Falamos sempre em “energia limpa”, mas o que isso significa de verdade?

Às vezes, a "energia limpa" pode ser produzida com cadeias de suprimentos sujas ou resultar em danos ambientais. Devemos continuar usando esse termo?

Créditos: Karl Magnuson/ Unsplash/ Mikkel William/ iStock

Dan Gearino 4 minutos de leitura

Em uma conferência realizada este mês, Jael Holzman, repórter da Axios, fez uma exposição contundente que abordou o fato de muitas fontes de "energia limpa" dependerem de cadeias de suprimentos ou processos que estão longe de ser limpos. 

Grande parte do problema está na mineração de metais usados em painéis solares e baterias de íons de lítio, que podem devastar os locais de onde são extraídos. Já ouvi muitas versões desses argumentos, mas a fala de Holzman me fez perguntar o que realmente significa energia limpa.

Vamos começar com uma definição. Quando digo "energia limpa", refiro-me a fontes de energia que emitem zero carbono ou quase zero carbono desde o âmbito da usina de energia até o momento em que é usada pelo consumidor final. Isso inclui energia eólica, solar, hidrelétrica e geotérmica, entre outras. 

Inclui também a energia nuclear. Inclui a queima de madeira e outras biomassas? Provavelmente não, mas essa é uma pergunta cuja resposta daria uma longa discussão.

Preocupo-me, entretanto, com o fato de que o termo “energia limpa” pode ter significados diferentes para pessoas diferentes, a ponto de não ser mais útil.

Crédito: Unsplash

Para ter uma noção melhor do que realmente significa “energia limpa” e se deveríamos usar essa expressão, entrei em contato com Catie Hausman, professora de políticas públicas da Universidade de Michigan, e Eric Gimon, membro do think tank Energy Innovation.

"A ideia de que deveríamos aposentar [o termo 'energia limpa'] porque nenhuma energia é totalmente limpa é simplesmente ridícula", disse Hausman. Ela defende que é importante levar em conta as preocupações com os danos ambientais causados pela mineração, mas eles são insignificantes em comparação com os danos causados pela extração, refino e queima de combustíveis fósseis.

Gimon também considera “energia limpa” um termo bastante útil, especialmente para falar sobre o assunto com leigos e para estabelecer um contraste entre as fontes de energia sem carbono e a energia gerada a partir de combustíveis fósseis.

o termo “energia limpa” pode ter significados diferentes para pessoas diferentes, a ponto de não ser mais útil.

Ele não se importa em empregar a expressão “energia limpa” em uma conversa, mas acha que o termo é menos útil quando se discutem detalhes de política, como quais tecnologias se qualificam para receber ajuda do governo.

Por exemplo, a queima de hidrogênio para produzir eletricidade não é algo que possa ser facilmente categorizado como sujo ou limpo e requer uma análise mais profunda do processo que está sendo usado.

Gimon usa a expressão abreviada "suficientemente limpo" para explicar por que algumas tecnologias podem ser descritas como limpas, mesmo que não sejam 100% limpas em um ciclo de vida.

Ele acredita que uma pessoa sensata consegue perceber que a geração de energia solar, por exemplo, é muito mais limpa do que a queima de carvão, mesmo com uma contagem completa das emissões do ciclo de vida.

Crédito: Google

Seu argumento principal é que a fixação no lado negativo das tecnologias de energia limpa não é útil no contexto de uma crise climática. "Estamos lutando por nossas vidas", lembra.

A palavra "limpo" pode ser usada para confundir, como na maneira pela qual o setor de gás natural descreve seu produto como "limpo" e no esforço de toda uma geração para promover o "carvão limpo". Mas esse não é um motivo para deixar de usar o termo energia limpa, defende Hausman.

"Se deixássemos de usar o termo 'energia limpa', acho que as pessoas que querem disfarçar encontrariam outra maneira de aproveitar qualquer termo que começássemos a usar", diz a professora. "Portanto, continuarei usando o termo 'limpa' e minhas aulas continuarão a ter a mesma discussão sobre o que queremos dizer quando falamos em 'limpa'".

Crédito: Freepik

Sou simpático à opinião de que o termo “energia limpa” tem algumas deficiências. Consigo entender por que alguém que se dedica principalmente ao tema da mineração ou a questões relacionadas ao lixo nuclear não se sente totalmente à vontade para usar essa expressão. 

Mas não pretendo parar de dizer "energia limpa", pelo menos por enquanto. Enquanto o mundo continuar a obter grande parte de sua energia a partir de combustíveis fósseis, que são prejudiciais em quase todos os pontos de seu ciclo de vida, "energia limpa" é útil como uma generalização, com as devidas ressalvas.

Quais são essas ressalvas? Essa seria uma longa lista, mas vou deixar você com uma das maiores: nenhuma fonte de energia é totalmente limpa.

Este artigo foi publicado originalmente no Inside Climate News e republicado com permissão.


SOBRE O AUTOR

Dan Gearino é jornalista especializado na cobertura do setor de energia. saiba mais