Cuidado com o que você deseja: como o poder transforma os líderes
O poder pode aprimorar nossos pontos fortes, mas também tende a ampliar nossos pontos fracos
Não importa se você se tornou um supervisor de linha de frente em sua primeira função de gerência ou se você já é o CEO de uma multinacional: a experiência de ser chefe muda qualquer pessoa.
Em parte, isso se deve simplesmente ao fato de os líderes se adaptarem aos desafios e às pressões inerentes a cargos de poder. São fatores como o leque mais amplo de responsabilidades, a maior complexidade das decisões e a carga de trabalho mais pesada.
No entanto, um número crescente de pesquisas mostra que outra parte do que o poder faz com as pessoas se dá em um nível mais profundo, alterando sutilmente, mas de forma fundamental, a maneira como os líderes pensam e se sentem. Esse processo é tão profundo que foi demonstrado que ele provoca mudanças na estrutura e na química do cérebro.
Agora, há cada vez mais evidências de que mudanças sociais mais amplas estão ampliando esses efeitos, aumentando os desafios para os líderes e os riscos para as empresas que eles comandam.
Na maioria das vezes, os mecanismos que afetam um líder são os mesmos, independentemente do seu nível. A única diferença é que, quanto mais alto você subir, mais forte será a pressão que esses mecanismos exercem e, portanto, maior será a probabilidade de você ser modificado por eles.
Três mecanismos se destacam como sendo os mais influentes.
1. Aumento da distância psicológica
A primeira coisa que o poder faz é aumentar a distância psicológica entre os líderes e as pessoas que eles lideram. O lado positivo é que o posicionamento dos indivíduos acima dos outros tende a fazer com que eles se sintam melhor consigo mesmos, aumentando a autoestima e a confiança – inclusive a ponto de torná-los mais propensos ao excesso de confiança.
O pode altera de forma fundamental a maneira como os líderes pensam e se sentem.
Isso também proporciona aos líderes uma visão mais holística, facilitando a visualização das coisas de forma mais abstrata, deixando de lado detalhes que poderiam distraí-los.
Mas esse pensamento mais abstrato também significa que os líderes têm maior probabilidade de recorrer a estereótipos e generalizações. E a distância psicológica envolvida em tudo isso torna os líderes mais propensos a objetivar as pessoas e a vê-las como recursos, além de menos capazes de ver as coisas pela perspectiva dos outros ou de entender como se sentem.
2. Distorção do fluxo de informações
O poder também altera o fluxo de informações de e para os líderes, mudando o que eles veem, ouvem e comunicam, em parte devido à maior distância criada pelo fato de ser o chefe.
Em primeiro lugar, aumenta a tendência dos líderes de confiar no que já sabem, tornando-os menos sensíveis às informações contextuais e menos capazes de ouvir as opiniões dos outros.
Isso, por sua vez, os deixa mais suscetíveis a vieses subjetivos. Para agravar tudo isso, como os líderes têm poder sobre os outros, é menos provável que as pessoas se abram com eles e contestem seus pensamentos.
3. Amplificação das vozes interiores
O terceiro mecanismo principal é potencialmente o mais importante: as pessoas com poder têm maior probabilidade de agir de acordo com suas emoções, preferências, personalidades, valores e metas pessoais. Em outras palavras, o poder amplifica as tendências naturais das pessoas.
Isso pode ser positivo, aumentando os pontos fortes. Mas também pode ampliar os pontos fracos. Portanto, se você tem tendência ao excesso de confiança, o poder geralmente aumenta essa tendência. Se é suscetível à indecisão, estar no comando pode piorar essa situação. E se você for mais focado em tarefas do que em pessoas, ser o chefe só prejudicará ainda mais sua capacidade de empatia.
É também por isso que o ditado que diz que “o poder corrompe as pessoas” é simplista demais e, em última análise, errado. Sim, a maior distância psicológica e a perspectiva distorcida parecem tornar algumas pessoas mais propensas a agir de forma egoísta e a achar mais fácil mentir.
Mas o poder não corrompe todo mundo. Na verdade, em algumas pessoas, ele aumenta o comportamento benevolente e baseado em princípios. Portanto, o poder não corrompe, apenas revela e amplia uma propensão à corrupção que já existia.
SISTEMA DE PESOS E CONTRAPESOS
Essas transformações geram implicações tanto para os líderes quanto para as organizações. Para os líderes, parte do desafio é que raramente se encontra uma organização que os apoie, ajudando-os a entender como podem identificar e lidar com os efeitos do poder.
Até que isso mude, os líderes precisam tomar medidas para se proteger. E o ponto de partida deve ser verificar até que ponto estão sendo objetivos, se mantendo bem informados e se conectando com as perspectivas dos outros. Ou seja, é preciso criar verificações e contrapesos para si mesmos.
o poder não corrompe, apenas revela e amplia uma propensão à corrupção que já existia.
No caso das organizações, é preciso falar mais abertamente sobre o poder e o papel que ele desempenha. No processo de seleção de lideranças, os responsáveis devem avaliar de forma mais explícita como as pessoas podem ser transformadas pelo poder.
Também é importante pesar com cuidado o que os líderes podem fazer pelo negócio e o que efetivamente vão fazer, por meio da forma como exercem poder. É necessário investir na preparação dos líderes para os desafios de como o poder vai mexer com eles.
Quer a gente admita ou não, o poder nos afeta. Ele pode aprimorar nossos pontos fortes, mas também pode ampliar os pontos fracos. Nos líderes, os aspectos que se tornam amplificados geram um efeito dominó sobre as pessoas que trabalham para eles.
Talvez não enxerguemos imediatamente esses efeitos, mas eles estão lá. A única coisa que podemos controlar é se nós – como líderes – tomamos medidas para compreendê-los e gerenciá-los da melhor forma possível.