O ESG é quem norteia o mercado e a equidade é a palavra de ordem


Adriana Barbosa 4 minutos de leitura

Quando experienciamos olhar de cima para baixo a estrutura de grandes organizações, nos deparamos com números um tanto cruéis no que diz respeito à diversidade e equidade. Nos últimos oito anos as empresas têm feito várias ações afirmativas, adotando programas para estagiários e trainees, buscando parcerias com associações e ONGs, mas os progressos ainda são vistos apenas na porta de entrada das organizações. Quando você observa o todo, percebe o quanto ainda faltam negros no topo, na liderança de grandes companhias. Um levantamento do Instituto Ethos de 2016, com as 500 maiores empresas do país, apontou que as mulheres negras respondiam por apenas 1,6% dos cargos de gerência e 0,4% dos cargos executivos. Esse 0,4% era representado pela até então CEO da Pandora, Rachel Maia. Agora, essa porcentagem zerou.

A diversidade não chega nos cargos intermediários corporativos, quem dirá nos altos postos hierárquicos. E as justificativas para a não ocupação de espaços por profissionais negros baseadas em ‘falta de qualificação’, já não são aceitas.

Enquanto as pautas sobre o antirracismo, diversidade e inclusão estão a todo vapor ao redor do mundo, observamos uma corrida contra o tempo de empresas e instituições. A diversidade não chega nos cargos intermediários corporativos, quem dirá nos altos postos hierárquicos. E as justificativas para a não ocupação de espaços por profissionais negros baseadas em “falta de qualificação”, já não são aceitas. Não basta olhar para o diverso querendo números, black money e visibilidade. É preciso agir e transformar de dentro para fora. Estão todos de olho.

E foi essa inquietude com o universo corporativo que impulsionou a criação do Pacto de Promoção da Equidade Racial. Lançado no último mês, o projeto tem o intuito de transformar as empresas em agentes efetivos no combate à desigualdade racial no país. O pacto foi desenvolvido durante um ano por um grupo de 140 apoiadores, e, além de mim, conta com signatários de diferentes setores, como investidores institucionais, empresários, CEOs, representantes do movimento negro, ONGs, acadêmicos, advogados, matemáticos e pesquisadores.

O mercado cada vez mais se orienta pelos protocolos e métricas de ESG. Investidores e organizações estão atentos à sustentabilidade corporativa e à necessidade de mudanças e inovações dentro de empresas, marcas e modelos de negócio. Não por acaso, a sigla para Environmental, Social e Governance dialoga diretamente com as questões citadas acima. O “S”, de social, engloba essas pautas quentes ligadas à diversidade, inclusão e equidade, mas a preocupação com o meio ambiente, o “E”, e a governança, o “G”, sempre existiram, e a popularização ou exigência de iniciativas nesse sentido se devem à uma demanda cada vez maior do mercado pela satisfação do cliente e retorno financeiro.

O mercado cada vez mais se orienta pelos protocolos e métricas de ESG […] e a popularização ou exigência de iniciativas nesse sentido se devem à uma demanda cada vez maior do mercado pela satisfação do cliente e retorno financeiro. 

É o ESG que tem norteado as companhias, apontando suas responsabilidades para a construção de um mundo melhor, no âmbito  social e ambiental. E a palavra de ordem, para fazer a mudança, de fato, acontecer, é equidade. Adaptar regras para promover justiça. E, para ter equidade em uma organização, é preciso estar compromissado com a diversidade.

Com o Pacto, temos por ambição conseguir, no tempo do crescimento de uma geração, melhorar a educação pública para obter uma representação mais justa dos profissionais negros no mercado de trabalho. O movimento quer trazer a questão para o centro do debate econômico brasileiro propondo a implementação de um Protocolo ESG Racial, que servirá como um guia para companhias interessadas em atender as demandas por mais equidade, incentivando a adoção de ações afirmativas e investimentos sociais, com o propósito de melhorar a educação pública e a formação de profissionais negros no país. A adoção das companhias ao Pacto será voluntária e gratuita, mas para gerar um maior compromisso será adotado um Índice ESG de Equidade Racial (IEER), que vai medir o quão equilibrada a empresa está em termos raciais, levando em conta a composição do quadro por ocupação, os salários médios e a distribuição racial na região.

É um movimento potente e altamente necessário. Unirmos pela equidade racial é urgente. A iniciativa em prol da equidade racial no país é inédita no mundo e já recebeu o apoio do Pacto Global da ONU, que vai adotá-lo como protocolo para combater o racismo no Brasil. A questão racial no Brasil é encarada de maneira muito diferente de outras partes do mundo, por isso que se fez necessário criar um protocolo ESG com esse foco. E é dessa forma, movimentando, que possibilitamos as transformações. No final das contas, nossa ambição maior é entregar um mundo melhor às próximas gerações, compromissado com o antirracismo. Pela minha filha, Clara, e por todas as crianças e jovens negros que devem sonhar alto e ter em quem se inspirar, sabendo que, sim, existe um futuro preto.

Este texto é de responsabilidade de seu autor e não reflete, necessariamente, a opinião da Fast Company Brasil


SOBRE A AUTORA

Adriana Barbosa é fundadora da Feira Preta, evento de cultura e empreendedorismo, e CEO da PretaHub. Foi apontada pelo Fórum Econômico... saiba mais