O que fazer para convencer acionistas a olhar para além da margem de lucro
Recentemente, assisti a uma apresentação organizada por uma grande instituição acadêmica. O objetivo era orientar os ex-alunos e demais interessados em ingressar em conselhos corporativos. Durante toda a apresentação, a premissa foi a de que os conselhos estariam interessados apenas em aumentar o valor da empresa para os acionistas e o ROI (retorno sobre o investimento) corporativo, traços consistentes com uma mentalidade capitalista ainda centrada nos acionistas. Não houve nenhuma menção aos efeitos que o “capitalismo de stakeholders” – que pode ser traduzido como “capitalismo das partes interessadas” – poderia ter na avaliação e escolha de candidatos efetivos para os conselhos.
Fiquei ao mesmo tempo surpreso e desapontado. Ora, o capitalismo das partes interessadas não tem sido tão elogiado como “o futuro dos negócios” por acadêmicos, pela Business Roundtable e por líderes empresariais?
E o capitalismo de stakeholders, por definição, não exige que as empresas sirvam a todas as partes interessadas – comunidade, funcionários, fornecedores, clientes – além dos acionistas?
Ou seja, para fazer essa mudança, as empresas deveriam preencher seus conselhos com pessoas que entendam a importância urgente do capitalismo das partes interessadas em todas as suas nuances. Pessoas que se dediquem firmemente a transformar as empresas em organizações voltadas a alcançar lucratividade e prosperidade econômica a longo prazo, por meio da melhoria da sociedade como um todo.
Se é assim, por que esses critérios emergentes não foram incluídos como cruciais na hora de avaliar a prontidão dos candidatos para compor os conselhos corporativos?
Quando compartilhei com os palestrantes essas inquietações com o conteúdo das suas apresentações, eles responderam que minha observação era de fato “muito astuta” e que precisariam pensar um pouco mais a respeito.
Embora tenha ficado aliviado ao ouvir essa resposta, fiquei pensando sobre a dificuldade de fazermos a transição para o capitalismo de partes interessadas. Se até mesmo aqueles que aconselham sobre a composição dos conselhos não estão se esforçando para formá-los conselhos com pessoas que tenham experiência além da maximização do valor para os acionistas, se ainda estão considerando critérios puramente econômicos e se, ainda assim, afirmam acreditar em tudo o que o capitalismo pode render para a sociedade e para as corporações, então para onde estamos realmente caminhando?
MUITO ALÉM DOS RESULTADOS TRIMESTRAIS
A apresentação que mencionei é apenas um pequeno exemplo de uma questão sistêmica maior: o valor das empresas continua a ser ditado por resultados trimestrais e por medidas econômicas de curto prazo.
Quando e como finalmente começaremos a julgar amplamente o sucesso corporativo para além de medidas como valor para o acionista? Certamente, muitas partes interessadas estão se esforçando para fazê-lo. Mas a mudança na forma como definimos o sucesso corporativo precisa ser muito mais abrangente.
A MUDANÇA NA FORMA COMO DEFINIMOS O SUCESSO CORPORATIVO PRECISA SER MUITO MAIS ABRANGENTE.
Os líderes corporativos precisam criar e codificar padrões universais para medir o valor corporativo. Isso inclui medidas econômicas, é claro. Mas também deveriam levar em conta a governança corporativa baseada em princípios, a liderança no planeta e as mudanças climáticas, a seleção e gestão cuidadosa de fornecedores e o cultivo da dignidade dos funcionários, bem como outras práticas que levam ao avanço da sociedade.
Com toda a franqueza, a implementação dessa mudança será difícil. A maioria das empresas não tem conhecimento sobre como coletar os dados e informações necessários para criar uma estrutura básica para realizar essa mudança. Novos requisitos de relatórios de dados adicionais serão onerosos para a maior parte delas, pelo menos no início.
Um passo significativo nessa direção é um relatório publicado em 2020 pelo Conselho Internacional de Negócios do Fórum Econômico Mundial: Medindo o Capitalismo das Partes Interessadas: Rumo a Métricas Comuns e Relatórios Consistentes de Criação de Valor Sustentável. Foi produzido por uma força-tarefa que incluiu representantes das quatro maiores empresas de contabilidade do mundo, do Bank of America e do Fórum Econômico Mundial.
O relatório aborda alguns dos desafios sistêmicos que os líderes corporativos enfrentam ao relatar a criação de valor para as partes interessadas, como a falta de consistência no modo como o desempenho é medido e relatado. O documento afirma: “Este trabalho define um conjunto central de ‘Métricas de Capitalismo de Stakeholders‘ e divulgações que podem ser usadas por… membros para alinhar seus principais relatórios de desempenho em relação a indicadores ambientais, sociais e de governança”.
Esta é realmente uma boa notícia, e convoco todos os líderes a lerem o relatório completo. Mas, infelizmente, estabelecer padrões e métricas será apenas o começo da jornada. As empresas precisarão investir na captura dos dados e informações necessários e devem aderir a uma prática consistente na forma de reportá-los.
UM MOMENTO ÚNICO NA HISTÓRIA
Como constatou Klaus Schwab, fundador e presidente executivo do Fórum Econômico Mundial: “Este é um momento único na história para tornarmos o capitalismo das partes interessadas mensurável. O movimento de empresas que aceitem não apenas medir sua responsabilidade ambiental e social, mas também incluir essas medidas em seus relatórios, representará uma mudança radical na história econômica”.
A MAIORIA DAS EMPRESAS NÃO SABE COMO COLETAR OS DADOS E INFORMAÇÕES NECESSÁRIOS PARA CRIAR UMA ESTRUTURA BÁSICA PARA REALIZAR A MUDANÇA.
Por último, mas não menos importante, os investidores precisam adotar o capitalismo das partes interessadas e medir o desempenho de uma empresa com base em suas premissas à medida que determinam suas escolhas de investimento. Alguns grandes investidores, como a BlackRock, já lideram esse movimento há algum tempo. No entanto, a maioria ficou à margem, continuando a recompensar o pensamento de curto prazo das corporações que são gerenciadas com foco no relatório de lucros do próximo trimestre.
Larry Fink, presidente e CEO da BlackRock, explicou melhor isso em sua Carta Anual de 2022 aos CEOs: “No mundo globalmente interconectado de hoje, uma empresa deve criar valor e ser valorizada por toda a sua gama de valor para os acionistas. É por meio do capitalismo de partes interessadas que o capital é alocado de forma eficiente, que as empresas alcançam lucratividade durável e que o valor é criado e sustentado no longo prazo.”
Alcançar um ambiente de negócios robusto, focado na melhoria de todas as partes interessadas, depende de conselhos mais bem informados, de líderes corporativos comprometidos e de investidores com visão de futuro para impulsionar a mudança necessária.
Dito isso, é ingênuo negar o papel crítico que a lucratividade de longo prazo sempre desempenhará na avaliação da saúde e do valor de qualquer empresa ao longo do tempo. Mas, trabalhando juntos, conselhos, executivos e investidores podem remover as amarras impostas pelas medidas trimestrais de desempenho financeiro e permitir que as empresas se concentrem no avanço de todas as partes interessadas, à medida que elas é que geram valor econômico sustentável e duradouro.