Design e inclusão: por que os robôs são sempre tão brancos?

Será necessário mais do que plástico colorido para tornar os robôs sociais verdadeiramente inclusivos

Crédito: JJ Ying/ Unsplash

Mark Paterson 5 minutos de leitura

Questões de viés racial e de gênero nos dados e algoritmos usados para treinar grandes modelos de linguagem (LLMs, na sigla em inglês) têm chamado a atenção de pesquisadores e da mídia. Mas estes problemas também podem ser vistos em robôs sociais, cujos corpos físicos são modelados a partir de humanos ou animais.

O objetivo do campo da robótica socialmente assistiva é criar robôs capazes de interagir com grupos cada vez mais diversos de indivíduos. A intenção dos pesquisadores é “criar máquinas que ajudem a melhorar as condições de vida das pessoas”, como destaca uma das pioneiras da área, Maja Matarić.

Robôs estão sendo usados para ajudar pessoas com transtorno do espectro autista, crianças com necessidades especiais e pacientes que precisam de reabilitação física após um derrame. No entanto, eles não refletem a diversidade da sociedade nem interagem de uma forma que considere os aspectos básicos dessa pluralidade.

Como sociólogo que estuda a interação humano-robô, acredito que esse problema só vai piorar. As taxas de diagnóstico de autismo em crianças negras são agora mais altas do que em crianças brancas nos EUA. E muitas delas acabarão interagindo apenas com robôs brancos.

POR QUE OS ROBÔS TENDEM A SER BRANCOS

Dada a diversidade de pessoas a que serão expostos, por que Kaspar, um robô projetado para interagir com crianças autistas, tem uma pele de borracha que lembra a de uma pessoa branca? Por que outros como Nao, Pepper e iCub, que são usados em escolas e museus, são revestidos com plástico branco?

A grande questão é que os robôs já são uma realidade. E a maioria deles não é desenvolvida do zero, é adquirida por laboratórios de engenharia para projetos específicos, adaptada com software personalizado e, às vezes, integrada a outras tecnologias, como mãos ou pele de robô.

Kaspar, robô que interage com crianças autistas (Crédito: Universidade de Hertfordshire)

As equipes de robótica, portanto, ficam limitadas às escolhas de design feitas pelos desenvolvedores originais, como Aldebaran, no caso do Pepper; e o Instituto Italiano de Tecnologia, no caso do iCub.

Essas escolhas costumam seguir uma estética clínica e limpa, com plástico branco, semelhante a outros produtos tecnológicos, como o primeiro iPod. Em um artigo que apresentei na reunião da Associação Americana de Sociologia de 2023, me refiro a isso como “pobreza do imaginário projetado”.

COMO A SOCIEDADE IMAGINA OS ROBÔS

No clássico livro da antropóloga Lucy Suchman sobre interação humano-máquina ("Human-Machine Reconfigurations", ou Reconfiguração Humano-Máquina, em tradução livre), que foi atualizado com capítulos sobre robótica, ela discute o “imaginário cultural” de como os robôs deveriam ser.

Imaginário cultural é tudo aquilo que é compartilhado por representações em textos, imagens e filmes e que coletivamente molda as atitudes e percepções das pessoas. Quando se trata de robôs, ele é derivado da ficção científica.

Este imaginário cultural pode ser contrastado com as preocupações práticas sobre como as equipes de ciência da computação e de engenharia imaginam os corpos dos robôs, o que Neda Atanasoski e Kalindi Vora chamam de “imaginário projetado”.

Esta é uma área bastante contestada em estudos feministas, com obras como “The Robotic Imaginary” (O Imaginário Robótico), de Jennifer Rhee, e “Surrogate Humanity” (Humanidade Substituta), de Atanasoski e Vora, que criticam os pressupostos raciais e de gênero que levam as pessoas a projetar robôs de serviço – destinados a realizar tarefas do dia a dia – como femininos.

O imaginário cultural que define robôs como brancos e, geralmente, femininos remonta à antiguidade clássica, ressurgindo com a explosão de romances e filmes no auge da modernidade industrial.

Desde a introdução da palavra na peça de 1920 “Robôs Universais de Rossum”, de Karel Čapek, até o robô sexualizado Maria no romance de 1925 “Metrópolis”, de Thea von Harbou – que serviu de base para o famoso filme de 1927 de seu marido Fritz Lang –, os robôs na ficção foram rapidamente feminilizados e tornados servis.

CAMINHO PARA A DIVERSIDADE E INCLUSÃO

Mas o que pode ser feito para combater este legado cultural? Afinal, toda interação humano-máquina deve ser projetada com diversidade e inclusão em mente. No entanto, robôs não brancos são raros. E mesmo quando refletem alguma etnia diferente, como é o caso dos robôs japoneses, tendem a seguir o estereótipo de gênero feminino servil.

A solução não é simplesmente revestir as máquinas com plástico marrom ou preto. O problema é mais profundo. O Bina48, modelado a partir da esposa afro-americana de um milionário, Bina Aspen, é notável, mas sua fala e interações são limitadas.

iCub (Crédito: Jiuguang Wang/ Flickr/ CC BY-SA)

Métodos de ciências sociais podem ajudar a produzir um “imaginário projetado” mais inclusivo. Mas uma questão importante é o quanto os corpos das pessoas se comunicam com os outros por meio de gestos e expressões, além da fala, e como isso difere entre as culturas.

Fazer com que a aparência dos robôs reflita a diversidade daqueles que se beneficiam deles é uma coisa, mas, e quanto às diferentes formas de interação?

Além de tornar os robôs mais diversos, cientistas sociais, designers de interação e engenheiros devem trabalhar juntos para produzir mais sensibilidade intercultural em gestos e toques, por exemplo.

Isso poderia tornar a interação humano-robô menos assustadora e estranha, especialmente para pessoas que precisam da assistência de robôs sociais.

Este artigo foi republicado do The Conversation sob licença Creative Commons. Leia o artigo original.


SOBRE O AUTOR

Mark Paterson é professor de sociologia da Universidade de Pittsburgh. saiba mais