As novas regras do jogo do capital para financiamento de startups

A pandemia alavancou o mercado das startups. Agora, as regras estão sendo reescritas

Crédito: Alex Souza/ Pexels

Connie Lin 5 minutos de leitura

A pandemia acelerou como nunca a corrida das startups. Parecia que o céu era o limite. Para os investidores de capital de risco, as apostas e os lucros só aumentavam. Para as empresas em busca de financiamento, era a hora do tudo ou nada.  

Durante o Most Innovative Companies Summit, evento organizado pela Fast Company, muitos palestrantes relembraram a atmosfera desse período recente.

“Ao longo de 2020 e 2021, o mantra ao qual muitas empresas de tecnologia aderiram foi: crescer, crescer, crescer. Não era mais uma questão de valer a pena ou não, mas sim do quão rápido você conseguiria aumentar sua receita”, lembrou Joe Thomas, cofundador e CEO da Loom, uma plataforma de mensagens de vídeo para ambientes de trabalho.

Parte do que estamos vendo no setor de tecnologia é um retorno aos padrões normais, não um encolhimento.

Mas, no ano passado, foi preciso tirar o pé do acelerador. O capital de risco precisou dar uma parada e recuperar o fôlego. “Agora, o mantra virou: cortar os custos e manter margens para algum crescimento”, comparou Thomas. “Quanto a empresa está gastando de sua reserva de caixa para cobrir custos fixos?”

A contratação excessiva era o erro mais óbvio. Nos últimos meses, as demissões varreram a indústria de tecnologia. Algumas grandes empresas, como Amazon, Netflix e Zoom, anunciaram cortes de empregos na casa dos milhares.

Mas, por mais terrível que essas notícias possam parecer, não são uma sentença de morte para as startups. Longe disso, explicou Brett House, professor de economia da Columbia Business School e membro de políticas públicas da Universidade de Toronto. 

“Parte do que estamos vendo no setor de tecnologia é um retorno aos padrões normais, não um encolhimento. Voltar à normalidade causa estranheza, tanto quanto o desvio do normal.”

É claro que tudo isso tem sido um pouco enlouquecedor para as startups. As regras do jogo já mudaram duas vezes em pouco tempo: primeiro, quando elas precisaram navegar a todo vapor nos tempos de pandemia; agora, quando tentam manter o barco à tona conforme a maré sobe.

“Os dois últimos anos foram caóticos”, disse Thomas, que teve sorte ao apostar alto em videoconferência anos antes do surgimento da Covid-19. “Os últimos 12 meses foram um pouco mais baseados em princípios, giraram em torno dos fundamentos do negócio.” Em outras palavras, precisamos voltar a estudar e revisar os princípios básicos do empreendedorismo.

CLIMA MACROECONÔMICO

O que é necessário para ter sucesso nessa nova fase? House apontou dois fatores principais, sendo um deles os negócios que reduzem as dificuldades do usuário em uma sociedade cada vez mais sem paciência para complicações.

“Existem muitas ideias que são ótimas por si só, mas que ainda são pouco palatáveis para uma pessoa comum”, diz House. É o caso da criptomoeda, por exemplo – descobrir como usar carteiras e trocas digitais pode ser confuso.

Considerando o quadro geral dos últimos 50 anos, não significa que este não seja um bom momento para construir um negócio.

Mas a invenção dos fundos negociados em bolsa de valores (ETFs) criptográficos, que permitem que leigos invistam sem ter que disputar as próprias participações criptográficas, os ajudou a superar as barreiras de entrada nesse universo.

O segundo fator é o timing: entender como os astros se alinham no céu da macroeconomia. “Assim como novas questões socioculturais podem acabar derrubando qualquer plano, o macroambiente econômico pode alterar o microambiente de modo imprevisível”, alertou House.

Na verdade, o clima macro está preparado para a inovação neste momento. Segundo ele, em termos de dinheiro vindo de capital de risco, há uma “enorme quantidade de pólvora”, apenas esperando para ser queimada no momento certo. Acontece que as empresas estão levando mais tempo para examinar investimentos em potencial e para encontrar anjos em estágio inicial que irão decolar.

“Tem sido mais difícil”, admitiu Thomas, cuja startup é um aplicativo inspirado no Vine e no TikTok para gravar e enviar mensagens de vídeo entre colegas de trabalho. “Mas isso não significa, considerando o quadro geral dos últimos 50 anos, que este não seja um bom momento para construir um negócio.”

TREM DA ALEGRIA PAROU DE RODAR

Para aqueles com grandes ambições, House sugeriu novas regras de conduta. “Abrace a incerteza, porque ela cria janelas de oportunidade que não existiriam de outra forma.

As empresas que se movem mais rápido são mais propensas a evitar a espiral da morte.

Mantenha-se ágil. Não tenha medo de desistir do que você se comprometeu a fazer se isso não estiver mais funcionando. Às vezes, fechar uma porta é exatamente o que permite que outra porta se abra. Não deixe que custos irrecuperáveis – um compromisso com uma bela ideia que simplesmente não está indo para frente – o impeçam de capitalizar sobre outra ideia que está bem na sua cara.”

“As empresas que se movem mais rápido são mais propensas a evitar a espiral da morte”, concordou Thomas, citando uma frase de efeito da Sequoia Capital. Mas com uma ressalva. “Por mais que você esteja alerta... Não aja precipitadamente”, aconselhou, ao observar que o condenado Silicon Valley Bank, que quebrou em março, foi vítima da “corrida bancária mais rápida de todos os tempos”. Mas, se as empresas não tivessem corrido para tirar seu dinheiro do sistema em colapso,“o SVB poderia ter continuado bem.”

O colapso do banco foi o sinal mais claro de que o trem da alegria da pandemia em que as startups de tecnologia embarcaram chegou à estação. Agora, elas têm que andar com as próprias pernas. Mas se você olhar para o quadro geral, isso não é de todo ruim.

“Acho que nenhum de nós gostaria de reviver 2020, que foi um ano terrível em um sentido mais amplo”, House ponderou. “Duvido que alguma família consiga olhar para seus álbuns de fotos tiradas em 2020 e lembrar dele como o melhor ano de todos os tempos.”


SOBRE A AUTORA

Connie Lin é jornalista e colaboradora da Fast Company. saiba mais