Por que 6% é o número mágico de demissões nas empresas de tecnologia

CEOs de tecnologia parecem até ter combinado que 6% é uma espécie de “porcentagem modelo” nesta atual leva de demissões

Crédito: Freepik

James Surowiecki 4 minutos de leitura

Como ficou claro no último relatório de empregos divulgado pelo governo norte-americano, a economia do país estava caminhando bem em janeiro, de modo geral. Porém, na indústria de tecnologia, especificamente, o ano novo começou mal.

Em 4 de janeiro, a Amazon anunciou que demitiria 18 mil funcionários, o equivalente a 6% de sua força de trabalho. Algumas semanas mais tarde, a Microsoft seguiu o exemplo, demitindo 5% de sua equipe. Depois, foi a vez da Alphabet, que anunciou que dispensaria 6% dos funcionários.

Desde então, a tendência de downsizing continuou nos EUA, com Okta, Spotify, HubSpot (empresa de software empresarial), NCC Group (segurança cibernética) e PayPal anunciando demissões. Mais especificamente, todas essas organizações anunciaram que iam demitir de 5% a 7% de sua força de trabalho.

O que explica essa estranha sincronia nas decisões sobre demissão?

O fato de que as empresas de tecnologia estão enxugando seus quadros não surpreende. A indústria havia embarcado em uma grande onda de contratações durante a pandemia. Mas, no ano passado, a desaceleração no mercado de publicidade digital, a ansiedade sobre uma possível recessão, junto com o grande impacto disso nos preços das ações das empresas de tecnologia, fizeram da “eficiência” a nova preocupação dos CEOs.

No entanto, o mais curioso é o fato de que muitos desses CEOs parecem ter simplesmente decidido que, quando se trata de demissões, cerca de 6% da força de trabalho é uma espécie de “número mágico”.

CONTÁGIO SOCIAL

Embora essas empresas tenham certas coisas em comum, seus negócios subjacentes são muito diferentes e as demonstrações de resultados e balanços não são nada parecidos.

Ora, se as demissões são (ou deveriam ser) o produto de um cálculo cuidadoso sobre o número de trabalhadores necessários para otimizar o valor futuro das empresas (que é o que qualquer professor de economia diria), então não faz sentido nenhum todas terem chegado, ao mesmo tempo, a aproximadamente a mesma conclusão. Só que, com poucas exceções – como Meta e IBM –, é isso o que está acontecendo.

O que explica, então, essa estranha sincronia nas decisões sobre demissão?

No ano passado, a queda na publicidade digital e a ansiedade sobre uma possível recessão fizeram da “eficiência” a nova preocupação dos CEOs.

Uma resposta provável é que os CEOs de tecnologia prestam atenção uns aos outros e, em particular, aos players mais importantes do setor, além de receberem dicas uns dos outros. O boom nas demissões de 6% seria uma espécie de moda passageira – o produto do que o professor de Stanford Jeffrey Pfeffer chamou de “contágio social”.

Assim como, há 10 anos, as pessoas decidiram que tirar fotos fazendo a postura da prancha em lugares estranhos (e postar nas redes sociais) era algo que valia a pena, as empresas de tecnologia decidiram, nos últimos meses, que cerca de 6% dos funcionários estão 'sobrando'.

Este não é, aliás, um fenômeno novo. Há pesquisas acadêmicas muito interessantes sobre o  aumento do downsizing na década de 1980. Elas mostram que o acompanhamento de tendências ajuda a explicar a disposição das empresas de cortar a folha de pagamento.

Embora o downsizing tenha sido inicialmente visto como uma estratégia duvidosa, ele se normalizou com o tempo – o que, por sua vez, tornou mais fácil para as empresas adotá-lo. Por outro lado, a onda de contratações da indústria de tecnologia de 2019 a 2022 provavelmente foi, em parte, uma tendência a que muitos resolveram aderir. Se todo mundo estava fazendo isso, era difícil resistir e não fazer o mesmo.

O JOGO DA IMITAÇÃO

Entretanto, resumir o recente boom de demissões a um jogo de imitação faz com que tudo pareça casual e irrefletido, sendo que, na verdade, há, sim, uma lógica por trás disso. As empresas de tecnologia estavam, em muitos casos, com excesso de pessoal em meados de 2022. Mas não há um algoritmo mágico que diga a uma empresa o quanto ela tem de excesso de pessoal.

Assim, observar o que outras empresas do setor estavam fazendo foi uma resposta natural. É um exemplo daquilo que

não há um algoritmo mágico que diga a uma empresa o quanto ela tem de excesso de pessoal.

os psicólogos sociais chamam de “contágio social”: quando as pessoas estão em situações ambíguas, nas quais a maneira correta de se comportar não é óbvia, elas geralmente olham para o que os outros estão fazendo para decidir o que fazer.

As empresas de tecnologia estão ainda se equilibrando para manter felizes dois públicos bem diferentes: os funcionários, que geralmente ficam desesperados com as demissões, e os investidores, que geralmente as amam – de fato, o índice Nasdaq subiu 10% em janeiro. Se cortarem demais, vão prejudicar o time; se cortarem de menos, os investidores vão criticar.

O que os CEOs precisavam, nessas circunstâncias, era de um número que parecesse razoável e que os protegesse, até certo ponto, das críticas.

É isso o que o número 6% representa – justamente porque é a quantidade que tantas outras empresas, e em particular pesos pesados, como a Amazon e a Alphabet, escolheram. Afinal, se essa fosse uma jogada idiota, por que tanta gente estaria fazendo?

As empresas de tecnologia podem até se orgulhar de pensar fora da caixa no que diz respeito a seus negócios. Mas, quando se trata de contratar e demitir, não passam de um bando de maria-vai-com-as-outras.


SOBRE O AUTOR

James Surowiecki é jornalista e escritor, autor de "A Sabedoria das Multidões". saiba mais