Ser proativo demais sem estabelecer limites pode prejudicar sua performance no trabalho

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Uma das principais coisas que aprendemos na escola foi a importância de ajudar os outros. Seja mostrando aos novos alunos onde fica a cantina ou sendo solícito com professores, o conceito é claro: ajudar os outros é uma virtude.

Mas assim que entramos no mundo corporativo, logo aprendemos que ser prestativo no trabalho – especialmente agora que muitos de nós trabalhamos em “escritórios virtuais” – atrapalha nossa produtividade e criatividade.

Funcionários antigos com bastante conhecimento da empresa costumam ser uma fonte de informação e de aprovação para seus colegas. Eles são frequentemente interrompidos enquanto estão fazendo seu próprio trabalho para ajudar outros funcionários mais novos e precisam carregar esta demanda a mais em suas rotinas. Aqueles que possuem menos experiência podem, inclusive, ficar inertes até que recebam a aprovação de outros.

Essa “sobrecarga de colaboração” pode ser prejudicial não apenas para nosso desempenho no trabalho, mas também para o nosso bem-estar. É essencial que as empresas treinem seus funcionários para que o instinto de ser prestativo não cause mais mal do que bem.

O TRABALHO COLABORATIVO CONSOME A MAIOR PARTE DO NOSSO TEMPO

O “trabalho colaborativo” — ou seja, o tempo que passamos ajudando outras pessoas no trabalho (seja por e-mail, mensagens de texto, ligações ou chamadas de vídeo) — aumentou drasticamente na última década. O e-mail e outras atividades de colaboração interna representam 42% do tempo médio de trabalho, de acordo com a McKinsey, resultando em menos tempo para um trabalho individual mais profundo e focado.

Esse problema se agravou quando, durante a pandemia, funcionários abandonaram seus postos no escritório e começaram a trabalhar de casa. Não podendo mais nos inclinar para fazer uma pergunta rápida aos nossos colegas, tivemos que recorrer a ferramentas de comunicação de trabalho remoto que consomem mais tempo do nosso dia. De acordo com uma pesquisa da Microsoft, a duração das chamadas de voz e de vídeo dobraram na pandemia e o envio de mensagens de texto chegou a aumentar 65% para algumas equipes.

A Uber rastreou o uso de ferramentas de colaboração durante este período e viu um aumento de 40% nas reuniões e de 45% no número médio de participantes, além de três vezes mais reuniões no Zoom e mensagens no Slack. Isso resultou em uma redução de 30% no tempo de foco (duas ou mais horas ininterruptas trabalhando em uma tarefa ou projeto específico), o que demonstrou ter uma forte correlação com os níveis de produtividade dos funcionários.

À medida que passamos mais tempo com trabalho colaborativo, as tarefas que exigem concentração demoram mais para serem concluídas. Isso faz com que nossas rotinas de trabalho se estendam à noite e até mesmo aos fins de semana, o que aumenta nosso risco de burnout. E são os mais prestativos de nós que correm o maior risco.

UM PROBLEMA EM GRANDE PARTE CAUSADO POR NÓS MESMO

É fácil culpar o Zoom e o Slack por nossa falta de foco. De fato, a Lucid entrevistou 1.000 trabalhadores de período integral e descobriu que 37% das pessoas que trabalham remotamente pelo menos três dias por semana disseram que as constantes notificações das ferramentas de colaboração tiveram um impacto negativo em sua criatividade.

Mas há mais por trás disso: estudos mostram que de 20 a 35% da colaboração vem de apenas 3 a 5% dos funcionários. Esses trabalhadores têm uma reputação de serem eficientes e prestativos e são continuamente requisitados para ajudar os outros ou prestar qualquer assistência. Como resultado, seu desempenho no trabalho pode cair.

Infelizmente, muito desse trabalho em equipe passa despercebido e não é visto pela administração. Isso ocorre, sobretudo, nos modelos de trabalho híbridos e remotos, onde reuniões individuais ocorrem online e, portanto, não são visíveis para os superiores. 

Para agravar o problema, toda essa colaboração vem com o custo adicional: estudos mostraram que, quando somos interrompidos – seja por 30 segundos para ler um e-mail ou por uma reunião de uma hora – pode levar até 20 minutos para retomarmos a concentração.

Some a isso as distrações do dia a dia do trabalho remoto – como cônjuges, filhos ou animais de estimação que exigem atenção, alguém batendo na sua porta, ou uma pilha de louça que precisa ser lavada – e o limite entre vida profissional e pessoal é desfeito.

PREVENINDO A SOBRECARGA DA COLABORAÇÃO

A colaboração excessiva pode levar a uma sobrecarga, o que deixa as pessoas se sentindo desvalorizadas, irritadas e constantemente exaustas – e, por vezes, leva a busca por um novo emprego (o que definitivamente não ajuda).

Os melhores profissionais sabem que dizer “sim” a pedidos de colaboração significa dizer “não” a outras coisas. Compreender as áreas em que você está mais bem preparado para realmente agregar valor — em vez de concordar em participar de mais uma reunião porque quer ser prestativo — ajudará você a gerenciar seu tempo com mais eficiência.

Aqui estão algumas estratégias para proteger sua produtividade e criatividade:

  • Reservar um tempo na agenda: reserve parte de sua agenda para se dedicar ao seu trabalho, de forma que fique claro para seus colegas que este é um tempo exclusivamente seu, e evite responder mensagens não urgentes durante este período.
  • Definição de pauta: em toda reunião, certifique-se de que a pauta esteja clara e diga aos participantes que você precisa encerrar em determinado horário. (Se você não estiver conduzindo a reunião, pergunte à pessoa responsável sobre o tema para ajudar todos a manter o foco.)
  • Reuniões periódicas: Agende reuniões periodicamente com seus colegas de projeto. Incentive todos a guardarem suas dúvidas ou problemas para estes momentos, assim você reduz as interrupções no dia a dia.
  • Limites: Seja claro com seus superiores e colegas de equipe sobre quando seu horário de trabalho começa e termina — e cumpra-os o máximo possível para proteger sua vida pessoal.

Se você não se sente à vontade para fazer essas coisas – ou para dizer “não” a atividades colaborativas – isso indica um problema que precisa ser abordado. Se você está sentindo os efeitos da sobrecarga, outros colegas seus provavelmente também estão. Converse com seu superior – ou mesmo com o RH – sobre investir em ferramentas de compartilhamento de conhecimento. Reserve um tempo para focar no seu trabalho. Para alguns, pode ser difícil reconhecer que parar para pensar também é trabalhar. Mas é exatamente assim que surgem as melhores ideias.

Chris Savage, cofundador e CEO da plataforma de hospedagem de vídeo Wistia, discutiu isso em seu post de leitura obrigatória, “Thinking is Work. Give Yourself Time to Do It.” (Em português, “Pensar é trabalhar. Reserve um tempo para isso.”)

Nos primeiros dias da empresa, Savage via sua agenda vazia com maus olhos. “Eu sonhava com o dia em que minha agenda estaria lotada de coisas importantes para fazer.”

No entanto, ele agora credita muito do crescimento da empresa a isso. Com todo esse tempo livre, ele conta, “descobrimos como desenvolver um produto, encontrar clientes, nos posicionar no mercado, construir cultura e fazer tudo o que você precisa fazer para criar e gerir uma empresa”.

“É difícil enxergar o pensamento como trabalho, porque muito dele não resulta em mudanças e progresso concretos”, diz Savage, cuja empresa possui meio milhão de clientes. “No entanto, as ideias mais importantes e influentes surgem quando temos tempo para pensar.”


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