Para evitar demissões, contrate de olho na capacidade, não na especialização

Caso a habilidade que você busca possa ser ensinada no trabalho, considere removê-la dos requisitos para os candidatos

Crédito: SvetaZi/ iStock

Suneil Kamath 4 minutos de leitura

Milhares de trabalhadores de tecnologia foram demitidos recentemente, e o número continua aumentando. Mas algumas dessas mesmas empresas que demitiram estão procurando outros profissionais.

Em um memorando interno, o Google (que dispensou 12 mil pessoas), disse que está contratando para “um número muito limitado de funções essenciais”. A Meta demitiu 11 mil funcionários em novembro, mas ainda está recrutando para centenas de cargos, segundo seu portal de carreiras.

Por que as empresas ainda estão contratando, se elas demitiram trabalhadores?

Uma análise de 228 milhões de anúncios de emprego revelou que computação em nuvem e inteligência artificial são as áreas com maior demanda.

Muitas vezes, isso tem a ver com o funcionário ser considerado um especialista ou um generalista. Se um trabalhador de alto nível é muito especializado em uma área que a empresa decidiu reduzir, ele pode não ter as habilidades necessárias para trabalhar em outra área que tenha vagas abertas.

Nos últimos anos, houve um esforço para contratar profissionais com habilidades específicas. De acordo com um estudo do The Burning Glass Institute, uma análise de 228 milhões de anúncios de emprego revelou que computação em nuvem e inteligência artificial são alguns dos conjuntos de habilidades com maior demanda.

Outro estudo, este da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), revelou que “a parcela de empregos altamente qualificados aumentou 25% nos últimos 20 anos” e continuará a aumentar.

Embora as empresas precisem de trabalhadores altamente qualificados para prosperar na era da rápida inovação tecnológica, elas poderiam contratar mais pela capacidade de aprender e se desenvolver, em vez de se basear apenas nas habilidades. Talvez isso seja mais importante.

REMANEJAMENTO INTERNO

A capacidade tem mais a ver com o potencial da pessoa, enquanto as habilidades dizem respeito àquilo que ela consegue fazer no presente. Por exemplo, embora demore algum tempo, uma empresa pode ensinar um profissional de marketing curioso e esforçado a codificar. No entanto, seria difícil ensinar um engenheiro de software sobre marketing se ele não tivesse curiosidade ou desejo de aprender.

Por isso, em tempos de estresse econômico, em lugar de demitir funcionários e continuar contratando, as empresas poderiam preencher as vagas abertas com o pessoal que já trabalha lá, o que reduziria custos.

Uma pesquisa da Gallup estima que o custo de substituir um funcionário pode variar de metade a duas vezes o salário anual desse funcionário. Além disso, perder trabalhadores efetivos significa perder pessoas que estão familiarizadas com a cultura e o modo de pensar da empresa, enquanto os novos precisarão passar por uma intensa curva de aprendizado.

em lugar de demitir funcionários e continuar contratando, as empresas poderiam preencher as vagas abertas com o pessoal que já trabalha lá.

Algumas empresas têm adotado uma estratégia de realocação. Em uma postagem no LinkedIn, Brandon Sammut, diretor de pessoal da Zapier, descreveu como eles evitaram reduzir o tamanho de seu departamento de RH.

“Quando temos capacidade excedente temporária, por que não realocar as pessoas em outro setor? Elas vão agregar valor e adquirir habilidades e contexto que impulsionarão seu sucesso no recrutamento e onde quer que sua carreira os leve – na Zapier ou em outro lugar”, analisa Sammut.

A Zapier não foi a única a empregar essa estratégia. A empresa de consultoria global Slalom também evitou demissões em massa, em parte porque transferiu funcionários subutilizados de uma área para outra.

Esse modelo também pode estimular a inovação nos negócios. Em seu livro Range: Why Generalists Triumph in a Specialized World (Variedade: por que generalistas têm sucesso em um mundo especializado), David Epstein afirma que um mundo em evolução requer pessoas que possam “conectar novas ideias e trabalhar em vários contextos”.

COMO CONTRATAR POR CAPACIDADE

Ao selecionar currículos, procure ações que o candidato realizou que estejam alinhadas com os valores da empresa, e não apenas com as habilidades técnicas que possui. Por exemplo, se curiosidade ou aprendizado for um valor da empresa, alguém que ocupou cargos em diferentes linhas de negócios ou campos não relacionados pode ter essa característica.

Além disso, questione se a habilidade pode ser ensinada no trabalho para um profissional altamente motivado. Em caso positivo, considere remover essa exigência entre os requisitos para a vaga, abrindo oportunidade para um grupo maior se inscrever e evitando deixar de fora da seleção pessoas que não possuem essa determinada habilidade.

uma pessoa interessada e inteligente provavelmente será capaz de aprender rapidamente o que é preciso saber para executar a tarefa.

Por exemplo, vários empregos exigem que os candidatos saibam trabalhar com o Microsoft Excel. Mas, a menos que o trabalho exija modelagem estatística, previsão ou automação, uma pessoa interessada e inteligente provavelmente será capaz de aprender rapidamente o que é preciso saber para executar a tarefa.

Muitas das empresas que cresceram enquanto o mundo estava em lockdown por conta da pandemia de Covid-19 contrataram rapidamente para atender à demanda e, pelo visto, meteram os pés pelas mãos. Elas calcularam, erroneamente, que a demanda permaneceria estável ou até aumentaria com o passar dos anos.

Sundar Pichai, CEO da Alphabet (holding que controla o Google), comentou sobre as demissões: “nos últimos dois anos, testemunhamos períodos de crescimento dramático. Para acompanhar e alimentar esse crescimento, contratamos para uma realidade econômica diferente da que enfrentamos hoje.”

Pode até ser que essa estratégia de contratar por capacidade e não por habilidade não fosse suficiente para evitar todas as demissões. Mas, na certa, as empresas poderiam ter poupado alguns empregos e evitado perder funcionários talentosos, economizando custos de rotatividade no processo.


SOBRE O AUTOR

Suneil Kamath é escritor e consultor de marketing. saiba mais