Modelo híbrido: o que os profissionais esperam de seus gestores

Crédito: Fast Company Brasil

Fast Company Brasil 7 minutos de leitura

Às vezes é preciso uma grande mudança para ensinar grandes lições. Na minha experiência, o tipo de mudança capaz de criar uma transformação duradoura costuma ser inesperada e irrevogável. Quando a COVID-19 colocou os funcionários em home office, passamos por uma mudança inédita. As organizações foram forçadas a se adaptar rapidamente e por um período indeterminado. Grande parte dessa responsabilidade recaiu sobre os ombros dos gerentes.

Agora que já estamos lidando há mais de um ano com essa mudança forçada, tivemos tempo para nos adaptar e para avaliar e ajustar o modelo tradicional de trabalho. Neste novo modelo que se anuncia, duas coisas são claras como cristal: a flexibilidade a que já nos acostumamos veio para ficar, e o papel dos gerentes tornou-se mais crucial do que nunca. Tomada em conjunto, essa nova era de trabalho também requer uma nova forma de chefia – em que o microgerenciamento ficou ultrapassado e a gestão passou a funcionar com base na confiança.

A CONFIANÇA COMEÇA NA ESCUTA

Quando desenvolvemos nosso regime híbrido flexível na Microsoft, ouvimos nossos funcionários e aprendemos sobre o que eles mais desejam e precisam — e sobre o que é importante para a satisfação geral no trabalho. O que apareceu no topo da lista? Sentir que se pode contar com a confiança dos superiores.

Os gerentes sempre foram importantes, mas em tempos de incerteza seu papel ganha destaque. São as palavras, ações e decisões de um gerente que vão dar o tom. Elas são cruciais para criar um ambiente de colaboração e produtividade, que empodera os funcionários com a flexibilidade, a autonomia e a confiança que definem o modelo híbrido de trabalho. 

Nossa pesquisa externa, feita com mais de 30 mil pessoas em 31 países, nos mostrou que 41% dos funcionários estão cogitando mudar de empregador ainda neste ano, e que 46% deles estão propensos a mudar porque agora trabalham remotamente. Os critérios que costumavam importar para eles permanecerem em um emprego evoluíram: a colaboração da equipe continua sendo relevante, mas a autonomia e a confiança tornaram-se igualmente importantes. Pesquisas posteriores demonstraram ainda que o microgerenciamento é uma das três principais razões que levam os funcionários a pedir as contas. Conforme as equipes se adaptam à maior flexibilidade no trabalho, evitar o microgerenciamento desnecessário será vital para que uma empresa mantenha seus melhores funcionários. 

Apesar de o último ano ter sido o mais caótico e desafiador de todos, 9 em cada 10 dos funcionários da Microsoft afirmam que confiam na competência de seus superiores imediatos – um aumento de 3% em relação aos anos anteriores – e o número mais alto de todos os tempos na empresa. Quando olhamos mais atentamente para esses dados, percebemos que grande parte desse aumento se deu porque os gerentes investiram tempo em construir essa flexibilidade, treinaram os seus funcionários para saberem o que eles devem priorizar, além de realmente terem demonstrado preocupação com as necessidades específicas de cada funcionário. 

Nosso novo desafio será sustentar (e até mesmo melhorar) esses números, enquanto continuamos incorporando o trabalho híbrido. Não será fácil. Um estudo recente da Gartner descobriu que apenas 44% dos funcionários estão confiantes na habilidade de sua chefia de liderar de forma segura depois da pandemia. Uma coisa é dobrar o cuidado com os funcionários enquanto estávamos bem no olho do furacão de uma crise, mas como manter em alta o ânimo, a cultura da empresa e a confiança da equipe quando estamos próximos de completar dois anos de mudanças e incertezas?

CRIANDO UMA CULTURA DE CONFIANÇA

À medida em que os funcionários optam por trabalhar de outros lugares e abraçam jornadas mais flexíveis, os gerentes enfrentam a tarefa de também abraçar a flexibilidade, e de repensar a maneira como as equipes funcionam. Se não pensarem assim, terão de encarar uma realidade inevitável: perderão seus melhores profissionais para empresas que o façam. Portanto, é só isso que estamos pedindo aos nossos gerentes, que intensifiquem a cultura da confiança e da capacitação. A abordagem que estamos adotando ultimamente é a de aprender com tudo o que está acontecendo, porque ainda não temos todas as respostas. Mas, ao compartilharmos publicamente o que estamos testando, esperamos poder aprender uns com os outros, para embarcarmos juntos na próxima era do trabalho. 

1.Inspirar, treinar, cuidar

Há cerca de três anos, implementamos um quadro de expectativas para nossa gerência, a fim de alcançar bons resultados por meio da capacitação e da responsabilidade. Nele, a orientação é “Inspirar, treinar, cuidar”. Eu não consigo dimensionar a importância de termos apostado nessa tríade durante um ano tão difícil, especialmente no que diz respeito aos gestores estimularem o bem-estar e o autocuidado, treinarem os funcionários na definição de prioridades e, provavelmente o mais importante, cuidarem das pessoas. Abraçar essas três metas é a chave para evitar o microgerenciamento em um ambiente de trabalho flexível.

2. Conversas individuais

Pedimos aos gerentes que tenham conversas com cada um dos profissionais, a fim de discutir como eles gostariam de trabalhar nesse novo modelo híbrido. Como era esperado, quando perguntados sobre suas principais razões para querer ir ao escritório e as principais razões para preferir trabalhar de casa, respostas como “conviver em equipe” e “evitar os deslocamentos diários” foram, respectivamente, as respostas mais frequentes.   

3. Acordos em equipe

Decidir como gostaríamos de trabalhar em equipe ajuda a diminuir a atmosfera de incerteza. Pedimos a cada equipe da Microsoft que criasse uma lista de consensos que definissem como eles gostariam de trabalhar juntos em um modelo híbrido, e assim, eles ajudaram a reduzir o microgerenciamento — já que todos já sabem o que está sendo esperado por todos. Esse modelo incentiva as equipes a se alinharem em cinco áreas: disponibilidade, estilo de comunicação, reuniões, colaboração e informações (onde salvar arquivos, por exemplo). Pedimos aos gerentes que, por meio desses acordos, ofereçam o máximo de flexibilidade possível. Por exemplo, um gerente pode estabelecer que não há expectativas de que todos estarão “sempre conectados” durante um dia de trabalho típico das nove às cinco, e que a cada membro da equipe será confiado que ele atinja suas metas e objetivos de uma forma que equilibre a flexibilidade com o que a equipe precisa. Outro exemplo são os acordos de equipe que estabelecem horários regulares para reuniões, dias sem reunião ou dias da semana específicos para conversas presenciais. 

É importante reconhecer que quando esses acordos estiverem sendo elaborados, os gerentes devem também equilibrar as preferências dos profissionais com as necessidades dos negócios. Ainda que não tenhamos todas as respostas e ainda que o cenário esteja sujeito a mudanças, acreditamos que discussões abertas serão essenciais para ajudar tanto os gerentes quanto os seus funcionários a encontrarem um meio-termo.

 4. Comunidades de Excelência em Gerenciamento

O trabalho híbrido exigirá que muitos gerentes desenvolvam uma nova habilidade. E, como qualquer nova habilidade, aprender com outras pessoas que estão passando pela mesma transição pode ser extremamente útil. Na Microsoft, promovemos essa conexão por meio do que chamamos de “Comunidades de Excelência em Gerenciamento”. É um lugar onde os gerentes se reúnem para sessões de 90 minutos facilitadas por colegas e com foco em um tópico específico, como “criar uma cultura de confiança” ou “melhorar o bem-estar da equipe”. Em cada sessão, os gerentes discutem abertamente e aprendem uns com os outros. Também temos um podcast chamado Managers 1:1 (Gerentes 1: 1), em que os gerentes podem ouvir de outros gerentes sobre seus sucessos, fracassos, alegrias e desafios. 

No ano passado, também colocamos grande ênfase na atualização de nossos programas de aprendizagem e de desenvolvimento de gestores. Os novos cursos para gerentes incluem soluções para desafios tais como “treinar membros da equipe pessoalmente e virtualmente”, “conduzir conversas difíceis”, “tomar decisões em tempos incertos” e “desenvolver acordos por equipe”. Até agora, vimos esses treinamentos valerem a pena. Os gerentes que concluíram mais de 50% de nosso plano de aprendizado receberam pontuações mais altas em todas as perguntas da pesquisa anual com funcionários, reforçando o quão importantes são essas experiências de aprendizado e desenvolvimento.

CAMINHANDO PARA O FUTURO DO TRABALHO

Não há dúvida de que percorremos (e ainda estamos percorrendo) um caminho difícil. À medida em que avançamos em direção ao nosso novo e melhor futuro, são os gerentes que precisam comandar o itinerário rumo àquilo que o trabalho flexível realmente significa. E nesse itinerário, o microgerenciamento não tem vez.


SOBRE O(A) AUTOR(A)

Fast Company é a marca líder mundial em mídia de negócios, com foco editorial em inovação, tecnologia, liderança, ideias para mudar o ... saiba mais