Medalhistas mulheres provam que líderes amorosas vencem – e puxam outras

Atletas representam uma liderança baseada em amor e solidariedade, mostrando que vencer com graça inspira outras a seguirem pelo mesmo caminho

Crédito: Fast Company Brasil

Juliana de Faria 3 minutos de leitura

A visão clássica dos esportes olímpicos – e também dos negócios – é a de que o mundo se divide entre vencedores e perdedores. Alguns são melhores, mais esforçados, inteligentes ou corajosos e, pelo próprio mérito, sobem ao topo. Os demais são apenas derrotados.

É dessa lógica que cresce a reação aos atuais avanços dos direitos humanos, com movimentos anti-woke e a defesa da meritocracia a qualquer custo.

Dar chance a todos e “valorizar os perdedores” é coisa de gente politicamente correta, "chata" ou até mesmo a verdadeira fonte da desigualdade. Afinal, até a biologia funciona com essa lógica: é a sobrevivência do mais forte, não é? Aos perdedores, resta a extinção.

Hoje, no entanto, só os mal informados se agarram a essa divisão. Nos ambientes de trabalho, é mais do que provado que times com um alto índice de colaboração tendem a ter um melhor fluxo de informação, mais rapidez de aprendizado, ideias mais inovadoras e, em última análise, desempenho melhor.

Sabemos também que incluir pessoas de origens, experiências e conhecimentos diferentes também é essencial em qualquer equipe – não só por ser mais justo, mas também por trazer mais resultados.

Um nível acima, na disputa entre corporações, os modelos de negócio mais bem sucedidos da atualidade são baseados em plataformas onde várias empresas interagem.

Outra abordagem é simplesmente ignorar que existe uma concorrência e focar em áreas ou clientes que não estão sendo atendidos por nenhum produto – como se fosse um esporte que a empresa inventou, joga sozinha e, portanto, leva todas as medalhas.

O investidor conservador e ultra capitalista Peter Thiel expressou essa ideia, ainda que de maneira aparentemente confusa, na frase “competição é coisa de perdedores”.  

a vitória não precisa ser implacável ou solitária. Ela pode ser compartilhada e celebrada, puxando outras mulheres para a vitória também.

E, de novo, até na biologia, a colaboração entre indivíduos e espécies tem sido ressaltada como uma das grandes forças da evolução e do equilíbrio de ecossistemas. Um ambiente saudável exige diversidade. Se só o mais forte sobrevivesse, não sobraria mais ninguém e ele acabaria morrendo junto.

Mas aí chegam as Olimpíadas e parecem nos lembrar que competições existem e que apenas alguns são vencedores. A ambiguidade desse modo de pensar – competições selvagens em um mundo que precisa ser mais colaborativo – foi ressaltada por uma campanha recente da Nike, "Winning Isn't for Everyone - Am I a Bad Person?", em preparação para as Olimpíadas de Paris. A campanha questiona se a intensa competitividade dos atletas os torna "más pessoas".

Narrada por Willem Dafoe, a campanha é provocativa ao destacar o lado implacável e obsessivo do desejo de vencer, com declarações como "sou egoísta", "não tenho empatia" e "o que é seu é meu".

O anúncio pode ser visto de maneira literal – e por isso foi celebrado por conservadores – ou de maneira irônica, o que também ganhou elogios de quem critica a competitividade. Também, pelo mesmo motivo, foi criticado pelos dois lados.

Em contraste, a recente trajetória de atletas como Rebeca Andrade e Rayssa Leal oferece uma visão diferente do que significa competir e vencer. Rebeca, conhecida tanto por sua excelência quanto por sua humildade, foi saudada com reverência por Simone Biles e Jordan Chiles no pódio do solo, um gesto que simboliza respeito e admiração mútua.

As atletas norte-americanas Simone Biles e Jordan Chiles homenageiam a brasileira Rebeca Andrade (Crédito: COI/ Getty Images)

Da mesma forma, Rayssa, a jovem skatista que conquistou o mundo com seu talento, é frequentemente vista torcendo por suas competidoras, demonstrando que é possível competir ao mais alto nível sem deixar de lado a empatia e o apoio.

Essas atletas representam uma liderança baseada em amor e solidariedade, mostrando que vencer com graça não só é possível, mas também inspira outras a seguirem pelo mesmo caminho. Elas provam que a vitória não precisa ser implacável ou solitária. Pelo contrário, ela pode ser compartilhada e celebrada, puxando outras mulheres para a vitória também. 

    Em um cenário onde a narrativa dominante muitas vezes glorifica a dureza e a falta de escrúpulos, é reconfortante ver que ainda há espaço para líderes que vencem com amor e que, em sua jornada, elevam outras junto com elas.

    “A prática do amor é o antídoto mais poderoso contra as políticas de dominação", já nos lembrava bell hooks.


    SOBRE A AUTORA

    Juliana de Faria é jornalista, escritora e pós graduada em neurociência e comportamento. Está à frente do Estúdio Jules, consultoria c... saiba mais