Acordo entre FT e OpenAI aponta futuro incômodo para a mídia e a tecnologia

A falta de transparência nos acordos de licenciamento pode ser uma má notícia para veículos menores

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Chris Stokel-Walker 3 minutos de leitura

Mais um acordo entre uma grande empresa de tecnologia e um veículo de notícias foi concluído recentemente. A OpenAI anunciou ter fechado um acordo com o “Financial Times” para licenciar o conteúdo do jornal para treinar seus grandes modelos de linguagem, como o ChatGPT.

O “FT” é o mais recente veículo a aceitar os termos da OpenAI, que já fechou acordos no Reino Unido, EUA, França, Espanha, Alemanha e outros países. Em um período particularmente difícil para o setor de mídia, esses acordos de licenciamento oferecem pelo menos um pouco de esperança às redações.

“Foi uma boa notícia para o ‘Financial Times’ e talvez sirva de inspiração para outros grandes veículos de notícias interessados em obter uma receita adicional”, afirma Rasmus Kleis Nielsen, diretor do Instituto Reuters para o Estudo do Jornalismo, da Universidade de Oxford.

Embora os detalhes não tenham sido divulgados, o fato de a OpenAI estar disposta a investir em veículos de mídia é positivo. O novo acordo surge em um momento em que as empresas de tecnologia enfrentam escassez de dados confiáveis para treinamento, agora que os desenvolvedores já consumiram a maior parte do conteúdo da internet – e foram impedidos por exigências de acessar o restante.

Pesquisas anteriores sugerem que as empresas de IA podem ficar sem dados de treinamento até 2026, enquanto um estudo liderado pelo falecido pesquisador da Universidade de Cambridge Ross Anderson alerta que, na ausência de dados de treinamento humanos e de alta qualidade, os grandes modelos de linguagem podem entrar em “colapso” – ou seja, serem treinados a partir de seus próprios resultados e começar a apresentar mau funcionamento, da mesma forma que a endogamia afeta os mamíferos.

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O novo acordo também chega em um momento no qual as empresas de IA estão enfrentando uma série de questões legais. Na semana passada, oito jornais pertencentes ao fundo de investimentos Alden Global Capital processaram a OpenAI e a Microsoft por supostamente usarem seu conteúdo.

“Vejo isso como uma tentativa das empresas de tecnologia de aliviar parte dos processos envolvendo direitos autorais que enfrentam”, diz o pesquisador e consultor independente Lukasz Olejnik.

Olejnik está interessado em ver se as informações que fornece aos repórteres do “Financial Times” (ele é uma fonte há mais de uma década) poderiam mudar a percepção do ChatGPT sobre ele próprio e, portanto, o que modelo gera quando solicitado.

Mas falta um dado importante na descrição do próprio “FT sobre o acordo: o valor.

CENTAVOS POR PALAVRA

O fato de os detalhes financeiros terem sido anunciados torna difícil estabelecer um valor de mercado para os inventários dos veículos de mídia. Em julho de 2023, a “Associated Press” foi uma das primeiras a fechar um acordo com os criadores do ChatGPT, mas também não divulgou os termos financeiros na época.

Procurado pela Fast Company, o “Financial Times” não revelou os termos do acordo. Reportagens do “The Information” sugerem que, até janeiro de 2024, a OpenAI oferecia entre US$ 1 milhão e US$ 5 milhões – o que equivaleria a frações ínfimas de centavos por palavra pelo conteúdo.

Se isso parece pouco para você, saiba que não está sozinho. A New York Times Company está processando a OpenAI, sob a alegação de que seu conteúdo jornalístico foi usado para treinar as ferramentas da empresa sem permissão – uma violação aos direitos autorais. Embora o grupo não tenha especificado um valor para resolver o caso, a petição inicial sugere que poderia chegar a bilhões de dólares.

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Mas há uma preocupação mais ampla dentro da indústria de mídia de que, quando grandes veículos renomados fecham acordos com empresas como a OpenAI, sobra pouco espaço – ou dinheiro – para os menores.

O fato de estarem negociando individualmente é uma grande mudança em relação às conversas de um ano atrás, quando os principais veículos estavam supostamente tentando formar uma coalizão para ter mais poder de negociação. As atitudes mudaram devido a preocupações de que tais coalizões pudessem ser vistas por reguladores antitruste como fixação de preços.

“As grandes plataformas estão fazendo acordos com algumas das maiores e mais confiáveis ​​fontes de notícias, inclusive agências”, observa Nic Newman, pesquisador associado do Instituto Reuters. “Esses acordos provavelmente vão agravar as desigualdades que surgem no ecossistema de mídia mais amplo.”


SOBRE O AUTOR

Chris Stokel-Walker é um jornalista britânico com trabalhos publicados regularmente em veículos, como Wired, The Economist e Insider saiba mais