Na esteira do hype do filme da Barbie, finalmente chegou a hora do Ken

O personagem sempre foi um ícone da moda, mas nunca teve a mesma influência cultural que a Barbie. Até agora

Créditos: Eberhard Grossgasteiger/ Pexels/ Mattel/ Newsmakers/ Yvonne Hemsey/ Getty Images

Elizabeth Segran 6 minutos de leitura

Barbie sempre foi uma fonte de inspiração para meninas com suas tendências fashion. E, este ano, graças ao lançamento do tão aguardado filme live action, seu estilo está em alta, com marcas de moda lançando peças em tons de magenta para embarcar no hype.

Mas, e quanto ao bom e velho Ken?

Crédito: Jaap Buitendijk/ Warner Brothers

Desde que Ken estreou como namorado de Barbie em 1961 – usando apenas sunga vermelha e chinelos combinando –, ele também tem sido um ícone da moda. Desde o começo, a empresa contratou designers para criar seu guarda-roupa, que é tão elegante quanto o da sua namorada.

Crédito: Kevin Winter/ GA/ The Hollywood Reporter/ Getty Images

Apesar disso, historiadores de Barbie dizem que Ken não teve muita influência na moda masculina. Poucos homens se importaram ou sequer notaram suas fabulosas escolhas de roupas – o que é compreensível, já que Barbie sempre foi um brinquedo para meninas.

Mas isso pode estar prestes a mudar. O novo filme de Greta Gerwig, destinado ao público adulto, parece já estar influenciando a moda masculina. O ator Ryan Gosling, que interpreta Ken, junto com seus colegas de elenco, tem aparecido em eventos e estreias vestindo roupas em tons pastel.

Outras celebridades, como Brad Pitt e Seth Rogan, também foram vistos usando ternos verdes e rosa. Além disso, estilistas famosos estão investindo em looks mais ousados e chamativos. É o caso da primeira coleção de moda masculina do cantor e produtor Pharrell Williams para a Louis Vuitton, que é repleta de estampas, lantejoulas e detalhes coloridos.

Crédito: Aurelien Meunier/ Getty Images

E há uma chance de que Ken possa ter um efeito de longo prazo. Quando Barbie e Ken foram lançados, seu foco eram as menininhas. Mas, desde 2015, a Mattel começou a colocar meninos em comerciais e anúncios, iniciando uma discussão mais ampla sobre o quão valioso é para as crianças brincarem com uma variedade de brinquedos, em vez de produtos específicos para cada gênero.

Conforme as tendências culturais mudam, é possível que mais meninos das gerações Z e Alfa brinquem com Ken e desenvolvam um certo gosto por seu estilo, assim como as meninas têm feito com Barbie por décadas.

Crédito: Matt Winkelmeyer/ FilmMagic/ Getty Images

A ORIGEM DE KEN

Quando Ruth Handler inventou Barbie, em 1959, ela era considerada radical para a época. Nesse período, as bonecas-bebês dominavam o mercado, mas Handler queria criar uma que permitisse às meninas imaginar suas vidas como adultas.

Ela encontrou uma boneca alemã altamente sexualizada e a transformou na Barbie, considerada o modelo ideal de uma mulher norte-americana. O sucesso foi imediato.

Crédito: Mattel/ Newsmakers/ Getty Images

A ideia de criar Ken veio das próprias meninas. Elas começaram a escrever para a fabricante de brinquedos, pedindo um namorado para Barbie. “Naquela época, você não podia fazer muitas coisas – como ir a um baile – sem um garoto ao seu lado”, explica Bradley Justice Yarborough, colecionador e especialista em bonecas.

Barbie e Ken sempre acompanharam as tendências da moda. A Mattel contratou estilistas para criar coleções para ambos. Os bonecos Ken sempre foram muito bem-vestidos e tinham vários acessórios, porque era mais divertido para as garotas.

“Eles criaram um guarda-roupa que agradasse às meninas”, conta Yarborough. “Os bonecos Ken tinham que ter todos os pequenos detalhes – acessórios e sapatos – com os quais as meninas adorariam brincar. Era extravagante e diferente do que os pais delas estavam usando na época. Também era um reflexo bastante preciso do que estava acontecendo no design de moda masculina.”

Crédito: Hulton Archive/ Getty Images

Nos anos 1960, Ken se vestia como um astro de cinema: usava smokings para eventos de gala, cardigãs vermelhos para ir à sorveteria e paletós esportivos para uma temporada de férias na Europa. Nos anos 70, sua paleta de cores mudou para tons de marrons e verdes, com muitas estampas.

Em 1978, ele teve uma fase disco, com um paletó azul brilhante combinado com calças justas e óculos de sol laranja. Nos anos 80, quando aulas de ginástica nas academias estavam na moda, a Mattel lançou bonecos Ken sem camisa e com shorts.

Crédito Pinterest

ÍCONE GAY ACIDENTAL

Ao longo da maior parte do século 20, as normas de gênero relacionadas a brinquedos eram muito rígidas. E, como os bonecos de Ken foram cuidadosamente projetados para atender às necessidades das meninas, não influenciaram o senso de moda dos meninos (muito menos dos homens).

No entanto, uma geração de garotos prestou atenção. Jef Beck contou à revista "Esquire" que, em 1970, ele se sentiu imediatamente atraído pelo Ken de sua irmã, curioso com as roupas do boneco.

Mas, quando seus pais descobriram, buscaram atrair sua atenção para figuras masculinas, como o “homem de seis milhões de dólares” e Big Jim. Só quando adulto ele conseguiu começar a colecionar bonecos Ken.

Steve Austin, o "Homem de Seis Milhões de Dólares" (seriado dos anos 1970)

Houve um breve momento, nos anos 90, em que Ken se tornou acidentalmente um ícone gay. As vendas estavam caindo, então a Mattel realizou uma pesquisa com crianças de cinco anos para entender melhor o que elas desejavam. As crianças, influenciadas por videoclipes da MTV, queriam que ele se parecesse com seus ídolos pop favoritos, como George Michael e Prince.

Crédito: Yvonne Hemsey/ Getty Images

O resultado foi um Ken vestindo camisa rosa de malha, colete de couro azul e, é claro, um brinco. Mas o acessório que causou mais controvérsia foi um colar cujo pingente se parecia com um brinquedo sexual chamado “cock ring” – ou anel peniano –, popular na comunidade gay.

Em resposta à polêmica, Lisa McKendell, presidente de marketing da Mattel, deixou bem claro à época: “não estamos no negócio de colocar anéis penianos na mão de garotinhas”.

Segundo a revista britânica “Dazed”, o boneco da coleção Earring Magic (magia dos brincos) se tornou o “Ken mais vendido de todos os tempos”, porque homens gays foram às lojas para comprá-lo de forma irônica.

No entanto, naquela época, quando a crise da AIDS começou a assolar o mundo e a homofobia crescia, a Mattel retirou o modelo do mercado. Assim, os 15 minutos de fama de Ken como influenciador de moda terminaram tão rapidamente quanto começaram.

O FUTURO DE KEN

O personagem interpretado por Ryan Gosling parece incorporar todas as contradições dos 60 anos de história do boneco. Em um trailer lançado recentemente, ele desfila com uma série de trajes chamativos, incluindo um conjunto listrado em tons pastel e um casaco de pele sobre um colete de franjas de couro preto.

No entanto, apesar de todos os seus esforços para se destacar, continua na sombra da Barbie. “Não parece importar o que eu faço. Eu sou sempre o número dois”, canta Gosling.

Porém, desta vez, Ken pode ter a chance de deixar sua marca. A Mattel está procurando ampliar seu público e, no caso dos brinquedos do mundo Barbie, a empresa está fazendo um esforço consciente para ser o mais inclusiva possível.

Agora, meninos são regularmente retratados em anúncios da Barbie. Em 2019, foi lançada uma Barbie de gênero neutro, projetada para ser atraente para meninos e meninas, assim como para crianças que se identificam como não-binárias ou transgênero.

Neste admirável mundo novo, meninos e crianças que se identificam com o gênero masculino terão Ken como modelo de moda, assim como as meninas têm tido Barbie por décadas. E isso pode incentivá-los a serem mais ousados e expressivos na forma de se vestirem, assim como Ryan Gosling e Brad Pitt têm sido em suas recentes aparições públicas.

Foram 62 anos de espera, mas agora Ken pode, finalmente, alcançar a influência cultural que sempre desejou. “Ken sempre esteve ao lado de Barbie”, diz Yarborough. “Acho que agora ele está prestes a ter um grande momento só seu.”


SOBRE A AUTORA

Elizabeth Segran, Ph.D., é colunista na Fast Company. Ela mora em Cambridge, Massachusetts. saiba mais