O que Luke Skywalker e Tony Soprano ensinam sobre liderar transformações reais

Se você quer transformação de verdade, precisa adotar essas três mudanças de mentalidade

O que Luke Skywalker e Tony Soprano ensinam sobre liderar transformações reais
Créditos: HBO / Getty Images; Sunset Boulevard / Corbis via Getty Images

Greg Satell 5 minutos de leitura

Normalmente, as pessoas chegam a cargos de liderança depois de se tornarem boas gestoras. Criam coesão e consenso nas equipes, mantêm um ambiente previsível onde todos sabem o que esperar e executam os planos com excelência. É assim que se entrega valor de forma consistente a clientes, parceiros e demais stakeholders.

O problema é que, quando o objetivo é promover mudanças, nada disso funciona muito bem. Se algo é novo, inédito e não testado, não dá para esperar consenso imediato. Tampouco dá para contar com previsibilidade – é preciso aceitar as incertezas. E, em vez de focar só na execução, explorar, experimentar e aprender com tentativas e erros.

Esse é um dos motivos pelos quais liderar transformações é tão difícil. É preciso abandonar o jeito de operar que garantiu sucesso até aqui e agir de outra forma. Isso não exige apenas novas ações, mas também novas formas de pensar – passando da persuasão para o empoderamento, de valores diferenciadores para valores compartilhados e da “jornada do herói” para o “conflito estratégico”.

1. DA PERSUASÃO PARA O EMPODERAMENTO

Tony Soprano, o implacável chefe da máfia da icônica série de TV, era mestre em coerção. Ainda assim, percebendo que poderia ganhar explorando outras estratégias, ele buscou conselhos da Dra. Jennifer Melfi, que o incentivou a ser mais colaborativo. Pensativo, ele perguntou: “então, como faço as pessoas fazerem o que eu quero?”.

Todo gestor já passou por esse dilema, mesmo que não admita. Queremos inspirar, motivar e ajudar as pessoas a atingir seu potencial. Mas, no fim do dia, temos metas a bater, planos a seguir – e muitas vezes só queremos que façam o que pedimos.

Encontre quem já quer o mesmo que você e dê a essas pessoas poder para agir

Em uma transformação, no entanto, você atua em meio às incertezas – sem saber qual será a solução final. É necessário experimentar, testar, observar o que funciona e ajustar o que não funciona. Não existem regras fixas.

Por isso, em vez de tentar convencer todos a seguir seu caminho, encontre quem já quer o mesmo que você e dê a essas pessoas poder para agir. Trabalhem juntos em uma primeira mudança-chave e, quando ela funcionar, dê recursos para que possam engajar outras pessoas – que, por sua vez, trarão mais aliados.

2. DE VALORES DIFERENCIADORES PARA VALORES COMPARTILHADOS

No Marketing, aprendemos que a primeira regra para vender é diferenciar o produto com uma proposta de valor única. Afinal, se você é igual ao concorrente, por que alguém o escolheria? Produtos não diferenciados viram commodities – e commodities têm margens baixas.

Por isso, é comum que gestores, ao iniciar uma mudança, queiram destacar o que ela tem de único, pois é o que os estimula. Usam palavras como “disruptivo”, “inovador” e “revolucionário” para gerar empolgação. O problema é que, o que é inspirador para alguns, pode parecer ameaçador para outros.

A solução é criar um senso de segurança em torno da mudança, enfatizando valores já compartilhados

Grandes transformações exigem ação coletiva – e conquistar adesão aqui é muito diferente de vender um carro ou um pacote de batatas fritas. Consumidores podem escolher entre opções, mas, dentro de uma empresa, a mudança requer apoio conjunto. E valores muito diferenciadores costumam gerar resistência.

A solução é criar um senso de segurança em torno da mudança, enfatizando valores já compartilhados. Por exemplo: após treinamentos em metodologias ágeis, muitos voltam empolgados falando sobre o “Manifesto Ágil” – e encontram pouco apoio. Melhor seria conectar a mudança a objetivos que todos já valorizam, como produtos melhores, entregues mais rápido e com menos custo.

Isso não significa diluir a visão, mas enquadrá-la de forma que ressoe com o que já importa para as pessoas. É preciso ir até onde elas estão – não impor sua paixão.

3. DA JORNADA DO HERÓI AO CONFLITO ESTRATÉGICO

Muitos líderes encaram a mudança como uma “jornada do herói”, imaginando um futuro alternativo no qual, se fizerem tudo certo e tiverem uma causa nobre, chegarão ao destino. Algo como Luke Skywalker, que precisou enfrentar a si mesmo antes de enfrentar Darth Vader – uma batalha, sobretudo, interna.

Mas isso é mais uma fantasia do que a realidade. Mudança real é um conflito estratégico entre uma visão de futuro e o status quo. E o status quo se sustenta por fontes de poder institucionais. Para promover uma transformação genuína, é preciso entender e influenciar essas forças.

Quando isso fica claro, criar uma estratégia se torna mais fácil. O poder está embutido nas instituições, e mudar exige mapear quais sustentam o status quo, quais apoiam sua visão e quais estão em cima do muro. Esse mapeamento ajuda a definir táticas.

Em nossos workshops de transformação, um dos momentos mais reveladores é quando mapeamos essas fontes de poder em uma matriz. É aí que os líderes passam a enxergar um caminho concreto – transformando a mudança de um ideal abstrato em um processo estratégico, no qual as dinâmicas de poder podem ser compreendidas e influenciadas.

ADOTANDO A MENTALIDADE DE UM AGENTE DE MUDANÇA

Líderes são treinados para agir como gestores, pois consenso e previsibilidade são fundamentais para executar operações complexas. Todos precisam conhecer seu papel, cumprir suas responsabilidades e confiar que os outros farão o mesmo. É assim que se entrega valor de forma consistente.

Mas, quando é hora de mudar, é preciso deixar essa mentalidade de lado e adotar a de um agente de mudança – e isso significa que as práticas usuais deixam de funcionar. A mudança é incerta. Não dá para esperar consenso, então é preciso formar uma coalizão que acredite na visão e esteja disposta a explorar caminhos.

O mais difícil é que isso exige abrir mão do que trouxe sucesso até agora. Persuadir as pessoas sobre sua visão raramente funciona; é mais eficaz encontrar quem já acredita nela. Em vez de destacar apenas o que a mudança tem de diferente, conecte-a a valores amplamente aceitos.

E talvez a virada mais desafiadora para qualquer líder seja entender que a transformação não é uma aventura na qual ele é o herói, mas um conflito estratégico contra o status quo – sustentado por forças que se consolidaram ao longo de anos ou décadas.

Os líderes mais eficazes dominam tanto a mentalidade de gestor quanto a de agente de mudança, e sabem alternar entre elas. Afinal, buscar transformação não significa ignorar o dia a dia. Mas tentar mudar com uma mentalidade de gestor é praticamente garantia de fracasso.


SOBRE O(A) AUTOR(A)

Greg Satell is Co-Founder of ChangeOS, a transformation & change advisory, a lecturer at Wharton, an international keynote speaker... saiba mais