados da equipe. 

Mas afinal, o que significa "encarar o desconforto" em um ambiente de trabalho? Confira a seguir o que quase 30 anos de estudos na interseção entre neurobiologia, cultura e empatia me ensinaram sobre como aplicar essa estratégia.  

ETAPA 1: RESPIRE FUNDO  

Para conseguir liderar em situações desconfortáveis, precisamos primeiro nos conectar com nosso corpo, controlando a respiração. A respiração profunda não é apenas uma prática de meditação ou ioga. Os chefes podem e devem usar a ciência por trás da respiração profunda em benefício da equipe.

as lideranças precisam urgentemente desenvolver a capacidade de encarar o desconforto de frente.

A respiração é um comportamento humano inato, controlado pelo sistema nervoso autônomo, o que significa que fazemos isso sem pensar. Mas, quando nos concentramos na forma como respiramos, promovemos mudanças físicas que podem alterar drasticamente nossas emoções. 

A pesquisa que ressalta os benefícios da respiração profunda é extensa. Um estudo de 2018 descobriu que as técnicas de respiração lenta promovem maior conforto, relaxamento, vigor e atenção e reduzem os sintomas de excitação, ansiedade, depressão, raiva e confusão. Em contraste com a respiração profunda, a respiração superficial (que fica no peito) eleva a sensação de estresse. 

De modo geral, a respiração profunda transmite segurança ao sistema nervoso. No ambiente de trabalho, o ritmo da respiração pode determinar a sensação de segurança ou de ameaça em uma sala – e o Zoom não é exceção.

ETAPA 2: DESENVOLVA A EMPATIA TÁTICA 

Em "Never Split the Difference" (Nunca separe a diferença), Chris Voss cunhou o termo "empatia tática" para se referir à compreensão do outro, ouvindo-o atentamente e refletindo sobre seu ponto de vista.

Isso não significa concordar sempre com tudo o que ouvimos, mas sim empenhar-se em acompanhar a perspectiva de um interlocutor para que ele se sinta compreendido. Sentir-se compreendido, em última análise, leva a um sentimento de confiança.

Um ambiente de segurança, confiança e igualdade é o estado físico que nos permite suportar com habilidade o desconforto.

Compreender as necessidades dos colegas e subordinados diretos permite que os líderes suavizem os sentimentos de rejeição social. Um estudo do MIT sobre a neurociência das necessidades sociais não atendidas sugere que esses sentimentos provocam emoções negativas, como angústia, depressão e ansiedade (ou resultados negativos no trabalho).

O uso da empatia tática oferece ao interlocutor a oportunidade de expressar seus sentimentos e se sentir compreendido, o que leva a um senso de inclusão social e segurança.

Portanto, a empatia tática gera confiança e uma mudança neuroquímica: de um momento regido pelo cortisol – um dos hormônios do estresse do corpo – para um momento de oxitocina – o hormônio da conexão e da afinidade.

Esse ambiente de segurança, confiança e igualdade é o estado físico que nos permite suportar com habilidade o desconforto.

ETAPA 3: FORTALEÇA AS CONEXÕES

A ressonância – a capacidade de criar ambientes de apoio, calmos e equilibrados por meio da comunicação verbal e não-verbal – também contribui para a capacidade de liderar em situações desconfortáveis.

Aprender com os momentos de desconforto é uma habilidade que todo chefe deve ter.

Quando a ressonância é transmitida, a pessoa sente que o outro entende sua experiência e entra em um relacionamento mais profundo com ele. Quando você tem essa experiência, se sente compreendido e reconhecido. Esse sentido de conexão gera um lugar seguro para explorar assuntos ou sentimentos desconfortáveis – o ápice do desconforto.

Tanto o hemisfério esquerdo do cérebro, que funciona de forma objetiva, quanto o hemisfério direito, enraizado na interatividade, são necessários para comunicar a ressonância.

Um líder deve fazer perguntas incisivas (hemisfério esquerdo) para convidar a uma conversa e, em seguida, envolver-se com atenção e incentivar respostas honestas (hemisfério direito). A combinação das duas partes do cérebro no trabalho desenvolve a ressonância e fortalece a conexão.

Aprender com os momentos de desconforto é uma habilidade básica que todo chefe deve ter. Sem ela, ignoramos as causas fundamentais da toxicidade no trabalho e perpetuamos culturas que nem mesmo os líderes mais empáticos conseguem mudar.


SOBRE A AUTORA

Rajkumari Neogy é CEO da ibelong, plataforma que oferece recursos sob demanda para ambientes de trabalho dedicados à criação de cultur... saiba mais