Como hologramas, deepfakes e AR estão ressuscitando os mortos
À medida que a tecnologia cria réplicas digitais de pessoas falecidas, uma profunda necessidade humana pode ser satisfeita – e uma antiga oportunidade para os golpistas poderia voltar.
Considerando que seu fim não estava muito distante, William Shatner, estrela de Star Trek, recentemente decidiu, aos 90 anos, entrar em um estúdio de Los Angeles e se transformar em um fantasma.
Shatner passou cinco dias gravando um StoryFile, tipo de vídeo interativo criado por uma empresa homônima. Partes da gravação capturadas por câmeras 3D, serão “marcadas” usando o sistema proprietário do StoryFile. O fantasma de Shatner poderá ser transmitido para os membros de sua família, para fãs via internet e, possivelmente, para museus e locais de entretenimento. As pessoas poderão fazer perguntas ao fantasma dele. O sistema de StoryFile irá “tocar” as respostas e criará a ilusão de que William Shatner está vivo, mesmo muito tempo depois de falecer.
Bem-vindo ao novo espiritualismo.
Cem anos atrás, os ricos ociosos da Europa e da América eram fascinados pelo além. Um movimento quase religioso chamado Espiritualismo começou na década de 1830 e se tornou popular durante tempos de grande trauma, como a Guerra Civil dos Estados Unidos. O movimento atingiu seu ápice entre 1918 e o início dos anos 1920, quando as ideias espiritualistas se espalharam pela cultura popular dominante.
Os espiritualistas acreditam na possibilidade de se comunicarem com os mortos por meio de médiuns (pessoas que podem permitir que os mortos falem por meio deles), por meio de sessões, “escrita automática” (uma seleção de letras no estilo Ouija) e conjuração de fantasmas.
Eles acreditam que os mortos são mais evoluídos do que os vivos e aprenderam o conhecimento esotérico na morte. E se voltaram para os médiuns em busca não apenas da comunhão com seus entes queridos falecidos, mas também de informações e orientação.
Quando a Primeira Guerra Mundial estava chegando ao fim, a pandemia de 1918 (da chamada gripe espanhola) estava apenas começando. Esses dois eventos levaram a mania do Espiritualismo a novos níveis. As pessoas estavam sofrendo e queriam respostas, o que criou um mercado para o Espiritualismo. Isso foi explorado por charlatões para enganar as pessoas usando as tecnologias da época, como fotografia e fonógrafos.
Uma sessão básica da década de 1920 envolvia várias pessoas sentadas ao redor de uma mesa em uma sala escura, talvez segurando objetos pertencentes a parentes que morreram recentemente. Um médium tinha a tarefa de persuadir espíritos e fantasmas a fazerem sua presença percebida batendo, levantando ou virando a mesa, ou realmente na forma de uma aparição fantasmagórica.
Alguns médiuns não eram fraudes, mas verdadeiros crentes. Por exemplo, o criador de Sherlock Holmes, Arthur Conan Doyle, acreditava que sua própria esposa, Jean, era uma médium talentosa.
O interesse pelo Espiritualismo levou a fraudes lucrativas, que por sua vez geraram interesse, pois os crédulos viam “evidências” falsas, mas críveis, com seus próprios olhos e ouvidos. A fotografia, a projeção de filmes, a gravação de som e outras tecnologias tinham um poder especial porque eram novas e desconhecidas para o público leigo da época. Uma tecnologia que voltará a nos assombrar neste mesmo artigo foi o uso de gaze revestida com tinta reflexiva ou fosforescente que, quando agitada por um assistente invisível, tornava-se um fantasma convincente.
Os ricos e famosos foram à loucura conjurando os mortos há 100 anos. E agora eles estão de volta.
A ASCENSÃO DOS “HOLOGRAMAS” DE CELEBRIDADES
O Capitão Kirk não será a primeira celebridade a ser clonada digitalmente.
O rapper, magnata do tênis e ex-candidato presidencial Kanye West deu à sua então esposa Kim Kardashian, como presente de aniversário, um “holograma” de seu falecido pai, Robert Kardashian, que morreu em 2003. A simulação cara e elaborada dizia o tipo de coisa que um fantasma diria: que ele cuida de Kim, de seus irmãos e filhos, e que às vezes deixa pistas de que ainda está por perto (ele também disse o tipo de coisa que Kanye West diria, como o grande gênio que é).
A façanha de Kardashian veio anos após a aparição do rapper californiano Tupac Shakur no Coachella, cerca de 15 anos após sua morte. Tupac impressionou o público ao aparecer para um dueto com Snoop Dogg. O fantasma de Tupac foi organizado pelo rapper e produtor Dr. Dre e construído pela empresa de efeitos digitais de Hollywood, a Digital Domain.