Bioeconomia, inovação e startups: estamos esperando o quê?


Clayton Melo 5 minutos de leitura

Chegamos a uma situação em que o futuro da vida humana na Terra está seriamente ameaçado. Estão aí as emergências climáticas cada vez mais severas para nos mostrar a encrenca em que nos metemos. Para fugir do desastre, não tem outro jeito: é preciso rever urgentemente o modelo de desenvolvimento econômico gerado na Revolução Industrial e partir de vez para a economia verde. 

É nesse contexto que a bioeconomia surge como um caminho necessário, possível (embora difícil) e repleto de oportunidades para o Brasil. Diversos países, em graus diferentes, já estão trabalhando para substituir a matéria-prima de origem fóssil por aquelas de origem biológica, como biomassa, biocombustíveis, vento e sol. O objetivo é propiciar uma economia mais sustentável e que assegure qualidade de vida para a nossa e para as próximas gerações.

A bioeconomia contribui para a redução dos gases de feito estufa, diminuição da dependência de recursos naturais finitos e abre novas frentes de negócios e trabalho. E não se limita à questão ambiental, pois também envolve algo que CEOs e empreendedores não se cansam de buscar: inovação.

A bioeconomia não se limita à questão ambiental, pois também envolve algo que CEOs e empreendedores não se cansam de buscar – inovação.

A maior diferença em relação ao modelo industrial do passado é o uso intensivo de ciência e tecnologia, com utilização de conhecimento gerado em áreas como bioenergia, robótica, inteligência artificial, nanotecnologia, biologia sintética, bioinformática e genômica, entre outras. 

Os produtos da bioeconomia abrangem uma vasta gama de setores, da agricultura aos fármacos, passando pela indústria e pela tecnologia da informação. Plásticos biodegradáveis, biopesticidas, medicamentos, cosméticos, fragrâncias, biocombustíveis e softwares para as empresas do setor são apenas alguns dos exemplos.

“Outro aspecto a ser ressaltado é a capacidade de integrar agricultura e indústria, tornando-as parte do mesmo processo no desenvolvimento econômico”, segundo explica a Embrapa em um de seus documentos.

“Em um país megabiodiverso como o Brasil, dono da maior biodiversidade de flora e fauna do planeta – com mais de 100 mil espécies animais e cerca de 45 mil vegetais conhecidas –, é premente investir em um modelo econômico baseado no uso sustentável de recursos naturais”. 

EMPURRÃO NA ÁREA INDUSTRIAL

Só para dar uma ideia do impacto que esse modelo é capaz de provocar, um estudo da Embrapa, em parceria com a Associação Brasileira de Bioinovação (ABBI), projeta que a adoção da bioeconomia em larga escala possa gerar um faturamento industrial adicional de US$ 284 bilhões até 2050.

Esse volume pode ser alcançado se o país avançar em suas políticas de mitigação de emissões de gases de efeito estufa (GEE), reforçar a adoção de tecnologias biorrenováveis e consolidar a biomassa como matriz energética principal nos maiores setores econômicos. Já pensou em quantas startups lideradas por cientistas empreendedores não poderiam dar conta do recado, desde que contem com o apoio e os recursos necessários?  

Outro estudo da ABBI calcula que o setor de biotecnologia industrial – uma das áreas da bioeconomia – possa agregar, nas próximas duas décadas, US$ 53 bilhões por ano à economia brasileira, além de gerar  217 mil empregos qualificados. Para isso, as empresas do setor precisariam investir US$ 132 bilhões nos próximos 20 anos. 

O que esses estudos sugerem? 

estudo da ABBI calcula que o setor de biotecnologia industrial pode agregar, nas próximas duas décadas, US$ 53 bilhões por ano à economia brasileira.

Que o Brasil pode ser protagonista em bioeconomia, desde que a entenda como parte de um projeto de país. O ecossistema de startups – leia-se empreendedores, empresas de venture capital, aceleradoras, incubadoras, investidores-anjo, corporate venture capital, governos e academia – também é vital nessa empreitada, pois o capital privado ajuda a fazer a roda da inovação girar mais rápido, além de contribuir com empregos. 

Embora não haja muitos dados sobre investimentos em startups de bioeconomia, é possível dizer que as movimentações nesse campo ainda são tímidas quando comparadas a outros segmentos, como o de fintechs ou tecnologia digital, por exemplo.  

STARTUPS DE BIOECONOMIA

O lado bom da história é que começam a pipocar projetos voltados a startups relacionadas à bioeconomia. A gestora KPTL, por exemplo, anunciou no ano passado um aporte de R$ 8 milhões na Ages Bioactive, uma startup paulista de suplementos para saúde a partir de bioativos da floresta amazônica, como o urucum e o camu-camu. O aporte faz parte do Fundo Floresta e Clima, que tem como parceiro o Fundo Vale, divisão filantrópica da mineradora.

Outro exemplo vem do BID ao Cubo, programa de aceleração para startups de bioeconomia lançado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o Cubo, o hub de inovação do Itaú. A iniciativa selecionou 15 startups em estágio inicial que se propõem a desenvolver soluções de descarbonização, sistemas agroflorestais ou preservação dos biomas da Amazônia e da caatinga.

Com a bioeconomia, temos a possibilidade real de mudar a rota desse transatlântico chamado Terra

  Da região Norte também começam a surgir bons exemplos, como o programa Inova Amazônia, do Sebrae. A iniciativa quer fomentar negócios focados na conservação ambiental, sustentabilidade e desenvolvimento territorial da Amazônia.

As estimativas de potencial da região para negócios baseados no bioma da floresta são animadoras. Um estudo realizado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), em 2021, calcula um mercado de bioeconomia de cerca de US$ 326 bilhões para 12 setores produtivos, entre os quais saúde e agropecuária.  

Com a bioeconomia, temos a possibilidade real de mudar a rota desse transatlântico chamado Terra, desviando do iceberg que está logo ali na frente. A transição do modelo econômico não pode mais ficar no discurso.

O Brasil tem todas as condições de se posicionar bem nessa nova frente. Para isso, é preciso haver políticas públicas estruturadas, com inteligência e estratégia, além de modernização do setor industrial. E, não menos importante do que essas ações, uma atuação mais ambiciosa do ecossistema de startups na área da bioeconomia.

As oportunidades estão aí, e o planeta agradece.


SOBRE O AUTOR

Cofundador da plataforma A Vida no Centro, Clayton tem MBA em marketing, é especialista em comunidades, conteúdo e curadoria de evento... saiba mais