Não basta ser um bom líder: agora, até os CEOs têm que ser influencers

Estudos indicam que uma boa reputação do CEO pode melhorar significativamente a capacidade da organização de atrair e reter investidores

mulher prepara celular para gravar um vídeo
Créditos: Antoni Shkraba Studio/ Pexels/ Steve Johnson/ Unsplash

Jared Lindzon 4 minutos de leitura

Antes de se tornar CEO da Lyft, David Risher quase não usava as redes sociais. Isso começou a mudar pouco antes de seu primeiro dia no cargo, quando decidiu se cadastrar na plataforma de transporte como motorista.

“Eu não tinha um plano”, conta. “Só queria entrar no carro para sentir como é dirigir pela Lyft e ouvir as histórias dos passageiros, mas também vivenciar tudo do ponto de vista de quem está ao volante.”

Ao fim daquela primeira corrida, Risher revelou à passageira quem ele era, pediu para tirar uma selfie e publicou a foto em seu perfil pessoal no LinkedIn. “Dirigi por mais algumas horas e não contei a ninguém na Lyft que estava fazendo isso.”

Desde então, Risher transformou o hábito em rotina: volta e meia assume o volante e compartilha as histórias (e selfies) que coleta nas ruas em suas contas pessoais no LinkedIn e no X/ Twitter, que já somam cerca de 25 mil seguidores.

“Parte do trabalho de um CEO é ser o porta-voz da empresa. E o que mais gera retorno positivo é justamente o que posto nas redes, especialmente quando falo sobre dirigir ou mostro os bastidores do que é, de fato, administrar uma companhia”, afirma Risher.

À medida que a marca pessoal dos executivos se torna cada vez mais ligada à imagem das empresas que lideram, mais e mais chefes têm se inspirado nos influenciadores digitais.

Assim como Risher, vários CEOs do setor de tecnologia embarcaram na tendência. Daniel Ek, cofundador e CEO do Spotify, publica Reels no Instagram para apresentar os resultados trimestrais da empresa. Foi também por lá que anunciou sua futura transição para o cargo de presidente executivo.

Kaz Nejatian, por sua vez, começou a usar sua conta pessoal no X/ Twitter para divulgar novas contratações, mudanças de produto, memorandos internos e outros planos, à medida que passou de diretor de operações da Shopify para CEO da Opendoor.

Ele também revelou estar trabalhando em maneiras de tornar as apresentações de resultados da empresa mais interativas e sociais para os acionistas.

Mas será que essa expectativa de pegar o celular e fazer uma live no TikTok está mudando a forma como esses líderes atuam? E será que não é demais para um cargo já tão exigente?

A ERA DOS CEOs INFLUENCIADORES

Os CEOs estão sob pressão cada vez maior para manter uma presença ativa nas redes. Em uma pesquisa global de 2020, 59% dos executivos afirmaram que seus CEOs deveriam ter presença online. Em outra, 74% dos funcionários disseram que os clientes associam diretamente a imagem da empresa à de seus líderes.

Outros estudos indicam que uma boa reputação do CEO pode melhorar significativamente a capacidade da organização de atrair e reter investidores e até aumentar o valor de mercado da companhia.

David Risher, CEO do Lyft, dirige um carro de aplicativo com  passageira e filho no banco de trás
David Risher, do Lyft (Crédito: Reprodução/ Instagram)

Em certa medida, não se trata de uma ideia nova. CEOs têm sido o rosto de suas empresas há décadas. Mas, recentemente, os públicos de interesse passaram a esperar mais: querem que esses líderes construam uma persona “autêntica” para se conectar com as pessoas da mesma forma que influenciadores fazem no YouTube ou no TikTok.

“O CEO branding como disciplina é algo relativamente novo”, explica Karen Leland, autora, especialista em marca pessoal e fundadora da Sterling Marketing Group. “Foi apenas nos últimos anos que isso realmente ganhou força.”

Leland observa que agora é comum que CEOs trabalhem com assessores para criar uma narrativa pessoal que se relacione com a marca que representam, mas mantenha uma identidade própria. Isso pode incluir artigos de opinião, engajamento com causas, bastidores do trabalho e até hobbies e interesses pessoais.

Sir Richard Branson (fundador do Grupo Virgin), por exemplo, há muito mantém uma persona pública estreitamente ligada – mas não idêntica – às de suas empresas, aparecendo com frequência na mídia e postando nas redes sociais. Se antes ele era uma exceção, sua estratégia agora virou regra.

Richard Branson, do  Grupo Virgin, em frente à piscina
Crédito: Reprodução/ Instagram

Consumidores e investidores, por sua vez, querem ouvir diretamente dos CEOs – de forma mais espontânea e menos ensaiada. Líderes como Whitney Wolfe Herd (Bumble), Satya Nadella (Microsoft), Jamie Dimon (JPMorgan Chase), Chuck Robbins (Cisco) e Corie Barry (Best Buy), entre outros, acumulam centenas de milhares ou até milhões de seguidores, mesmo que ainda não tenham aderido completamente à moda dos vídeos verticais e das notas internas transformadas em post.

CEOs COMO VENDEDORES DE ATENÇÃO

Ainda assim, talvez seja exagero colocar CEOs no mesmo grupo de youtubers ou streamers do Twitch. “Influenciadores nem sempre são formadores de opinião”, diz Leland. “Mas os CEOs que fazem isso da maneira certa estão se estabelecendo como formadores de opinião em seus campos de atuação.”

Aparições na mídia e em conferências, lançamentos de produtos, visitas a unidades, conversas com clientes e funcionários – tudo isso virou material para o conteúdo online dos executivos.

Os CEOs estão sob pressão cada vez maior para manter uma presença ativa nas redes.

Embora uma presença forte nas redes sociais possa trazer benefícios, também pode ter seu lado arriscado. Assim como influenciadores são “cancelados” por publicações malfeitas ou comentários infelizes, CEOs – e, por consequência, suas empresas – podem enfrentar o mesmo destino.

“Desde que você faça isso de forma autêntica, provavelmente estará fazendo bem à sua empresa”, diz Risher, da Lyft. “Acho que isso vale tanto para influenciadores quanto para CEOs: se parece forçado, ninguém vai acreditar.”


SOBRE O AUTOR

Jared Lindzon é jornalista especializado em temas como futuro do trabalho e profissões ligadas a inovação tecnológica. saiba mais