Seu filho dorme mal? O problema pode ser tempo demais no celular

Especialista explica como o uso de redes sociais e de videogames antes de dormir pode até desencadear ansiedade e depressão

Crédito: Amina Filkins/ Pexels

Maida Lynn Chen 5 minutos de leitura

Na volta das férias escolares, os pais enfrentam a inevitável batalha para que as crianças retomem uma rotina saudável na hora de dormir. Na maioria dos casos, isso significa redefinir os limites de uso das telas, especialmente no final do dia. Mas é mais fácil falar do que fazer com que essas regras sejam cumpridas.

Um número cada vez maior de pesquisas tem encontrado fortes relações entre sono, saúde mental e tempo de tela em adolescentes, pré-adolescentes e "tweens" (crianças na faixa dos 10 aos 12 anos). Em meio a uma crise de saúde mental sem precedentes, crianças e adolescentes também estão dormindo pouco.

E é um ciclo vicioso: tanto a falta de sono quanto o aumento da atividade relacionada ao consumo de mídias sociais e videogames antes de dormir podem intensificar ou mesmo desencadear quadros de ansiedade e depressão que exigem ajuda profissional.

Já faz tempo que as pesquisas apontam uma relação clara entre saúde mental e sono: um sono ruim pode levar a uma saúde mental ruim e vice-versa. Pessoas com depressão e ansiedade geralmente têm insônia. A privação contínua de sono piora ainda mais a depressão e a ansiedade que originaram o problema.

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Além disso, a insônia e a má qualidade do sono também podem reduzir os benefícios da terapia e da medicação. Na pior das hipóteses, a privação crônica do sono aumenta o risco de suicídio.

Um estudo descobriu que apenas uma hora a menos de sono durante a semana estava associada a "chances significativamente maiores de os jovens se sentirem sem esperança, pensarem em suicídio, tentarem suicídio e fazerem uso de substâncias nocivas".

E o que os jovens fazem quando estão deitados na cama acordados, frustrados e sem conseguir dormir? Isso mesmo, eles pegam o celular. Estudos realizados com mais de 120 mil jovens de 6 a 18 anos que utilizam qualquer tipo de mídia social apresentaram piora na qualidade e diminuição na quantidade do sono. Isso está acontecendo no mundo todo.

A ATRAÇÃO DAS TELAS E REDES SOCIAIS

Embora as redes sociais tenham alguns benefícios, acredito que as pesquisas deixam claro que há muito mais desvantagens do que vantagens no seu uso. Por um lado, a navegação exige que o usuário esteja acordado e, portanto, substitui o sono.

pesquisas têm encontrado fortes relações entre sono, saúde mental e tempo de tela em adolescentes, pré-adolescentes e "tweens".

Em segundo lugar, a luz emitida pela maioria dos dispositivos portáteis, mesmo com um filtro noturno, um filtro de luz azul ou ambos, é suficiente para diminuir os níveis de melatonina, o principal hormônio que sinaliza o início do sono.

Em terceiro lugar, e talvez o mais problemático, é o conteúdo que os jovens estão consumindo. Absorver imagens em ritmo acelerado como as do TikTok ou de videogames antes de dormir é perturbador. O cérebro e o corpo são altamente estimulados por essas exposições e precisam de tempo para voltar a um estado propício ao sono.

Além disso, pesquisas descobriram uma ligação clara entre o consumo de mídia social e problemas com a imagem corporal em crianças e adolescentes, bem como um quadro geral de saúde mental ruim e de problemas de sono agravados.

A FALTA CRÔNICA DO SONO

Dar alta prioridade ao sono é a base da saúde em geral e da saúde mental. Também é fundamental para manter-se alerta e atento durante as aulas. A recomendação dos especialistas é de que adolescentes durmam de oito a 10 horas por noite. Mas apenas um em cada cinco estudantes do ensino médio chega perto disso.

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Os adolescentes que não dormem o suficiente podem apresentar baixo desempenho acadêmico, falta de habilidades de organização e capacidade limitada de tomar decisões. Os adolescentes não têm os lobos frontais totalmente formados – a parte do cérebro que controla os impulsos e o julgamento.

A falta de sono prejudica ainda mais esses comportamentos. Isso, por sua vez, pode levar a más decisões em relação ao uso de drogas e álcool, a dirigir sob o efeito de álcool, à promiscuidade sexual, a brigas ou ao uso de armas, para citar alguns exemplos. Esses comportamentos podem começar no ensino médio, se não antes.

UM CAMINHO POSSÍVEL

Mas o que pode ser feito para afastar os adolescentes e pré-adolescentes das telas? É fundamental estabelecer metas realistas e, às vezes, é útil começar a se concentrar em apenas uma meta.

Os pais precisam priorizar o sono para toda a família e dar o exemplo de bons hábitos de uso de eletrônicos. Os responsáveis muitas vezes transmitem ideias confusas sobre o uso do tempo de tela, devido aos seus próprios maus hábitos.

adolescentes que não dormem o suficiente podem apresentar baixo desempenho acadêmico, falta de habilidades de organização e capacidade limitada de tomar decisões.

Por fim, os pais precisam reconhecer os sinais de alerta da falta de sono e dos transtornos de humor e ansiedade. Procure ajuda profissional para distúrbios do sono, problemas de saúde mental ou ambos, tendo em mente que encontrar profissionais de saúde mental pode levar tempo.

Quando se trata de mídia digital, a Academia Americana de Pediatria recomenda evitar telas por pelo menos uma hora antes de ir para a cama e não dormir com dispositivos no quarto. Para crianças mais velhas que têm deveres de casa para fazer online, é quase impossível evitar o uso de telas logo antes de dormir. 

Portanto, se uma hora for uma restrição muito grande, comece evitando a utilização dos dispositivos eletrônicos por pelo menos 15 ou 30 minutos antes de dormir. Ou, se alguma mídia for necessária, tente assistir a algo passivo, como televisão, em vez entrar em redes sociais.

Nem tudo precisa ser feito de uma só vez. Mudanças graduais podem fazer uma grande diferença ao longo do tempo.

Este artigo publicado originalmente no The Conversation e reproduzido sob licença Creative Commons. Leia o artigo original .


SOBRE A AUTORA

Maida Lynn Chen é professora de pediatria na Faculdade de Medicina da Universidade de Washington. saiba mais