Marketplace de moda independente encoraja slow fashion no Brasil

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O cenário pandêmico trouxe à tona um olhar mais sensível sobre o mundo e as condições de vida e trabalho que serão construídas no futuro. Com o isolamento social, o modo de consumo e produção de bens têm revisitado uma série de questionamentos. A autonomia e a liberdade de escolha dos profissionais esbarram nas discussões da economia da identidade e “a moda como uma estética e um espelho de comportamento da sociedade também entra nessa história”, diz Camila Yahn, diretora de conteúdo do (2)Collab, marketplace de moda nacional.

Camila Yahn (Crédito: Divulgação)

A pandemia teve impacto na percepção individual de estilo e autoestima das pessoas, enquanto as roupas sociais e trajes de festa esperam no guarda-roupa. Na rotina de trabalho remoto, o dress code é outro. 

Mariana Mendes, head de TradeMKT, CRM e novos negócios na Icomm Group, acredita que um consumidor consciente faz compras mais criteriosas e tende a priorizar peças duráveis e atemporais. “Esse consumidor não está preocupado em consumir o último lançamento do ‘inverno 21’, mas com atributos ligados a tecido, forma de produção e história da marca, e não tanto com aquela ideia do fast fashion de última tendência, que até então a moda valorizava muito.” 

APOSTANDO EM PRODUÇÃO LOCAL

O (2)Collab, empreendimento recente do Icomm Group, holding por trás dos e-commerces OQvestir e Shop2gheter, é um marketplace para pequenos estilistas autorais e independentes que trabalham apenas com produção local. “Pegamos esses subgrupos que não estavam tão evidentes, como genderless, streetwear e moda sustentável, por exemplo, e criamos uma casinha para eles, é como se tivesse uma rua. No mercado de rua existem as ruas famosas pelo estilo delas, e o consumidor, muitas vezes, não buscava só uma marca. A ideia do marketplace é criar como se fossem essas ruas, esses bairros onde a pessoa encontra itens por semelhança”, conta Mendes. 

Mariana Mendes (Crédito: Divulgação)

Dentro desse ecossistema de produtores, o Icomm Group oferece suporte comercial, marketing, consultoria digital e todo o know how na parte administrativa. As marcas passam por um processo de curadoria que garante o alinhamento com os padrões de produção desacelerada, e tratamento ético para os trabalhadores e artesãos. 

O marketplace trabalha com o conceito de slow fashion (não trabalha com coleções outono/inverno, por exemplo) e preza pela visibilidade dos pequenos produtores. “O artesão que está produzindo em casa cria renda para a família dele. A Nanag é uma marca que emprega todos os parentes do artesão, e ele está ensinando um ofício para família dele, isso é um benefício social muito tangível. Por exemplo, a Volta Atelier manda os kits das bolsas prontos e são mulheres refugiadas que costuram de casa, cada tag tem o nome de quem costurou, então existe um acolhimento”, explica a head de novos negócios do Icomm Group.

(Crédito: Volta Atelier)

RETOMADA DO SETOR

Dados coletados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e estatística (IBGE), apontam que o varejo de vestuários e calçados, que integra o setor de prestação de serviços, sofreu o reflexo imediato das medidas restritivas do coronavírus e levou um tombo de -39,8% em junho de 2020.

(Crédito: Birden Clothing)

Mas, em abril deste ano, o setor liderou o crescimento do varejo brasileiro. Segundo pesquisas da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), o segmento de tecidos e vestuário sinaliza recuperação após a queda de 15% em doze meses, e aumentou 300,7% em comparação ao mesmo mês de 2020.

Com a vacinação e a retomada da economia no horizonte, bem como a expectativa de retorno a certa normalidade, as pessoas não querem mais passar a maior parte do dia de pijama. Para que os estilistas transmitam o lifestyle e a usabilidade das roupas, a direção de arte e fotografia é importante para criar o universo que o consumidor conhece. 

“Tivemos que ser super flexíveis e falar para as marcas adaptarem, o momento que vivemos é de criatividade”

O lançamento do (2)Collab estava previsto para ocorrer entre março e abril de 2020, quando a operação precisou se flexibilizar para abrir os negócios em meio às medidas restritivas. Mendes ressalta que inovar foi o caminho para  encontrar soluções . “Tivemos que ser super flexíveis e falar para as marcas adaptarem, fazer foto em casa. Lembro de uma estilista que mandou as roupas por Sedex para alguns amigos e pediu para eles fotografarem. Eu recebi uma foto que parece uma conversa de WhatsApp, somos nós três e a pessoa de frente para o espelho falando com o estilista. Falei  ‘nossa que lindo, vamos publicar assim’. Essa é a foto que mostra o momento que vivemos, que é de criatividade, se aparecesse uma modelo seria até estranho. Como você fez um shooting com modelo no meio da pandemia?”

(Crédito: Nanag)

Para atender às necessidades das marcas, além de diversificar o padrão das imagens, os gestores optaram por girar coleções passadas e não estipularam uma grade mínima de peças, já que uma única venda faz a diferença para muitos estilistas. Como a produção é limitada, é preciso vender um certo número de roupas antes de começar a produzir a próxima.

MODELO DE NEGÓCIOS

Diferente de e-commerces que adquirem os produtos, o (2)Collab permite que os sellers façam a gestão de sua própria loja e estoque, e tenham contato direto com os consumidores, sem intermediários. A head de novos negócios do Icomm Group afirma que o modelo do marketplace vem se revelando menos custoso, porque o capital de giro necessário é muito menor do que no modelo de estoque consignado. Além de gerenciar e precificar os produtos conforme a própria margem de vendas, as marcas podem ofertar o que tem disponível no (2)Collab e em outros lugares simultaneamente.

Como cada loja gerencia suas entregas, a autonomia de utilizar sua própria embalagem deixa a relação com o comprador mais pessoal. O branding fica por conta da seda personalizada do (2)Collab, que incluem as compras. E é comum que as marcas que integram o marketplace façam shootings colaborativos e até desenvolvam parcerias.

“Não estamos falando de tendências, estamos falando de propósito”

Fomentar uma marca não é apenas vendê-la. Por trabalhar com estilistas independentes e autorais, o (2)Collab se responsabiliza em divulgar suas histórias. Camila Yahn,  diretora de conteúdo do marketplace, ressalta o compromisso. “É o tempo inteiro estar pensando o que precisamos fazer a mais para ajudar. Comprar de uma marca dessas é ajudá-la a sobreviver, a realizar um sonho. Não estamos falando de tendências, estamos falando de propósito.” 

(Crédito: Keka Tenório)

O (2)Collab, que atravessou um início desafiador por ser “um e-commerce novo vendendo marcas desconhecidas”, atualmente já conta com 110 labels no portfólio e foi intitulada a loja oficial de Casa de Criadores, em reconhecimento ao viés criativo e diverso da iniciativa. “O cliente que está conosco não vai ficar chocado se ele vir um produto mais ousado”, diz a fundadora. 

“O que nós desejamos, é que as pessoas tenham, cada vez mais, consciência de que elas têm o poder de movimentar um mercado e de fazer com que ele seja mais justo”

Investir em produção local de baixa escala, com tiragens pequenas, é muito diferente de trabalhar com importações de grandes lotes de peças. Não se tratam de “marcas que vão para bolsa fazer a IPO e gerar um super boom”, esclarece Mendes. “Desejamos é que as pessoas tenham, cada vez mais, consciência de que elas têm o poder de movimentar um mercado e de fazer com que ele seja mais justo, porque através de uma compra existe uma distribuição melhor de renda na economia. É sobre saber onde sua compra é mais relevante.”


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