Por que tantos preferem fingir que não estamos em meio a uma crise climática?

Cientistas acharam que, ao fornecer as informações corretas, as pessoas mudariam de comportamento. Mas logo descobriram que isso não aconteceria

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Celeste Young e Roger Jones 4 minutos de leitura

Os desastres climáticos agora dominam os noticiários. Incêndios, inundações, secas e tempestades são cada vez mais frequentes e devastadores. Os danos afetam comunidades e economias.

Os impactos se manifestam de diversas maneiras, de prateleiras vazias em supermercados e regiões inabitáveis após inundações até ecossistemas em colapso e serviços de emergência sobrecarregados.

somos ensinados a evitar coisas perigosas ou dolorosas, mas fazer o que sempre fizemos não é mais seguro.

Inicialmente, os cientistas presumiram que, ao fornecer as informações corretas, as pessoas mudariam seu comportamento. Afinal, queimar combustíveis fósseis tem consequências graves, então, o natural seria eliminar gradualmente seu uso. Mas logo descobriram que isso não aconteceria.

Para muitos, isso desencadeou uma dissonância cognitiva. Grande parte das pessoas sabe da gravidade das mudanças climáticas, mas age como se nada estivesse acontecendo. Isso se assemelha ao comportamento de fumantes, que, mesmo sabendo dos danos à saúde, continuam alimentando o vício. Mas por que é tão fácil entender, mas não agir?

NÃO FAZER NADA É FÁCIL

Isso ocorre devido às narrativas com as quais crescemos. Nossas expectativas são voltadas para o conforto e a estabilidade, o que significa que nem todos desenvolveram as formas de pensar necessárias para lidar com os impactos que estamos enfrentando agora.

Perdas abruptas – como a de uma casa – são quase invariavelmente chocantes e podem criar um sentimento de descrença. Como isso pode acontecer? Quando tudo voltará ao normal? Não acontecerá novamente, certo?

Nossa pesquisa sobre riscos sistêmicos, como adaptação às mudanças climáticas, demonstra que essa desconexão é comum. Por desejarmos uma normalidade estável, achamos difícil realmente acreditar que as mudanças que estamos vendo continuarão.

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Há também a questão de quem se beneficia e quem paga. Sua viagem de férias em família compensa para você pelas memórias e momentos felizes. Já o dano em termos de emissões é compartilhado. O problema é que, muitas vezes, ele tem menos impacto nas pessoas que mais contribuíram, agravando a desigualdade e minando a capacidade de resposta daqueles que estão em maior risco.

Adaptar-se ao clima e trabalhar para reduzir o aquecimento global pode ser um processo desconfortável e, às vezes, doloroso, no qual precisamos abraçar e reconhecer nosso desconforto diante das mudanças que estão ocorrendo no mundo.

Grande parte das pessoas sabe da gravidade das mudanças climáticas, mas age como se nada estivesse acontecendo.

Muitas vezes, somos ensinados a evitar coisas potencialmente perigosas ou dolorosas – especialmente se forem desconhecidas. Mas fazer o que sempre fizemos não é mais seguro.

Outra questão são as limitações da ação individual. Não importa o quão empenhado um indivíduo esteja em reduzir seu próprio impacto climático, faz pouca diferença se os outros não estiverem fazendo o mesmo. A ação precisa ser colaborativa e sustentada e favorecer o bem público, em vez de interesses individuais e ganhos de curto prazo.

Tudo isso faz com que achemos surpreendentemente fácil separar nossas próprias ações diárias – dirigir para o trabalho, viajar nas férias, assistir a filmes e séries – dos objetivos mais amplos de reduzir as emissões a zero o mais rápido possível.

COMO EVITAR A HIPOCRISIA CLIMÁTICA?

Muita gente sabe muito bem dos riscos das mudanças climáticas, mas não aceita a responsabilidade. Essas pessoas podem se sentir confortáveis em não agir, ou se convencer de que não têm recursos ou capacidade para isso. 

Sabemos que tratar as mudanças climáticas como um problema sem solução ou usar táticas de medo desmotiva e pode alimentar a ansiedade, o que mina a ação.

Não importa o quão empenhado alguém esteja em reduzir seu impacto climático, faz pouca diferença se os demais não fizerem o mesmo.

Por isso, o primeiro passo para superar a inação climática é identificar onde podemos agir diretamente, como trocar o carro por uma bicicleta elétrica, investir em painéis solares, participar de projetos locais de reflorestamento ou fazer escolhas de consumo mais conscientes.

Também podemos agir por meio do voto, da educação e da defesa de direitos. Pequenas ações somadas podem fazer a diferença. Acabar com a queima de combustíveis fósseis levará tempo, e nossas escolhas mudarão à medida que fizermos essa transição.

Fazer algo é sempre melhor do que nada. Respostas ativas podem ajudar a reduzir a ansiedade e também evitar a hipocrisia climática. E, embora respostas em grande escala sejam necessárias, a ação e a pressão individuais podem ajudar a acelerar a mudança.

A crise climática não é apenas um problema para cientistas, engenheiros e governos. Precisamos de ações em grande e pequena escala. Os custos estão cada vez maiores e não podemos mais nos dar ao luxo de não agir.

Este artigo foi republicado do The Conversation sob licença Creative Commons. Leia o artigo original.


SOBRE O AUTOR

Celeste Young é pesquisadora de indústrias sustentáveis e cidades habitáveis e Roger Jones é professor-pesquisador, ambos na Victoria ... saiba mais