Barreiras artificiais protegem a população do litoral, mas aumentam o aquecimento global

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O terremoto de Tōhoku, de 2011, continua sendo o maior já registrado na história japonesa. Ele criou um tsunami que atingiu mais de 40 metros e desmantelou com facilidade as defesas contra inundações no nordeste do Japão, tirando a vida de cerca de 16.000 pessoas.

Tentando proteger melhor as comunidades no futuro, as autoridades japonesas optaram por construir defesas costeiras ainda maiores. Muros de concreto que se estendem por 400 km – e que atingem quase 15 metros de altura em alguns lugares – agora se alinham na costa para resistir às ondas e para garantir tempo suficiente para que os moradores evacuem a área, no caso de outro tsunami.

Recentemente, eles foram postos à prova por um terremoto de magnitude 7,4, que atingiu a costa da província de Fukushima em 16 de março de 2022, matando pelo menos quatro pessoas e ferindo muitas outras. Felizmente, o tsunami resultante foi insignificante em comparação com aquele de 11 anos atrás.

Esses muros feitos no mar também servirão como uma linha de frente defensiva contra os efeitos das mudanças climáticas. Um relatório recente do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas descobriu que, mesmo na melhor das hipóteses (aquela em que o mundo consegue interromper o aquecimento em 1,5°C), o nível do mar pode subir 0,55 metro em média globalmente até 2100. E isso pode levar a tempestades incapacitantes em muitos países. 

Paradoxalmente, esses muros projetados para proteger as pessoas das consequências do aquecimento global também contribuem para esse mesmo fenômeno. Estimamos as emissões envolvidas na criação dos quebra-mares de concreto do nordeste do Japão em cerca de seis milhões de toneladas de CO₂, levando em consideração seu tamanho e comprimento e usando ferramentas padrão do setor.

Mas, diante desse dilema, como os países podem construir paredes marítimas mais fortes, sem piorar as mudanças climáticas? 

Após pesquisas pós-tsunami de quebra-mares danificados no sul do Sri Lanka (2004) e nonordeste do Japão (2011) com pesquisadores da Universidade Waseda, e com base na pesquisa de concreto de baixo carbono feita pela Universidade de East London, parece que encontramos uma resposta.

CONCRETO DE BAIXO CARBONO

O concreto é o material mais comum para fabricar quebra-mares. E o cimento, o principal aglutinante em uma mistura de concreto, é feito principalmente de clínquer – um resíduo produzido pela queima de calcário e argila em um forno aquecido a 14.500°C. Para criar tanto calor, normalmente se recorre à queima de combustíveis fósseis, emitindo gases de efeito estufa durante o processo.

A fabricação de cimento é responsável por cerca de 7% das emissões anuais de CO₂. Mas sem concreto, muitos dos edifícios e estruturas mais impressionantes do mundo – como a Sydney Opera House, na Austrália, e a Hoover Dam, em Las Vegas – simplesmente não existiriam. Um dos maiores desafios enfrentados pelo setor da construção, portanto, é reduzir a pegada de carbono do concreto, mas mantendo os benefícios de um material de construção barato e durável.

Uma maneira de conseguir isso é substituindo o cimento por resíduos industriais reciclados, como resíduos granulados de siderúrgicas e cinzas pulverizadas de usinas de carvão (basicamente, o resíduo que pode ser raspado do fundo dos fornos).

A misturas de concreto com baixo teor de carbono recém-projetadas em nossas pesquisas utilizam esses dois materiais reciclados. De fato, foi possível utilizar até 60% de resíduos de fornos de aço nas misturas sem que o concreto perdesse sua resistência à compressão, que é fundamental para a sustentação da estrutura. As misturas resultantes tinham uma pegada de carbono 40% menor do que o concreto tradicional.

Nossos projetos também usam fibras de aço semelhantes a grampos que podem ser adicionados à mistura de concreto, eliminando a necessidade de montar grandes grades de malha de aço. Como resultado, os custos e as emissões de construção são menores, e o produto final é tão resistente quanto um quebra-mar tradicional.

TRABALHANDO COM A NATUREZA

Os quebra-mares de concreto podem até mesmo estimular a biodiversidade. Alguns são texturizados de tal forma que imitam os habitats dos recifes, incentivando o assentamento e o crescimento de plantas e animais marinhos em seus sulcos e superfícies salientes.

Com o tempo, até mesmo os quebra-mares mais bem projetados tendem a rachar. Mas, milagrosamente, engenheiros desenvolveram um concreto autorregenerativo, que utiliza microrganismos capazes de produzir calcário de forma autônoma, para reparar essas estruturas naturalmente. A ideia de organismos vivos tecendo e reparando concreto, um material geralmente considerado frio e sem vida, é muito empolgante para nós.

É provável que haja projetos de concretos ainda mais sustentáveis ​​no futuro, pois a impressão 3D nos permite criar padrões mais eficientes, que usam menos material e que produzem menos resíduos.

Usar menos para construir mais. Essa fórmula provavelmente vai preocupar as comunidades costeiras, que vivem com medo de tsunamis. Afinal, os quebra-mares sustentáveis ​​provavelmente serão mais finos, menores e curvos, em vez de retos. No entanto, mesmo assim, essas estruturas são igualmente resistentes e mostram que o mundo pode se adaptar aos efeitos das mudanças climáticas sem piorá-las.


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