Não se engane: o “big business” foi quem mais saiu ganhando na COP28

Enquanto representantes dos países discutiam a eliminação dos combustíveis fósseis, do lado de fora as negociações de acordos comerciais corriam soltas

Crédito: Alice Donovan Rouse/ Unsplash

Kristoffer Tigue 3 minutos de leitura

Os líderes mundiais podem ter enfrentado dificuldades para chegar a um acordo na COP28. Mas, do lado de fora das negociações a portas fechadas, a cúpula climática anual das Nações Unidas provou ser uma festa de acordos comerciais lucrativos, incluindo para a indústria de petróleo e gás.

Se, por um lado, muitos delegados e ativistas ficaram frustrados durante a COP, um clima bem diferente foi sentido além dos portões de segurança da ONU. Nas últimas duas semanas, as ruas de Dubai fervilharam de atividade. Empreendedores de baterias e fabricantes de painéis solares montaram quiosques para mostrar seus produtos.

Capitalistas de risco e corretores financeiros percorriam os corredores em busca de seus próximos negócios. Havia desde fabricantes de pesticidas a executivos de mineração, passando por empreendedores imobiliários e startups de tecnologia.

Representantes do grupo JBS, maior fornecedor de carne do mundo, também estiveram por lá, assim como a gigante de fertilizantes Nutrien, a multinacional de alimentos Nestlé e a gigante farmacêutica Bayer.

Ao todo, cerca de 70 mil das 100 mil pessoas registradas compareceram à cúpula climática, que muitos compararam a uma "feira comercial" este ano. "Eu chamo de Expo Clima 2023, e não estou dizendo isso de forma pejorativa", disse Robert Stavins, economista da Universidade Harvard, ao “NY Times” durante a conferência. "É a esta que todos comparecem. As pessoas vão porque outras pessoas vão.”

Estande da OPEC na conferência do clima (Crédito: Mumen Khatib/ AFP/ Getty Images)

Os representantes de negócios superaram em muito os funcionários do governo este ano, relatou a Reuters, dando a alguns defensores do clima uma esperança de avanço das empresas mais amigáveis ao clima.

O dono de uma startup climática que produz revestimentos protetores para painéis solares disse que esperava sair da COP28 com negócios potenciais de US$ 5 milhões.

2.456 lobistas de indústrias relacionadas aos combustíveis fósseis se registraram para participar do evento.

Outro empreendedor, este buscando a fabricação de cimento verde, disse acreditar que o valor de seu negócio dobraria até o final da cúpula, graças ao acesso a autoridades e executivos.

"Ganhamos um alcance dentro desta conferência que estava completamente além das nossas expectativas. Private equity, bancos, desenvolvedores de grandes projetos, empresas de construção, empresas de concreto e cimento", disse à Reuters.

Bill Gates, fundador da Microsoft e grande financiador de iniciativas climáticas, chegou a assinar um acordo preliminar com o país anfitrião da COP28, os Emirados Árabes Unidos, para fazer negócios com sua empresa que desenvolve reatores nucleares avançados.

BUSINESS AS USUAL

Mas muitos defensores estavam cautelosos com a forte presença de negócios em uma conferência que, historicamente, foi séria e um tanto obscura, destinada a governos negociarem os termos do Acordo de Paris.

Os ativistas estavam especialmente preocupados com os 2.456 lobistas de indústrias relacionadas aos combustíveis fósseis que se registraram para participar.

Entre os muitos acordos fechados com sucesso durante a cúpula estavam novos contratos para o desenvolvimento de petróleo e gás, que cientistas do clima e especialistas em energia dizem ameaçar os objetivos climáticos globais.

A empresa estatal de petróleo da Nigéria, por exemplo, concordou em desenvolver um projeto de gás natural liquefeito com a empresa chinesa Wison Heavy Industry, de acordo com informações da Reuters.

Este ano foi também a primeira vez na história da COP que um CEO da ExxonMobil compareceu à cúpula. Na verdade, o presidente da COP28 deste ano, Sultan al-Jaber, é ele mesmo o chefe de uma importante empresa global de petróleo, a Abu Dhabi National Oil Company, estatal dos Emirados Árabes Unidos.

Capitalistas de risco e corretores financeiros percorriam os corredores em busca de seus próximos negócios.

No final de novembro, apenas três dias antes do início da COP28, al-Jaber foi acusado de planejar usar a cúpula climática como uma oportunidade para fechar acordos de petróleo e gás, depois que a BBC News e o Centre for Climate Reporting divulgaram documentos internos mostrando que os Emirados Árabes haviam marcado reuniões para discutir acordos de combustíveis fósseis com pelo menos 15 países durante as negociações.

“Essas alegações são falsas, não verdadeiras, incorretas e imprecisas", disse al-Jaber em resposta à matéria da BBC. "Eu prometo a vocês, nunca vi esses pontos de discussão aos quais eles se referem, nem mesmo usei tais pontos de discussão em minhas conversas".


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