Geração Z responde à IA no trabalho sem pânico, mas com escolhas pragmáticas

Novos dados mostram que jovens preferem reorientar carreiras para áreas seguras como saúde e educação, em vez de se perder em debates sobre automação

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Jeff Leblanc 5 minutos de leitura

O debate sobre inteligência artificial está ensurdecedor. Manchetes falam em disrupção, executivos discutem produtividade e especialistas divergem sobre prazos. Mas, em meio a tanto barulho, a reação da geração Z tem sido surpreendentemente silenciosa – e esse silêncio diz muito.

A substituição de empregos de entrada pela IA não é um risco distante, mas uma realidade que poucos querem admitir. Meus alunos sabem disso, e não encaram o assunto como coisa de ficção científica. O que vejo entre eles não é medo nem negação, e sim atitude.

Em vez de se perder em debates intermináveis, a geração Z está escolhendo clareza em vez de pânico, ajustando suas carreiras de forma discreta em busca de estabilidade – algo fácil de ignorar se ouvirmos apenas as discussões sobre o tema que geram tanto barulho.

Desde o ano passado, conversei com pelo menos uma dúzia de jovens da geração Z que mudaram completamente seus planos profissionais. Alguns trocaram de curso na faculdade; outros optaram por carreiras que chamam de “à prova de IA” – áreas que parecem mais seguras do que as opções que tinham em mente. Não se trata de casos isolados, mas de um padrão que começa a se consolidar em toda uma geração.

Uma pesquisa recente do Glassdoor confirma essa tendência: 70% dos jovens da geração Z relatam que a presença da IA no trabalho os fez repensar sua segurança profissional. Um estudante recém-formado no ensino médio me disse: “quero um emprego que um robô não consiga tirar de mim. Estou pensando em seguir para o setor industrial – principalmente construção civil.”

Outro, mais receptivo à inteligência artificial, contou: “estou considerando a área da saúde. É difícil imaginar um mundo em que a medicina não precise de humanidade.”

MUDANÇA SEM DRAMA

O que mais chamou minha atenção não foi o conteúdo das respostas, mas o tom: nada de drama, nada de declarações grandiosas sobre o futuro do trabalho e nenhum sinal de pânico. Apenas escolhas.

Nos movimentos silenciosos, fica claro que essa é uma geração que prefere agir a especular. Eles estão moldando o futuro não com slogans ou hashtags, mas com decisões conscientes e firmes.

Os GenZs estão moldando o futuro não com slogans ou hashtags, mas com decisões firmes e conscientes.

Os dados reforçam esse retrato. Um estudo recente mostrou que 65% da geração Z acreditam que apenas um diploma universitário não basta para protegê-los da disrupção da IA. Além disso, 53% consideram seriamente carreiras técnicas ou na indústria, enquanto 47% cogitam áreas centradas em pessoas, como saúde ou educação.

Essa mudança vai além do planejamento de carreira: é uma lição de adaptabilidade geracional. Os millennials precisaram se reinventar na recessão de 2008, quando os empregos desapareceram. A geração Z está fazendo o mesmo agora, mas com um detalhe diferente: o agente de mudança é a IA, e a resposta vem em forma de ação.

Essa capacidade de adaptação – mudar cedo, diversificar caminhos e construir resiliência sem esperar ter todas as respostas – pode ser o exemplo que gerações mais velhas terão de seguir em um mercado em constante transformação.

A RELAÇÃO COM “BICOS”

A mesma pesquisa mostrou que 57% da geração Z já têm algum tipo de trabalho paralelo. Quando perguntei sobre isso, nenhum dos jovens usou a palavra “bico”. Um disse simplesmente: “revendo roupas na Etsy – é basicamente isso”. Outro comentou: “restauro móveis nas horas vagas. Aprendi no TikTok”.

Para a geração Z, esses trabalhos não são tratados como “projetos pessoais” com identidade própria ou estratégias de branding. Fazem parte da vida.

Enquanto os millennials transformaram projetos paralelos em marcas ou perfis de empreendedorismo, a geração Z simplesmente vai lá e faz – de forma discreta. Essa postura mais silenciosa muitas vezes é confundida com falta de engajamento, quando, na verdade, eles estão construindo, testando e criando uma rede de segurança.

Mais do que prática, essa postura é quase instintiva, moldada pela instabilidade econômica. Esses trabalhos paralelos não buscam status ou validação, mas sim resiliência e tranquilidade.

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Se a postura reservada da geração Z já é reveladora, a chegada da geração Alpha promete ser ainda mais marcante. Como a primeira geração inteiramente nascida no século 21, eles estão crescendo totalmente imersos em tecnologia, fluência digital e mentalidade empreendedora desde cedo.

Pesquisas mostram que 76% da geração Alpha sonham em ser seus próprios chefes ou ter negócios paralelos, revelando um espírito empreendedor natural.

Os alphas estão crescendo com IA, telas e redes sociais como parte do cotidiano, não como novidade. Muitos vão entrar em um mercado de trabalho no qual dois terços das profissões ainda nem existem, exigindo agilidade e, talvez, a fusão entre trabalho principal e projeto paralelo desde o início.

Se os millennials deram uma “marca” aos seus projetos e a geração Z os normalizou, a geração Alpha pode simplesmente vivê-los sem precisar de rótulos – partindo da ideia de que ter múltiplas fontes de renda será o padrão.

A RELAÇÃO DA GERAÇÃO Z COM A CARREIRA

Já vimos esse roteiro antes. Os millennials se formaram em meio à recessão de 2008 e rapidamente perceberam que os empregos que lhes haviam sido prometidos – cargos de iniciante, trajetórias claras de promoção – tinham desaparecido ou encolhido.

Muitos mudaram para áreas que pareciam mais duráveis: tecnologia, saúde, educação. Nem sempre fizeram alarde sobre isso, mas a guinada acabou por remodelar setores inteiros. A geração Z está fazendo algo semelhante em resposta à inteligência artificial.

76% da geração Alpha sonham em ser seus próprios chefes ou ter negócios paralelos.

Os jovens não estão esperando que lhes digam para onde as coisas caminham, estão lendo os sinais e se mexendo. Em alguns casos, isso significa escolher estabilidade em vez de prestígio. Em outros, apostar ainda mais em projetos paralelos que oferecem autonomia e identidade além de um único empregador. A ansiedade é real, mas a resposta é prática.

Em um mundo noqual a disrupção acelera, o instinto de mudar rapidamente, experimentar paralelamente e construir múltiplos caminhos pode ser o modelo de que todos precisaremos. A geração Z está mostrando que resiliência não é apenas sobre resistência, é sobre agilidade, visão e a humildade de mudar de rumo antes que seja tarde demais.


SOBRE O AUTOR

Jeff LeBlanc é professor na Universidade Bentley e criador do Modelo de Liderança com Empatia Engajada (EELM), que foca em estratégias... saiba mais