Muitas empresas prometeram deixar a Rússia, mas várias continuam por lá

Organização de vigilância MRA afirma que gigantes como Disney, Goldman Sachs e Citigroup ainda estão fazendo negócios com os russos

Crédito:  Social Income/ Unsplash

Redação Fast Company 5 minutos de leitura

Depois da invasão da Ucrânia pela Rússia, empresas e mais empresas ao redor do mundo declararam suas intenções de deixar o mercado russo. Algumas tinham menos inclinação de levar essa ruptura a cabo, mas a pressão pública acabou forçando centenas delas a fazerem uma retirada completa e abrupta, de acordo com a lista mantida por Jeffrey Sonnenfeld, professor da Yale School of Management.

No entanto, uma nova investigação divulgada na semana passada revela que muitas empresas que haviam se comprometido a parar de fazer negócios na Rússia não se retiraram totalmente.

O relatório, feito por uma organização britânica chamada Moral Rating Agency (MRA), fundada após a invasão, avaliou as 200 maiores empresas do mundo. Das 114 ativas na Rússia quando a Ucrânia foi invadida, a organização contabiliza que apenas sete (6%) romperam completamente. Outras 44 (o equivalente a 39%), muitas das quais sediadas na China, sequer chegaram a anunciar a intenção de retirada.

Mais da metade das companhias da lista (63, ou 55%) ficaram no meio-termo, retirando-se em parte, mas não completamente. Esse grupo foi o principal alvo do relatório do MRA. “Muitas delas afirmam que cortaram os laços com a Rússia, mas na verdade continuam com algumas atividades, ou não cumprem as promessas”, diz o grupo, que se refere a essa prática como “lavagem moral”.

Na investigação, a MRA classificou as empresas em categorias bastante reveladoras. Foram criticadas as que mantiveram prédios e funcionários a fim de agilizar uma possível reentrada no mercado; as que criaram exceções “humanitárias” para certos produtos (como Nestlé e PepsiCo, que continuam a vender leite); bem como quem se comprometeu a vender ativos ou a suspender atividades, mas não estabeleceu nenhum prazo.

IMPORTAÇÃO OU NÃO?

No que diz respeito às empresas que se aproveitam de algumas brechas, a organização identificou mais uma categoria de infratores: os que listam publicamente as operações que estão suspendendo, mas que, convenientemente, omitem as atividades que permanecem – aquelas que podem custas mais caro para abandonar.

55% das companhias listadas pela MRA ficaram no meio-termo, retirando-se em parte, mas não totalmente.

Um exemplo citado é o fornecimento de materiais da Apple. Em março, observando que devia se “juntar a todos aqueles ao redor do mundo que clamam por paz”, a companhia recebeu aplausos por pausar as vendas de seus produtos e até desligar a Apple Pay – uma decisão que lhe custou uma ação coletiva de consumidores russos.

O relatório da MRA desmascara a Apple dizendo que ela “pausou” as vendas, mas que, essencialmente, deixou a porta aberta para reentrar no mercado local. O relatório aponta ainda que a empresa não falou em cessar a importação de três metais raros usados ​​em seus produtos: ouro, tungstênio e tântalo.

A Apple divulgou, em dezembro de 2021, na Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos (SEC), que estava comprando ouro de cinco fábricas russas, tungstênio de quatro e tântalo de uma. Um porta-voz da Apple disse que, atualmente, a companhia não importa esses metais.

No entanto, a posição da MRA é que para estar “fora” da Rússia, a Apple precisa divulgar publicamente que parou de comprá-los, quando cessou as operações e por quanto tempo essa medida ficará em vigor. “Nossas classificações são baseadas na divulgação de suspensões”, diz o fundador da MRA, Mark Dixon. “Não podemos dar crédito a uma suspensão se ela não for divulgada publicamente.”

"HUMANITÁRIA CONFUSA"

Outra que a organização coloca na lista negra é a The Walt Disney Company, que alega ainda administrar um porto em São Petersburgo para sua linha de cruzeiros e pagar salários de funcionários – e, portanto, impostos ao governo russo.

Citando a “invasão não provocada da Ucrânia” pela Rússia, a Disney disse, no início de março, que estava suspendendo todos os negócios no país. Ela já havia interrompido o lançamento de novos filmes na semana anterior e alegado que medidas adicionais estavam sendo tomadas para encerrar as operações restantes.

“Não podemos dar crédito a uma suspensão se ela não for divulgada publicamente.”

“Isso inclui licenciamento de conteúdo e produtos, atividades da Disney Cruise Line, revista e passeios da "National Geographic", produções de conteúdo local e canais”, divulgou a companhia em comunicado à imprensa. Certas atividades poderiam ser interrompidas imediatamente, mas outras levariam tempo, “dadas as complexidades contratuais”. Os exemplos foram os canais de TV e alguns conteúdos e licenciamento de produtos.

A Disney interrompeu o uso diário do porto de cruzeiros de São Petersburgo, mas acrescentou que “continuamos comprometidos com nossos dedicados colegas na Rússia, que permanecerão empregados”. A MRA chama a companhia de "humanitária confusa” por “colocar o bem-estar dos funcionários à frente do propósito de minar a economia russa com um boicote adequado”. A Disney disse à Fast Company que contesta o relatório da MRA.

SOB PRESSÃO

Outras empresas argumentaram, desde o primeiro dia, que o desembaraço da Rússia levaria tempo. Bancos como Citigroup e Goldman Sachs se comprometeram a fazer saques sem prazos, mas o MRA não aceita isso como desculpa. Seu relatório observa que o Citigroup e o Goldman podem ter parado de conquistar novos clientes, mas ambos continuam ativamente a realizar negócios com os clientes que tinham antes da invasão.

O Citigroup disse à Fast Company que continua a reduzir as operações restantes na Rússia, mas “que devido à natureza do setor bancário e das operações de serviços financeiros, esta decisão levará tempo para ser executada.”

Seja qual for o caso, a MRA é pouco tolerante em relação às empresas que continuam operando na Rússia. Sua campanha procura aplicar mais pressão sobre as que se comprometeram a sair, mas simplesmente não o fizeram. “A Rússia é uma batata tão quente que as empresas estão fazendo uma ‘lavagem moral’ para esconder sua inação ou ação incompleta no país”, diz Dixon.

Segundo ele, quando as acusadas admitem que não se retiraram totalmente, “são magistrais em inventar desculpas. Gostaria que elas gastassem tanta energia deixando o país completamente quanto gastam fingindo que já o fizeram.”

Com base em texto de Clint Rainey.


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