Os benefícios ocultos de se cultivar a gratidão todos os dias

A tendência ao cinismo pode fazer com que a vida seja muito mais difícil do que deveria ser

Crédito: Simon Lee/ Alex Blăjan/ Doug Kelley/ Unsplash

Jeff Lerner 4 minutos de leitura

Não sei se existe uma prática mais mal compreendida do que a da gratidão. Por que tanta gente acha difícil adotá-la em suas vidas? Por que tantos a ignoram ou rejeitam totalmente? Pode ser porque estamos acostumados a pensar no que não temos, em vez de agradecer pelo que temos.

Como seres humanos, tendemos a ser cínicos e pessimistas já que, antropologicamente, isso ajudou a sobrevivência da espécie. Hoje em dia, é essencial amenizar essa tendência. Tony Robbins coloca a questão assim: “uma das principais qualidades das pessoas de sucesso é sua capacidade de ver as coisas como elas são, boas ou ruins – mas nunca piores do que são.”

Há dois autores cujo trabalho me ajudou a entender melhor esse conceito e a superar minha própria tendência ao cinismo. Trago aqui algumas de suas principais considerações sobre o tema.

HANS ROSLING

Médico e professor sueco, Rosling escreveu um best-seller chamado “FactfulnessTen Reasons We’re Wrong About the World—and Why Things Are Better Than You Think” (no Brasil, Factfulness: O hábito libertador de só ter opiniões baseadas em fatos).

No livro, ele lista 10 tipos de instintos que mudam o modo como pensamos e interagimos com o mundo à nossa volta. Recomendo que você pare para pensar em situações da sua vida em que cada um delas se encaixa.

  • Instinto divisionista: costumamos dividir tudo em lados opostos e assumir que há uma grande diferença entre os dois extremos.
  • Instinto negativista: é a tendência a notar aquilo que é ruim em vez do que é bom, como o copo meio vazio (e não meio cheio).
  • Instinto linear: é mais fácil pensar que tudo segue uma sequência direta, de A para B, quando, na verdade, os caminhos da vida são cheios de curvas.
  • Instinto do medo: prestamos mais atenção nas coisas que nos amedrontam.
  • Instinto de proporção: em geral, não conseguirmos avaliar direito a dimensão das coisas.
  • Instinto de generalização: costumamos classificar tudo, automaticamente – o que, além de enganoso, pode ser incorreto.
  • Instinto fatalista: a crença de que tudo é e sempre será de daquele jeito.
  • Instinto de ver tudo sob nosso próprio ponto de vista: é mais fácil olhar as coisas da nossa perspectiva do que tentar se colocar no lugar do outro.
  • Instinto de culpar os outros: tendemos a procurar um bode expiatório ou alguma forma de culpar outras pessoas por nossos erros.
  • Instinto de urgência: as pessoas vivem com pressa, assim, quando nos deparamos com um problema, queremos resolvê-lo na hora.

O objetivo, ao apontar essas “distorções cognitivas”, não é fazer pouco delas, mas aumentar nossa consciência sobre cada um desses pontos, de modo a fazer com que, aos poucos, se adequem aos nossos objetivos em vez de aumentarem nossas angústias.

MARTIN SELIGMAN

Martin Seligman é pioneiro em um campo conhecido como psicologia positiva. Ele desenvolveu os “três Ps do pessimismo”. Entendê-los pode tornar muito mais fácil ficar atento contra os efeitos negativos de nossas inclinações naturais.

  • Permanência: um erro relacionado ao tempo. Tendemos a achar que, se a coisa está ruim agora, vai continuar assim para sempre.
  • Generalização (pervasiveness, em inglês): um erro relacionado ao tamanho. Acreditamos que, se há alguma coisa negativa em nossas vidas, ela estraga todo o resto.
  • Personalização: um erro relacionado a assumir a responsabilidade. Quando nos fixamos nos aspectos negativos, tendemos a nos achar mais culpados e sujeitos a críticas do que realmente somos.

Mesmo que a gente consiga se condicionar a ser grato, isso nunca será uma coisa automática. Destravar todo o nosso potencial exige ir além do instinto de sobrevivência e adotar uma postura de longo prazo, para a qual gratidão é um aspecto indispensável.

Para começar, tente agora mesmo fazer algo que expresse gratidão. Escreva uma mensagem. Ligue para alguém. Faça uma visita. Pense nas pessoas da sua vida que mais merecem sua gratidão e diga a elas. Seja o que for, faça de coração.

Se você não se sente confortável para fazer nada disso, procure descobrir por quê. O que há nessas manifestações de carinho que o fazem se sentir desconfortável? Não se julgue, apenas tente entender o que acontece dentro de si mesmo.

Gratidão é só o primeiro passo, um caminho para nos tornarmos menos autocentrados e nos libertarmos de crenças e padrões negativos que travam nosso potencial. É o início de uma série de mudanças que vão resultar em uma virada significativa na sua vida. E a vida depois da virada é incrivelmente melhor do que antes.


SOBRE O AUTOR

Jeff Lerner é fundador e chief vision officer da Entre, empresa do setor de educação. saiba mais