Pecuária em países ricos: bom para a economia, péssimo para o meio ambiente

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Nos últimos anos, tem crescido o movimento contra o consumo excessivo de carne. Os ambientalistas apontam que a produção de carne está dentre as principais causas da mudança climática, do desmatamento, da perda de biodiversidade e da poluição da água. Os defensores da saúde afirmam que consumir muitos produtos de origem animal aumenta as chances de diversos problemas, desde doenças cardíacas até câncer. Os ativistas do bem-estar animal, por sua vez, argumentam que é hora de dar um basta na crueldade com os animais para abate.

Na tentativa de retardar o rápido aumento do consumo de carne em nações altamente industrializadas, os aliados desse movimento têm usado uma variedade de táticas que vão desde a conscientizar a população até oferecer às massas mais opções veganas, como fazem a Impossible Foods e a Beyond Meat. Mas alguns, ao interpretarem essas ações como uma mensagem generalizante de que “carne é ruim”, têm levantado a seguinte questão:  pressionar as pessoas a comer menos carne poderia prejudicar países de baixa renda, porque neles a pecuária serve como um valioso ativo econômico e alimentar.

No entanto, ao contrário do que pode parecer a princípio, esse argumento é falacioso. Com raras exceções, nenhum ativista está fazendo campanha pela redução do consumo de carne em lugares com insegurança alimentar. Praticamente nenhum ativista ambiental, da área da saúde ou mesmo dos direitos dos animais, está focando em pequenas fazendas de propriedade e gestão independentes. Além disso, criticar e pressionar a pecuária industrial ocidental não afeta a disponibilidade ou legitimidade do consumo de carne em países de baixa renda. Essas duas coisas, na verdade, não estão relacionadas. 

CRITICAR E PRESSIONAR A PECUÁRIA INDUSTRIAL OCIDENTAL NÃO AFETA A DISPONIBILIDADE OU LEGITIMIDADE DO CONSUMO DE CARNE EM PAÍSES DE BAIXA RENDA.

Os ativistas voltam sua atenção para os casos em que grandes corporações internacionais do agronegócio exploram os países de baixa renda, bem como as pessoas e os ecossistemas dentro deles. A implementação da pecuária de confinamento ao estilo dos EUA – instalações agrícolas industriais de grande escala, que confinam animais em condições torturantes para produzir carne, ovos ou leite baratos – traz tudo, menos prosperidade para pessoas empobrecidas ao redor do mundo.

Conhecidas nos Estados Unidos como CAFOs (Concentrated Animal Feeding Operations, na sigla em inglês), essas instalações aumentam o risco de doenças zoonóticas, da resistência a antibióticos e de contaminação, bem como a degradação da terra e o desmatamento, de acordo com a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO). As corporações internacionais de carne, como JBS e Cargill, estão entre os maiores culpados pelo desmatamento na Amazônia brasileira e no Cerrado, destruindo inclusive terras protegidas para a criação de gado.

Se aumentar a disponibilidade de proteína animail é a melhor maneira de apoiar pessoas que vivem em condições de pobreza em todo o mundo, que assim seja. Mas se as potências ocidentais estão tomando decisões em nome dessas pessoas e de suas nações, vale a pena investigar exatamente quem está se beneficiando desses métodos.

Uma pesquisa da Johns Hopkins descobriu que a adoção do estilo de produção industrial de alimentos dos EUA em países de baixa e média renda ocorrerá à custa de grandes ameaças à saúde pública e ao meio ambiente. Outro grande estudo, feito em conjunto por pesquisadores de universidades norte-americanas, europeias e de Cingapura, esclarece especificamente duas coisas: a primeira é que a redução do consumo global de produtos animais é importante tanto para a saúde humana quanto para a sustentabilidade ambiental. E a segunda é que países diferentes exigirão soluções também diferentes.

A REDUÇÃO DO CONSUMO GLOBAL DE PRODUTOS ANIMAIS É IMPORTANTE TANTO PARA A SAÚDE HUMANA QUANTO PARA A SUSTENTABILIDADE AMBIENTAL.

Se realmente quisermos ajudar os países de baixa renda, e o planeta como um todo, precisamos encontrar modelos melhores do que o “padrão alimentar ocidental”, como esse estudo o nomeia. Poderíamos começar zerando o desmatamento e reduzindo os danos climáticos causados ​​por nossos sistemas alimentares, que estão destruindo a agricultura em todo o mundo. Ou, ainda, fornecendo ajuda para reduzir a pobreza e apoiar os alimentos indígenas. Estas são apenas algumas maneiras de “limpar nossa própria casa” e que podem, ao mesmo tempo, possibilitar que pessoas no mundo todo deem continuidade a práticas agrícolas sustentáveis

Se os programas de ajuda externa passarem a ter processos de concessão mais rigorosos, que envolvem considerar a paisagem, a escassez de água, os conflitos existentes e potenciais com a vida selvagem e as alternativas localmente apropriadas para a segurança alimentar, então eles não são o alvo do movimento para acabar com a pecuária industrial – e não faria sentido que fossem.

Mas se o oposto for verdade, se os programas de ajuda fazem uma análise insuficiente e uma triagem relapsa da adequação do material que vão oferecer (gado, sementes etc.) e se eles estão mais preocupados com os números dos quais poderão se vangloriar nos comunicados à imprensa, então essa tentativa ostensiva de “ajuda” apenas trará dificuldades adicionais de longo prazo.

Pelo bem da saúde humana e pelo bem-estar do planeta, precisamos desmontar a indústria da pecuária tal qual a conhecemos nos Estados Unidos – mas também precisamos impedir que essa indústria se aproxime e tome conta das nações que estão em transição em termos de desenvolvimento econômico e industrial.


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