O melhor de Virgil Abloh: seis trabalhos que representam sua alma artística

Crédito: Fast Company Brasil

Mark Wilson 7 minutos de leitura

Virgil Abloh, designer visionário cujo trabalho transcendeu as fronteiras disciplinares, morreu em Chicago na semana passada, aos 41 anos. Sua morte foi um choque para muitos. Por dois anos, ele lutou contra uma forma rara de câncer, o angiossarcoma cardíaco, e optou por manter a doença em sigilo, enquanto continuava a produzir e a criar em abundância.

Fotos: Pierre Suu/Getty Images, Nike, Ikea, Kay-Paris Fernandes/Getty Images, Louis Vuitton

Abloh era o designer negro mais poderoso no universo da moda de luxo. Desde 2018 ele já era o diretor artístico de moda masculina da Louis Vuitton, mas em julho passado ele assumiu ainda uma nova função na holding de que a empresa faz parte, a LVMH, onde ajudou a moldar as marcas de moda, de bebidas e dos hotéis do conglomerado. Ao mesmo tempo, ele continuou atuando como diretor criativo de sua própria marca de moda, a Off-White, colaborando com marcas como Ikea e Evian.

Virgil Abloh na Paris Fashion Week, em 2021. Crédito: Edward Berthelot/Getty Images

Mas Abloh nunca se sentiu confinado ao papel de designer de moda. Ao longo de suas duas décadas de carreira, ele trabalhou em tudo, desde música até arte e design industrial. Nascido em Rockford, Illinois, Abloh era filho de pais que imigraram de Gana, e cresceu imerso na cena hip-hop de Chicago. Enquanto estudava engenharia civil na University of Wisconsin-Madison e arquitetura no Illinois Institute of Technology, Abloh passava seu tempo livre se aventurando como DJ e escrevendo sobre cultura em blogs.

Aos 22, ele conheceu Kanye West, e os dois iniciaram uma parceria que duraria até a morte de Abloh. Abloh projetou as capas dos álbuns de West e, mais tarde, estagiou junto com West na Fendi, em um esforço para aprender sobre o funcionamento da indústria da moda de luxo. Essas diversas influências criativas inspiraram Abloh a buscar maneiras de se expressar em todos os campos. Em “Figures of Speech”, uma exposição retrospectiva de meio de carreira que ele próprio ajudou a curar em 2019 no Institute of Contemporary Art, em Boston, uma parede foi estampada com uma citação sua que resume sua abordagem do design: “Não há fronteiras entre os meios, as fronteiras são percepções humanas.”

Em última análise, Abloh acreditava que o design era uma linguagem que lhe permitia comunicar ideias complexas para o mundo. Com frequência, ele retrabalhava os mesmos temas. Ele usou aspas para recontextualizar conceitos cotidianos: desenhou uma bolsa de papel Ikea adornada com a palavra “escultura”, por exemplo. Ele deixou claro que um bom design não precisa ser caro, e por isso escolheu criar garrafas de água para a Evian e tênis para a Nike. E, ao longo de sua carreira, ele optou por centrar as experiências dos negros. Uma série de jaquetas da Louis Vuitton foram salpicadas por citações de Martin Luther King Jr. e adornada com um patch que representa o continente africano.

Falei pela última vez com Abloh no verão de 2020, em meio aos protestos Black Lives Matter. Na época, ele enfrentou críticas por expressar consternação com o fato de os manifestantes estarem saqueando empresas. Ele compartilhou comigo seu lado da história e se desculpou por não ter articulado mais claramente seu apoio ao movimento. No final das contas, ele disse que queria que sua arte – em vez de suas palavras – falasse por ele. “Sou um designer e artista apaixonado”, disse-me Abloh. “Não sou versado em falar em público, especialmente sobre tópicos que estão evoluindo rapidamente. Não fui feito para o palco, mas vou projetar um palco que abrigue uma mudança sistêmica.”

Vamos, então, relembrar alguns dos designs mais inovadores de Abloh ao longo de sua carreira de 20 anos. 

A POLÊMICA DOS FLYERS

A partir de 2016, Abloh criou flyers com o logotipo das Nações Unidas para convidar as pessoas para seus shows de DJ. Em 2018, a ONU enviou-lhe uma carta exigindo que ele removesse todas as 135 instâncias do logotipo. Abloh orgulhosamente emoldurou e apresentou essa carta em sua mostra retrospectiva de 2019. A experiência encapsulou a abordagem de Abloh para a criatividade: ele acreditava que toda arte – incluindo algo tão banal como o logotipo da ONU – estava aberta para ser reinterpretada por outros artistas. Ao colocá-lo em um novo contexto, ele poderia ter um novo significado.

Ele explicou isso em uma palestra de 2018 na Harvard Graduate School of Design. “Tenho certeza de que você está tentando se desafiar a inventar algo novo, tentando ser vanguardista”, disse ele. “Basicamente, isso é impossível. … Como designers e artistas, existimos como resultado de muitas iterações anteriores a nós, e estamos caminhando coletivamente na mesma direção.”

OS UNIFORMES PARA UM TIME DE IMIGRANTES

As raízes de Abloh como imigrante ganense e seus laços com a comunidade negra vieram à tona regularmente em seu trabalho, desde seus desfiles de moda para a Louis Vuitton até seu apoio a jovens designers negros. Em 2017, ele voltou sua atenção para um time de futebol baseado em Paris chamado Melting Passes, que era formado em grande parte por imigrantes da África Ocidental que não tinham uma rede de apoio forte na França. Abloh projetou camisetas para o time, estampadas com os logotipos da Off-White e da Nike, e convidou os jogadores para seu desfile de moda.

Crédito: Kay-Paris Fernandes/Getty Images

A COLEÇÃO “NADA DE NOVO”

À medida que Abloh subia na esfera da moda de luxo, ele nem sempre era bem recebido. Em 2017, o designer Raf Simons o criticou diretamente em uma entrevista à GQ, dizendo: “[Virgil Abloh] é um cara doce. Eu gosto muito dele, na verdade. Mas sou inspirado por pessoas que trazem algo que eu acho que não foi visto, que é original. Nem sempre se trata de ser novo-novo, porque quem é novo-novo?”

Com seu jeito de sempre, Abloh escolheu responder a Simons por meio de seu trabalho e intitulou sua próxima coleção Off-White de “Nothing New”, usando uma imagem da Mona Lisa coberta de grafite como o convite para seu show. Com apenas uma imagem, Abloh transmitiu que Simon fundamentalmente entendeu mal toda a sua filosofia de design.

A NIKE STORE EM CHICAGO

Em 2019, uma nova loja da Nike que Abloh ajudou a projetar foi inaugurada em Chicago. A loja teve um significado pessoal para ele, já que quando criança ele passou um tempo no centro de Chicago, visitando as lojas na Michigan Avenue que apresentavam as maiores marcas do mundo, incluindo a loja Niketown. Ele afirmou ao meu colega Mark Wilson que esta era sua “porta de entrada para o mundo”.

Crédito: Nike

A Niketown já havia fechado há muito tempo, mas, no mesmo quarteirão, Abloh ajudou a criar uma nova loja envolvente e experiencial chamada Nikelab Chicago. Cada aspecto do design foi concebido para destacar os esforços de sustentabilidade da Nike. Os assentos, o piso e as paredes, por exemplo, são todos feitos de sapatos velhos triturados que a Nike coletou de clientes. “O conceito é valioso para mim e para a marca”, disse ele. “Nem tudo se trata de uma operação comercial.”

Crédito: Virgil Abloh

MODA PÓS-PANDÊMICA

No ano passado, entrei em contato com Abloh para pedir a ele um palpite sobre como ele imaginava a moda após a pandemia. Apesar de sua agenda agitada e de sua doença, ele foi gentil o suficiente para refletir sobre o tema e me responder. O palpite que ele enviou não teve nada a ver com a pandemia. Em vez disso, ele apresentou duas figuras vestindo camisetas que diziam: “Hoje foi um bom dia para prender os assassinos de Breonna Taylor.” Sua esperança era que os protestos Black Lives Matter continuassem a moldar a indústria da moda, inspirando as pessoas a se vestirem para comunicar suas esperanças para o mundo.

LUZ NA ESCURIDÃO

No verão passado, com o crescimento da pandemia, as marcas de moda tiveram que repensar como lançariam suas últimas coleções. Como diretor artístico de moda masculina da Louis Vuitton, Abloh optou por criar um vídeo em desenho animado. Ele apresentava personagens dançando ao som irresistível do funk. Eles e se escondiam como clandestinos em um caminhão da Louis Vuitton que voava pela França, começando na cidade de Asnières, onde a marca foi fundada, e indo até Paris.


SOBRE O AUTOR

Mark Wilson é redator sênior da Fast Company. Escreve sobre design, tecnologia e cultura há quase 15 anos. saiba mais