Como as novas tecnologias da NASA serão aplicadas na Terra

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De câmeras de celular a microchips, a tecnologia da NASA está em todo lugar.

Desde o Programa Apollo, as tecnologias desenvolvidas pela NASA vêm sendo implementadas em produtos do nosso dia a dia – a tal ponto que a agência espacial criou o Programa de Transferência de Tecnologia (T2) em 1976 para facilitar o acesso de suas patentes ao público. É bastante provável que os atletas que irão competir no Super Bowl em fevereiro estejam treinando em aparelhos similares às esteiras antigravidade usadas por astronautas na Estação Espacial Internacional. Outra tecnologia que demos outra aplicação foram os amortecedores de vibração de foguetes do Sistema de Lançamento Espacial – programado para seu primeiro voo de teste no outono deste ano –, que estão sendo utilizados para amenizar os tremores em alguns dos arranha-céus de Manhattan.

Dan Lockney (Crédito: NASA)

Cientistas e engenheiros da NASA inventam uma média de 1.600 a 1.800 dispositivos e desenvolvem cerca de 5.500 softwares por ano, embora nem todos sejam colocados no mercado. No ano passado, a agência espacial licenciou patentes para apenas 220 empresas, de acordo com Dan Lockney, executivo do programa T2 há duas décadas. Embora o site do programa apresente uma lista de todo o seu portfólio de patentes e softwares, bem como exemplos de aplicações na indústria, a publicação intitulada Spinoff destaca as transferências de tecnologias mais inovadoras de cada ano. “É como se fosse uma coletânea de maiores sucessos e inclui relatos interessantes do que temos feito ultimamente”, diz Lockney.

A edição deste ano, publicada hoje no site da Spinoff, mostra 46 empresas que adaptaram as tecnologias da NASA no ano passado, além conter artigos sobre o impacto da agência em diversos setores, como, por exemplo, com a criação da primeira fazenda vertical, que dará início à agricultura interna. A publicação conta com curadoria para incluir uma ampla variedade geográfica, de setores e de representatividade.

A Câmara de Produção de Biomassa no Kennedy Space Center, na Flórida, replica o ambiente fechado de cultivo que os astronautas usarão no espaço ou em outros planetas (à esquerda). E a Plenty Unlimited adaptou essa tecnologia, adicionando robôs e dados agrícolas para otimizar as condições de cultivo (à direita). (Crédito: NASA, Plenty Unlimited)

O Spinoff também apresenta histórias publicadas em edições anteriores e inéditas, como árvores inoculadas com bactérias que são capazes de reduzir a poluição. Além de uma luva semelhante à do Homem de Ferro chamada de RoboGlove, desenvolvida com a General Motors que proporciona suporte e força extra aos movimentos, como a uma versão manual de um exoesqueleto motorizado. Já a Outlast Technologies, do Colorado, em parceria com a Walero, do Reino Unido, aplicou a tecnologia de trajes espaciais em roupas esportivas capazes de regular a temperatura para pilotos profissionais. O Lunar Outpost, por sua vez, está adaptando um sensor que detecta os níveis de poeira lunar para medir a poluição do ar. O material desenvolvido para isolamento criogênico no espaço foi incorporado a um equipamento externo para manter as pessoas (e baterias) aquecidas. Um sistema para o cultivo de plantas no espaço agora ajuda a melhorar a qualidade do ar interno e reduz a propagação de vírus no ar, como o coronavírus. Já a tecnologia para aproveitar o dióxido de carbono em Marte foi reaproveitada tanto para controle de emissões quanto para a fabricação de cerveja carbonatada.

O astronauta Drew Feustel (à esquerda) e a pilota de rally romena Cristiana Oprea (à direita) usando a roupa esportiva da Walero capaz de regular a temperatura, originalmente desenvolvida para a NASA. (Crédito: NASA, Walero)

A publicação também acaba de vez com lenda urbana do suposto fracasso da caneta espacial usada por astronautas da NASA, enquanto os russos utilizavam lápis. Na verdade, tanto astronautas quanto cosmonautas usam a caneta espacial pressurizada Fisher para escrever no espaço desde os anos 60, e no ano passado ela entrou para o Hall da Fama da Tecnologia Espacial. “Não usamos lápis porque é muito fácil de quebrar a ponta”, esclarece Lockney.

A NASA recebe e busca empresas de todo o mundo que queiram produzir novas tecnologias a partir de suas invenções, embora todas passem por um rigoroso processo de inscrição. “Nos certificamos que nossa propriedade intelectual não seja prejudicada por empresas que não são sérias”, diz Lockney. “Estamos dispostos a permitir que usem nossas patentes, mas a empresa precisa demonstrar inteligência técnica e de negócios e possuir os recursos para colocar a tecnologia no mercado.”

Caneta Fisher Bullet, modelo comemorativo do 50º aniversário da Space Pen. (Crédito: Fisher Pen Company)

O software da NASA é gratuito e não requer inscrição. Mas as taxas médias de licenciamento para dispositivos patenteados giram em torno de US$ 5 mil a US$ 10 mil, e grande parte desse valor é repassado ao inventor como incentivo. “As pessoas não enriquecem NASA, mas escolhem trabalhar lá porque querem trabalhar em uma agência espacial deste porte”, afirma Lockney. A agência também oferece isenção de taxas para startups e estudantes universitários. “Queremos que eles tirem proveito da pesquisa e do desenvolvimento que temos na NASA para beneficiar seus próprios negócios”.

AJUDA EM DESASTRES

A comercialização é apenas uma forma de transferência de tecnologia. O know-how da NASA também contribui com ações de busca e resgate – desde a revisão de equipamentos de proteção de combate a incêndios até a utilização da tecnologia de radar remoto para detectar sobreviventes de soterramento. Após grandes desastres, “é comum recebermos uma ligação do departamento de estado, perguntando: ‘Vocês têm alguma tecnologia que possa ajudar com isso?’”, conta Lockney.

Em 2010, quando 33 mineiros chilenos ficaram soterrados, a NASA não apenas enviou engenheiros, que ajudaram a desenvolver um trenó de resgate, mas também psicólogos e especialistas em confinamento e reintegração para ajudar a conter o pânico e preparar as vítimas para o assédio da imprensa. Assim que a pandemia tomou conta do mundo e causou impactos fortes nas cadeias de produção, um grupo de engenheiros do Jet Propulsion Laboratory criou um ventilador pulmonar que não dependia da cadeia de suprimentos tradicional para a confecção de peças. E, após obter autorização em caráter de emergência do FDA, licenciou-o gratuitamente para 40 empresas em todo o mundo.

RUMO AO FUTURO

A seção Spinoffs of Tomorrow destaca 20 tecnologias da NASA prontas para ser postas no mercado. Dentre elas um sistema de verificação biométrica para desbloquear telefones e computadores que utilizam batimentos cardíacos; um dispositivo de nanomaterial que converte dióxido de carbono em combustível; e um alumínio autorregenerativo que é capaz de reparar rachaduras e reverter danos em estruturas, como aeronaves, tanques de guerra e linhas de combustível.

Lockney cita outras tecnologias ainda em desenvolvimento, como o cultivo de sangue, tecidos e culturas de células em gravidade zero para experimentos farmacológicos. Dadas as ambições da agência em realizar missões espaciais humanas de longo prazo, Lockney especula sobre os futuros avanços da tecnologia médica e de telemedicina, com a integração de novos materiais e técnicas de fabricação em gravidade zero, além de formas de purificar e limpar tanto o ar quanto a água. “No espaço, precisaremos reciclar, e precisamos fazer isso aqui também”, explica ele.

A única certeza que o executivo do programa tem é que o futuro será surpreendente. “O divertido é que não sabemos o que vamos precisar no futuro ou qual problema vamos encarar.”, diz ele. “E essa é a parte que acho mais fascinante.”


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