Brasil na liderança do W20: economia do cuidado, raça e etnia e governança são prioridades

Créditos: Tavin Dotson/ Zack Walker/ Shubham Dhage/ Unsplash

Dilma Campos 4 minutos de leitura

Após participar das intensas discussões sobre futuro, inovação e criatividade no South by Southwest (SXSW) em Austin, Texas, escrevo de Nova York, logo após participar do encontro do W20, evento paralelo à 68ª Sessão da Commission on the Status of Women (Comissão do Status das Mulheres, ou CSW), o maior encontro das Nações Unidas para promoção da igualdade de gênero e do empoderamento feminino.

Este ano, o Brasil está na presidência do W20 e líderes femininas poderosas estão à frente da delegação brasileira, como Ana Fontes (chair 2024 e head em 2017-2023), Camila Achutti (delegada/ Mulheres e Tecnologia), Adriana Carvalho (head da delegação/ Mulheres Empreendedoras, Políticas Empresariais e Políticas de Cuidado), Maria José Tonelli (delegada/ Mulheres Executivas, Envelhecimento das Mulheres, Saúde Mental e Trabalho) e Kamila Camilo (delegada/ Mulheres e Justiça Climática). São nove delegadas no total.

Se você ainda não ouviu falar sobre o W20, dedique alguns minutos do seu tempo para ler este artigo e compartilhe com outras pessoas que se interessem pelo tema do empoderamento econômico feminino.

O QUE É O W20 (MULHERES)?

É um dos oito grupos independentes de engajamento que recomendam políticas e compromissos às lideranças do G20 (Grupo dos 20), que este ano também é presidido pelo Brasil.

Os demais grupos independentes são: B20 (negócios), C20 (sociedade civil), L20 (trabalho), S20 (ciência), T20 (think tank), Y20 (juventude) e Startup20, criado em 2023. O W20 foi criado em 2015 para promover o empoderamento econômico das mulheres e a equidade de gênero. Desde 2017, o Brasil passou a integrar o grupo.

A delegação brasileira defende cinco pautas temáticas em sua atuação na presidência do W20 em 2024:

- Mulheres Empreendedoras: acesso a financiamento, capital e mercado;

- Mulheres em STEM (ciências, tecnologia, engenharia e matemática);

- Economia do Cuidado;

- Enfrentamento à violência contra as mulheres;

- Justiça Climática.

Desde 2017, o Brasil tem levantado a importância do recorte de raça e etnia e, neste ano em que estamos à frente da presidência do W20, essa é a lente que precisa ser firmada e ficar como legado do Brasil para os próximos anos.

Por quê? Porque, olhando para as cinco pautas temáticas, vemos que em muitas delas as mulheres têm conseguido avanços. Mas, quando olhamos para o recorte de mulheres negras, a evolução está muito aquém do esperado.

Na frente empreendedora, as mulheres negras têm maior dificuldade de acesso a crédito nas instituições financeiras. Na economia do cuidado, as mulheres privilegiadas, em sua maioria brancas, podem contratar outras para assumir seus serviços de cuidado – e mulheres negras são a maioria nesses serviços remunerados.

Crédito: CSW

Olhando para a justiça climática, mulheres periféricas, indígenas, negras e ribeirinhas são as mais impactadas pelas mudanças climáticas – é só pensar em apenas um item de conforto, o acesso a um aparelho de ar-condicionado, que elas não têm.

A abordagem da Economia do Cuidado é outro legado que a presidência brasileira vai trabalhar para deixar como tema fixo no W20. Alavancar a governança e a visibilidade do W20 é a terceira frente de atuação. Criar um banco de melhores práticas que pode ser impulsionado por meio da comunicação é uma das estratégias para isso.

Entre as ricas discussões do encontro do W20 aqui na sede das Nações Unidas, destaco:

- Equidade de gênero nas empresas: o programa Elas Lideram 2030, do Pacto Global/ Rede Brasil tem 1,5 mil empresas comprometidas a investir em mulheres em posição de alta liderança até 2030. Se considerarmos que existem em torno de 50 mil empresas de grande porte no país, ainda há muito trabalho a ser feito em prol da equidade de gênero no meio corporativo. Mesmo as empresas que estão mais adiantadas nessa pauta ainda têm, em sua maioria, mulheres brancas na liderança.

- Acesso a crédito e financiamento: a ausência de histórico financeiro impede a concessão de crédito às mulheres de classes sociais mais baixas. É preciso fomentar o acesso a produtos e serviços bancários, especialmente para empreendedoras.

- Educação: existe uma dimensão da educação que não é técnica, mas socioemocional. As pessoas precisam se sentir no direito de estar naquele espaço, de ter autoconfiança e merecimento para aquilo. Sem isso não há aprendizado. É importante pensar em soluções de educação com interação humana. Cursos online acessam apenas uma parcela da população, a mais abastada.

- Mulheres e tecnologia: a tecnologia é, muitas vezes, criada no Vale do Silício, por um tipo muito específico de pessoa. Essas tecnologias reproduzem estereótipos, que aprofundam a violência. Ter mais diversidade de gênero e de raça na área de tecnologia é uma das saídas para esse problema. A criação de políticas mais severas relacionadas à ética na tecnologia pelos países é outra.

Participo ativamente do trabalho dessas mulheres que estão à frente da delegação brasileira da W20. Por ter esse privilégio, me sinto no dever de compartilhar os principais debates e desafios apresentados.

Essa é uma discussão ampla, com uma pauta abrangente. Portanto, quanto mais empresas, organizações e pessoas da sociedade civil se unirem a esse trabalho, mais rápido avançaremos na pauta.

Finalizo com uma frase que ouvi no encontro:

"Na pauta de equidade de gênero e, particularmente, na de equidade de gênero e raça, é preciso ter consistência e continuidade, senão a inércia do sistema volta a colocar o grupo dominante no poder."


SOBRE A AUTORA

Dilma Campos é CEO e Partner da Nossa Praia e Head de ESG da BPartners.co. Atualmente é conselheira da Universidade São Judas - Grupo ... saiba mais