Trazer mulheres de volta ao mercado de trabalho não é só feminismo, é um imperativo de negócios

Crédito: Klaus Vedfelt/ Unsplash

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Em janeiro deste ano, uma estatística chocante informou que os homens já haviam recuperado totalmente os empregos perdidos durante a pandemia de Covid-19. Infelizmente, o mesmo não aconteceu com as mulheres. No momento, a taxa de participação de mulheres adultas no mercado de trabalho gira em torno de 58%, apenas um pouco superior aos 57% de janeiro de 2021 – a maior baixa em 33 anos.

Acontece que essa questão não é exclusivamente feminina – ela afeta os negócios como um todo. Durante a pandemia, setores dominados por mulheres experimentaram taxas desproporcionalmente mais altas de cortes de empregos. Questões sistêmicas também impedem que elas retornem ao mercado de trabalho.

Como membro fundadora do Women in Entrepreneurship Institute (WEI - Instituto de Mulheres no Empreendedorismo), da DePaul University, conheço de perto o impacto de abordar os obstáculos das mulheres como uma questão empresarial. As empresas WEI adotaram uma abordagem sistêmica e todas permaneceram abertas durante a pandemia.

Quando as mulheres são reprimidas, os negócios sofrem. Em contrapartida, o empoderamento feminino propicia crescimento econômico. Como exemplo, considere o estado atual do emprego. Se mais mulheres retornassem ao mercado de trabalho, menos empresas estariam lutando contra a falta de pessoal. Os líderes que de fato quiserem acabar com esse fenômeno – que, no início da pandemia, foi rotulado como “recessão feminina” –, precisarão mudar os sistemas que barram a ascensão profissional das mulheres. 

CRECHES E CUIDADOS INFANTIS

Quando você descobre que cerca de três milhões de mulheres abandonaram a força de trabalho durante a pandemia, é fácil encarar isso como uma questão de escolhas individuais. Mas a falta de acesso a creches e a mudança para o aprendizado remoto foram problemas estruturais que forçaram as mulheres a abandonar a força de trabalho.

Pesquisas mostram que o fardo de descobrir como cuidar das crianças e de educá-las recai desproporcionalmente sobre as mulheres. De fato, o número das que ficaram desempregadas por conta do fechamento das creches foi o dobro da taxa de homens afastados pela mesma razão. Surpreendentemente, no entanto, as pesquisas apontam algumas mudanças: quase um terço dos pais decidiram que assumiriam as responsabilidades de cuidar dos filhos porque se consideravam “melhores nisso”.

Mulheres sem diploma universitário, negras e de baixa renda foram as que perderam mais horas de trabalho devido aos cuidados com os filhos. Da mesma forma, as pessoas negras – as mais atingidas pela pandemia – foram as que mais mantiveram seus filhos em casa, devido ao medo da contaminação pelo vírus nas escolas. Isso significa que mais mulheres negras precisaram deixar seus empregos ou reduzir horas de expediente para cuidar de seus filhos.

Sem uma grande ampliação do acesso aos cuidados infantis, vai ser difícil ou impossível que as mulheres voltem ao trabalho na mesma proporção que os homens. Isso poderia ser resolvido se explorássemos os benefícios de creche para os funcionários. Subsídios ou oferta de creches no local de trabalho são ótimas saídas, e ainda propiciam arranjos de trabalho mais flexíveis. Um estudo recente da Catalyst descobriu que as mulheres com necessidade de dedicar tempo aos cuidados infantis têm 32% menos probabilidade de desistir quando podem trabalhar remotamente.

DIFERENÇAS NAS EXPECTATIVAS DE GÊNERO

Um quarto das mulheres que ficaram desempregadas durante o lockdown citou a falta de creche como o principal motivo para isso – e para muitas famílias, pode ser que essa situação não melhore. Um relatório do Center for American Progress estima que cerca de 4,5 milhões de vagas de creche perdidas durante a pandemia podem desaparecer para sempre. Se as taxas de participação da força de trabalho materna permanecerem as mesmas durante os estágios iniciais do lockdown, isso equivalerá a US$ 64,5 bilhões em salários perdidos para as famílias norte-americanas por ano.

Mas, se há algum lado positivo na pandemia, é que o tempo de isolamento em casa fez com que esses “problemas femininos” passassem a mobilizar muitos homens. Mesmo as famílias que não foram afetadas financeiramente durante o isolamento sentiram a tensão de conciliar o trabalho e a vida doméstica naquela fase. Os homens que talvez não tivessem real noção de todo o trabalho não remunerado que suas parceiras estavam fazendo nos bastidores tiveram mais de um ano para observá-las em ação. 

Essa consciência masculina forçada foi um ponto de virada. Se você for homem, pare de esperar que as mulheres precisem se impor para serem ouvidas. A falta de consciência até mesmo dos homens mais bem-intencionados os impede de se posicionar na linha de frente pela mudança. Uma mulher que conheço descreveu sem rodeios essa situação: “Meu chefe não faz a menor ideia do malabarismo que eu faço todos os dias”.

Os homens desenvolvem uma maior consciência situacional quando conseguem enxergar e entender as diferenças de poder de gênero em casa e no local de trabalho. Por meio dessa conscientização, ou dessa “inteligência de gênero”, eles também podem passar a pensar em diferentes formas de informar e de promover políticas de igualdade de gênero.

COMO APOIAR AS MUDANÇAS

De acordo com o Boston Consulting Group, houve progresso econômico em 96% das empresas em que os homens estão engajados nos esforços de inclusão. A liderança pode mostrar aos homens de sua equipe que eles são desejados e necessários na luta por maior diversidade e inclusão. De acordo com o White Men’s Leadership Study (Estudo Liderança Branca Masculina), 68% dos participantes brancos do sexo masculino simplesmente não sabiam que pauta da diversidade não os excluía totalmente.

Além de comunicar aos homens que os quer à mesa, você deve mostrar a eles que colocar as necessidades das mulheres em primeiro lugar não é nenhum favor, pois beneficia toda a empresa. Pesquisas mostram que empresas com diversidade de gênero na liderança superam empresas menos diversificadas. Organizações com maior diversidade de gênero também são mais produtivas, criativas e atraentes para os investidores. Promover essa diversidade requer mudanças nas estruturas, nas funções e nos benefícios dos funcionários no local de trabalho.

Até recentemente, a maioria dos homens brancos dava pouca atenção aos seus privilégios e, de repente, ouvir os grupos a que pertencem sendo criticados pode colocá-los na defensiva. Isso é desculpa para evitar conversas difíceis que possam incomodar funcionários privilegiados. Em vez disso, é mais um motivo para tentar criar um ambiente no qual todos queiram fazer parte da solução – e não continuar sendo parte do problema.

A verdade é que os ambientes de trabalho contribuíram historicamente para a dura realidade que as mulheres enfrentam hoje. Mas é hora de começar a assumir essa responsabilidade e de abordar os problemas sistêmicos que prejudicam mais da metade da população.


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