Como o esquema de trabalho híbrido pode enfraquecer a capacidade de nos relacionar com os colegas

Crédito: Fast Company Brasil

Avigail Dadone 5 minutos de leitura

Perdida no vai-e-vem entre os defensores do “trabalhe de qualquer lugar” e aqueles que insistem na volta ao escritório, o que jaz é uma verdade fundamental sobre o futuro do trabalho. Na minha opinião, a colaboração – seja em casa, no escritório ou em qualquer outro lugar – é indispensável, assim como as chamadas “habilidades sociais”.

Isso permanece verdade mesmo com a intensificação acelerada do digital de 2020 para cá, com o estabelecimento da automação, da inteligência artificial e da robótica. Como ficou claro em uma pesquisa recente da McKinsey, isso significa que, embora a necessidade de habilidades manuais e físicas diminua, a demanda por habilidades sociais e cognitivas superiores aumentará. Essas habilidades serão essenciais, independentemente de onde ou de como a futura força de trabalho começará e terminará seu dia.

A ORIGEM DAS CHAMADAS “SOFT SKILLS”

Dada a sua origem, não deve ser surpresa que as habilidades sociais continuem sendo um pilar para uma colaboração eficaz. No final da década de 1960, quando os militares norte-americanos passaram a treinar soldados para tirar proveito de máquinas, percebeu-se que a proficiência técnica não era o determinante do sucesso. O sucesso e o fracasso se resumiam à qualidade da liderança. Foi essa percepção que levou Paul G. Whitmore a cunhar o conceito de soft skills, para marcar a diferença entre habilidades técnicas e não-técnicas.

A conexão abrangente de todas as habilidades sociais identificadas por Whitmore e pelos pesquisadores que seguiram seus passos se resume à comunicação. Da habilidade de ouvir e de influenciar à capacidade de demostrar empatia e ler a linguagem corporal, essas características comportamentais são imperativas para uma liderança sensata e forte. É uma liderança com essas características que deve ser cultivada, independentemente do ambiente físico de trabalho em que nos encontremos no futuro.

POR QUE AS HABILIDADES SOCIAIS IMPORTAM TANTO

Assim como a proficiência técnica não foi o determinante para o sucesso nas forças armadas dos EUA, a tecnologia hoje não é o que torna uma força de trabalho eficaz ou não, independentemente de onde ela esteja localizada. Boas habilidades sociais (ou, mais simplesmente, habilidades interpessoais) são essenciais para capacitar líderes e equipes a aplicar seus conhecimentos, experiência, compreensão e capacidade de inovar.

a proficiência técnica não é o determinante do sucesso ou fracasso, e sim a qualidade da liderança.

A capacidade de se comunicar e ter um diálogo aberto com a equipe é fundamental para qualquer local de trabalho bem-sucedido, seja presencial, remoto ou híbrido.  Trabalhar no modo remoto não pode ser desculpa para deixar as habilidades de comunicação se atrofiarem.

Cultivar algumas habilidades tem sido um desafio, principalmente nos últimos dois anos de trabalho remoto. Tem sido difícil, por exemplo, confiar que a pessoa do outro lado da tela está prestando atenção no que você tem a dizer. A dificuldade de alcançar até mesmo esse nível inicial de confiança tornou ainda mais desafiadora a construção de uma conexão mais profunda. O ambiente de trabalho remoto também fez toda a comunicação parecer mais transacional e a atenção se tornou uma mercadoria mais valiosa do que nunca.

Em meio a tudo isso, o desafio tem sido manter e até desenvolver novos músculos de comunicação. Cultivar intencionalmente as habilidades de escuta ativa, por exemplo, continua sendo vital para garantir que todas as partes de uma conversa se sintam ouvidas, independentemente de estarem no mesmo espaço físico.

HABILIDADES SOCIAIS E LIDERANÇA

Em 2021, a empresa em que trabalho liderou uma sessão externa de liderança. Fizemos um exercício para determinar o que tornava alguém um grande líder. É claro que surgiram termos como “especialista no assunto”, “eficiente” etc. Notavelmente, no entanto, cerca de 80% das palavras lançadas para descrever grandes líderes estavam no campo comportamental: “motivador”, “inspirador”, “cuidadoso”, “bom ouvinte” e “apaixonado” entraram na lista.

Cultivar a habilidade de escuta ativa é vital para garantir que todas as partes de uma conversa se sintam ouvidas.

Atributos como ter experiência no setor e habilidades técnicas já são esperados nos negócios. Espera-se de antemão que os líderes sejam bons tomadores de decisão e que conheçam sua área de atuação. Mas  o que torna um líder único é a sua capacidade de transmitir essas informações e comandar o time: em outras palavras, conhecer as pessoas.

Ao praticar essas habilidades, somos capazes de exercitar nossos músculos de comunicação e ser mais humanos, mesmo no online. Para garantir que as habilidades críticas de comunicação não sejam perdidas à medida que navegamos em diferentes modos de trabalho, os líderes devem fazer o seguinte:

  • Estruturar reuniões que estimulem a confiança. Dê tempo e espaço para interações pessoais durante as chamadas. Reuniões em pequenos grupos e mesmo individuais podem mimetizar os bate-papos no escritório. Naturalmente, a conversa se tornará menos burocrática e mais humana, levando à abertura e confiança da equipe.
  • Trabalhar a empatia com as equipes de liderança. Quando se está trabalhando remotamente, às vezes não dá para perceber o que está nos planos dos colegas. É preciso se concentrar no treinamento da empatia para garantir que as pessoas possam fazer as perguntas certas, além de trabalhar com a equipe para encontrar soluções. Essas habilidades permitem que os líderes demonstrem que se importam com a opinião de todos e que encorajem o diálogo aberto.
  • Reconhecer que o tempo de convívio pessoal é importante para o vínculo. Isso pode ser um ponto de discordância, mas encontrar uma maneira flexível de estimular a convivência no regime presencial é fundamental. A organização de eventos especiais ou reuniões mensais de liderança podem ajudar a preencher essa lacuna social.

De acordo com especialistas, é improvável que um retorno completo aconteça. Assim, as organizações devem se adaptar ao “novo normal”. Independentemente disso, será preciso continuar aprendendo a interagir virtualmente com novos colegas. Descobrir como trabalhar remotamente enquanto as habilidades sociais são mantidas –  como a comunicação aberta, a escuta ativa, a empatia e a confiança – é essencial para o sucesso de líderes e negócios.


SOBRE A AUTORA

Avigail Dadone é diretora de recursos humanos da Diligent, uma empresa SaaS que atua nas áreas de governança, gerenciamento de riscos ... saiba mais