Canadá investe em novos e inspiradores programas de cuidados aos idosos

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No Canadá, a pandemia de Covid-19 serviu para ressaltar as falhas existentes no sistema de cuidados de longa duração para idosos. Os canadenses precisaram desenvolver soluções inovadoras socialmente, para ajudar os cidadãos a envelhecer com mais segurança e dignidade.

As novas possibilidades que vêm sendo testadas são diversas, como as moradias comunitárias (cohousing) ou os programas de paramedicina e de cuidados primários domiciliares feitos diretamente nas casas de repouso mantidas com financiamento público.

Como designer de inovação social, estudo desafios complexos, com o objetivo de encontrar as a raízes dos problemas e só depois resolvê-los – em vez de apenas gerenciar os sintomas.

Para entender melhor os desafios do sistema de cuidados da terceira idade no Canadá, entrevistei partes interessadas que estão trabalhando com abordagens sintonizadas com as necessidades de indivíduos em diferentes estágios do envelhecimento. Muitas dessas abordagens são inovadoras, e podem nos inspirar com soluções quanto se trata de redesenhar esse tipo de sistema. 

COHOUSING SÊNIOR

Um dos objetivos estipulados na Estratégia Nacional para Idosos do Instituto Nacional do Envelhecimento do Canadá é ajudar o idoso a permanecer ativo, engajado e a manter sua independência. Mas, na prática, muitos idosos lutam até mesmo para encontrar uma moradia adequada – e, antes de mais nada, uma moradia acessível.

Embora existam lares de idosos, seus custos estão fora do alcance de muitos. Tendo isso em vista, alguns deles começaram a optar pela coabitação.

Louise Bardswich, aposentada, era reitora de uma faculdade. Ela e outras três mulheres uniram seus recursos para construir uma casa compartilhada em Port Perry, Ontário. 

Esta casa foi projetada para permitir que suas moradoras compartilhassem o espaço, construíssem uma comunidade e envelhecessem confortavelmente no local (Crédito: Louise Bardswich/cortesia do autor)

A casa apresenta elementos de arquitetura e design que permitirão que as suas donas envelheçam no lugar, como banheiros acessíveis para cadeiras de rodas, uma cozinha espaçosa e um quarto de hóspedes que pode ser usado por um(a) cuidador(a) ou enfermeiro(a), se for necessário. As coproprietárias também unem seus recursos para cobrir os custos fixos, que Bardswich estima em cerca de CA $ 1.100 (ou US $ 871) por mês.

Embora CA $ 1.100 não seja um valor acessível para todos, ainda é consideravelmente mais barato do que a estadia em um lar de idosos tradicional em Ontário – onde a opção semiprivada de longa duração custaria CA $ 2.280,04 por mês (ou $ 1.806).

No Canadá, morar no esquema de cohousing ainda pode ser difícil devido às leis de zoneamento, mas uma legislação apresentada em 2019, chamada Golden Girls Act – em homenagem a Bardswich e suas coproprietárias -, visa facilitar a criação de cohousing pelos idosos.

PROGRAMAS DE PARAMEDICINA COMUNITÁRIA

Uma parte fundamental do apoio aos idosos, para que continuem vivendo com segurança em suas próprias casas, é garantir que eles tenham acesso aos serviços de que necessitam. Um exemplo inovador são os programas de paramedicina comunitária. Esses programas utilizam as equipes médicas de emergência já existentes e as treinam para fornecer cuidados de saúde primários a pessoas que podem ter dificuldade em sair de casa para consultas médicas. 

JC Gilbert é o vice-chefe encarregado das operações dos Serviços Paramédicos do Condado de Simcoe. Nos cinco anos desde o lançamento de seus programas de paramedicina comunitária, Gilbert afirma que houve um impacto positivo no bem-estar geral dos pacientes e uma redução no número de chamadas de emergência. “As pessoas têm se mostrado capazes de lidar muito melhor com sua doença em casa.”

Atualmente, o Ministério da Saúde de Ontário financia o desenvolvimento de programas de paramedicina comunitária em todas as regiões de Ontário.

CUIDADOS PRIMÁRIOS EM DOMICÍLIO

House Calls é uma prática de cuidados primários de saúde para idosos que vivem em Toronto, liderada por Mark Nowaczynski, da SPRINT Senior Care.

Nowaczynski explica que consultar as pessoas em suas casas dá aos profissionais de saúde a possibilidade de obter uma compreensão mais holística da saúde e do bem-estar de um paciente – o que não é possível durante uma simples visita ao consultório. O nível de cuidado que ele e sua equipe prestam pode evitar internações em hospitais ou asilos.

De acordo com Nowaczynski, o House Calls atende 450 idosos com idade média de 89 anos. “Tornamos possível que nossos pacientes vivam seus últimos anos em casa e morram em casa”, diz ele.

Dr. Nowaczynski estima que em Toronto existem de 100.000 a 150.000 idosos que se beneficiariam de cuidados primários domiciliares. Mas somando os esforços do House Calls e de outros programas, “provavelmente estamos atendendo às necessidades de menos de 2% dessa população. Ou seja, estamos apenas arranhando a superfície do problema, e há uma grande população de idosos que segue recebendo cuidados contínuos inadequados”.

Tornar possível que as pessoas envelheçam em casa é uma estratégia que se provou rentável e que, ao mesmo tempo, reduz a dependência do sistema de saúde. Alguns países até já transferiram uma parcela maior de seu orçamento de saúde para cuidados comunitários e domiciliares. A Dinamarca gasta 36% do seu financiamento na saúde de idosos para cuidados em edifícios designados (como lares de idosos) e todo o restante em cuidados domiciliares e comunitários.

No Canadá, apenas 13% do orçamento na área vai para cuidados domiciliares e comunitários.

A VILA PERFEITA PARA PESSOAS COM ALZHEIMER 

As “vilas para pessoas com demência” são comunidades de cuidado concebidas para proporcionar aos seus residentes liberdade de escolha dentro de um ambiente seguro e de apoio.

A primeira vila desse tipo do mundo foi inaugurada em 2009 na Holanda. O Hogeweyk é uma vila intencionalmente projetada com 23 casas para 152 idosos diagnosticados com algum tipo de demência. A vila tem bar, restaurante, salas de reunião, teatro, mercearia, ruas e jardins para os moradores usarem e desfrutarem. É financiado publicamente e funciona com um orçamento comparável aos dos lares de idosos convencionais.

A Providence Living, em parceria com a Island Health, abrirá o primeiro modelo de assistência à demência do Canadá com financiamento público em Comox, British Columbia. Com o início da construção previsto para esse ano, ela contará com residências menores que apoiam a liberdade de movimento, o acesso à natureza e a conexão com a comunidade.

Candace Chartier, presidente e CEO da Providence Living, explica que esse conceito de vila (ou bairro) não trata apenas do design físico, mas engloba uma mudança no modelo de atendimento em que moradores, funcionários e familiares trabalham juntos para criar um ambiente doméstico no qual os moradores podem prosperar.

Esses exemplos mostram potencial para o futuro dos cuidados aos idosos no Canadá – o desafio é torná-los o novo padrão de atendimento, em vez de uma colcha de retalhos de serviços que resultam em longas listas de espera, aumentam os custos de saúde e criam confusão para idosos e seus cuidadores.

O sistema de cuidados aos idosos do Canadá pode vir a se tornar mais centrado nos seres humanos que ajudam os idosos a obter os cuidados de que precisam. Mas, primeiro, precisamos fazer do cuidado humano e digno para os idosos uma prioridade.


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