A verdade é que ninguém sabe (ainda) como serão as compras no metaverso

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Somos uma sociedade que compra – e que compra muito. Consumir está entre as coisas que mais fazemos, principalmente durante esta pandemia. Como será, então, que funcionarão as compras no metaverso?

Devemos começar nos perguntando o que vamos querer comprar lá, onde e como vamos usar essas compras. Se as apostas dos capitalistas de risco e de Mark Zuckerberg estiverem certas, logo estaremos todos usando óculos de realidade virtual, vagando por um mundo colorido, engajados em várias atividades ao mesmo tempo. Boa parte de nossas ações será comercialmente orientada para gerar receita para proprietários digitais sem rosto. Em essência, o simples fato de estarmos presentes no metaverso, de existirmos em seus ambientes, será uma forma de consumir por lá.

Viver no metaverso vai custar dinheiro, e o custo de entrada já incluirá algumas compras. Se vamos ser representados por avatares interagindo em um ambiente 3D realista, então precisaremos de roupas digitais, casas digitais, tudo digital. Podemos precisar até de segundos empregos digitais para ganhar dinheiro digital para pagar por todas essas coisas. Possivelmente, logo pagaremos também impostos digitais.

É bem provável que o metaverso nos ofereça s muitas opções novas e diferentes de como comprar e como expressar nosso status. Uma maneira de continuarmos a fazer compras é no conforto de nossas casas. Podemos estar vestindo nosso melhor NFT, desfilando pelas ruas e olhando as vitrines de um bairro chique, enquanto fisicamente estamos sentados, sozinhos em nossos sofás. Mas será que vão existir Oscar Freires ou Rodeo Drives no metaverso? Ainda precisaremos de ruas em um mundo sintetizado, onde tecnicamente nem precisaremos de nossos corpos?

COMPRAR É UMA ATIVIDADE SOCIAL

Fazer compras é uma atividade extremamente social e cooperativa. Quer estejamos fisicamente com as pessoas (local ou remotamente), quer estejamos apenas pensando nelas quando fazemos compras, interagimos socialmente. Negociamos, pedimos ajuda e coletamos opiniões. Ajudamos outras pessoas a comprar. A maior parte desse aspecto social foi erodido pelas compras digitais, mas a interação social continuará no metaverso.

AINDA PRECISAREMOS DE RUAS EM UM MUNDO SINTETIZADO, ONDE TECNICAMENTE NEM PRECISAREMOS DE NOSSOS CORPOS?

A cadeia de consumo mobiliza grandes quantidades de cooperação e de coordenação humana. Os produtos são criados, enviados, armazenados, recolhidos, carregados, embalados e enviados novamente. Mas, como não podemos enxergar todas essas atividades, perdemos de vista o quanto precisamos uns dos outros e o quão poderosa é essa cadeia de suprimentos – a não ser, é claro, que algum motivo de força maior a interrompa.

Comprar digitalmente acabou nos acostumando a achar que toda essa coordenação social está para sempre garantida, só porque está fora de nosso campo de visão. Compramos através das telas dos laptops, tablets e telefones celulares, acessando grades e listas de mercadorias em “lojas” online, muitas das quais são parecidíssimas umas com as outras, não importa se estamos comprando pizzas, sapatos ou um carro novo.

Os itens que compramos são commodities; a experiência de fazer compras na web também tende a ser e parecer comoditizada. Por exemplo, até hoje as compras digitais não são táteis. Não temos certeza do quão grandes ou pequenos são os itens, é difícil julgar o corte das roupas ou sentir a aspereza de um tecido. Sequer podemos confiar que estamos vendo representações precisas das cores.

Os videoclipes e modelos 3D giratórios em sites de compras nos ajudam a entender os itens que estamos pensando em comprar, mas ainda não há feedback tátil. Isso é algo que a tecnologia do metaverso pode vir a abordar, por meio de realidade aumentada ou virtual com feedback háptico, dando às compras digitais uma dimensionalidade tátil que até agora está faltando.

MUITO ALÉM DAS DEMOS ATUAIS

Felizmente, o metaverso não será parecido com as versões demo apresentadas até agora.  Em vez disso,  vai misturar ambientes renderizados e analógicos. Quem se dispuser a sair de casa e a usar óculos de realidade aumentada – em lugar de óculos de realidade virtual, que obscurecem a visão – terá acesso a novas maneiras de enxergar o que costumava estar vinculado à localização física. Usando essas tecnologias, seremos ainda mais capazes de transcender as fronteiras e limites dos espaços físicos onde atualmente fazemos compras.

A EXPERIÊNCIA DE FAZER COMPRAS NA WEB TENDE A SER E PARECER COMODITIZADA.

Hoje, enquanto estamos na loja, podemos consultar o celular para comparar ofertas de outros lugares. Com o metaverso, camadas de dados de realidade aumentada aparecerão automaticamente sobre as mercadorias físicas onde quer que você esteja, com acesso potencial a enormes repositórios de dados, agentes e inventários. Os varejistas também terão um relacionamento diferente com os  consumidores, competindo para se diferenciar de qualquer outra pessoa que possa aparecer em no telinha com uma oferta melhor.

A menos, é claro, que desejemos pagar pelo preço do status. Grandes marcas, como Gucci, Chanel e Balenciaga, já estão criando roupas virtuais para que possamos traduzir status e estilo para nossos “eus” virtuais na parte de realidade virtual do metaverso. O Twitter está habilitando avatares NFT em perfis de usuários. Tais diferenciais se tornarão cada vez mais cobiçados. É aí que os varejistas terão uma grande oportunidade – a exclusividade e a personalização de itens de status digital para o metaverso serão outra maneira de definir o status social, como fazemos agora no mundo físico.

Alguns aspectos das compras no metaverso são preocupantes. Se estamos migrando para um ambiente virtual ou para uma camada digital sempre ativa sobre o espaço comum, então logo estaremos vivendo em uma realidade mista. Andar pelos espaços comuns usando óculos de realidade aumentada enquanto tentamos fazer compras dividirá nossa atenção e nos distrairá. Se outro estiverem fazendo a mesma coisa ao mesmo tempo, isso tende a provocar acidentes, já que as pessoas podem colidir umas com as outras.

Além disso, nossas atividades de consumo provavelmente alimentarão algum dossiê gigante com dados sobre nossos hábitos, conforme compramos e vivemos no metaverso. Quando todas as nossas compras no metaverso forem mediadas, elas poderão ser analisadas e mais inferências poderão ser feitas sobre nós.

Mas comprar no metaverso provavelmente não será como prevemos atualmente, e isso ainda nos garante algum espaço para planejar nossas estratégias. Uma opção é, enquanto for viável, não participar do espaço do Meta para fazer compras. Embora as compras do metaverso redefinam o tecido social e tornem mais desafiadora a conexão entre as pessoas, ainda temos a opção de procurar vendedores de carne e osso em lojas físicas. Pelo menos por enquanto, até precisarmos comprar algumas roupas digitais da moda para cobrir nossos avatares.


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