Os “exageros” por trás da IA (segundo o dono de uma empresa de IA)

Não é preciso ser engenheiro de dados para avaliar os benefícios da inteligência artificial. Basta saber fazer as perguntas certas

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Eric Sydell 4 minutos de leitura

Nenhuma tecnologia despertou tanto discurso exagerado quanto a inteligência artificial. Mas por quê?

A IA é uma inovação altamente disruptiva e transformadora, um avanço raro que ocorre uma vez em várias gerações e que promete revolucionar os negócios e a sociedade como um todo. Ao mesmo tempo, o capitalismo é mestre em transformar tudo em mercadoria; não para melhorar a vida das pessoas, mas visando o lucro.

Mesmo antes do boom da inteligência artificial, já era comum vender produtos como uma solução definitiva para todos os nossos problemas. Na década de 1870, por exemplo, o médico homeopata Sylvester Andral Kilmer criou o que ele chamava de “Swamp Root Kidney Cure”, um suposto remédio milagroso feito a partir de raízes que prometia curar de tudo – até devolver o vigor a pessoas debilitadas.

A verdade é que discursos enganosos sempre vão existir; eles fazem parte do comportamento humano. Seja por uma insatisfação constante, por um excesso de confiança ou pela cultura do exagero, é da nossa natureza criar e acreditar em afirmações exageradas e fantasiosas de maneira quase incontrolável.

Isso é tão comum que tendemos a aceitá-las como parte da realidade. E se, por um lado, somos suscetíveis a alegações falsas, o mundo dos negócios é uma fonte constante de promessas vazias.

FLOREANDO A VERDADE

Como pesquisadores (sim, cientistas estudam isso) definem esse comportamento? Em vez de uma mentira intencional, são afirmações que, tecnicamente, não se baseiam na realidade. Pode ser até que, por acaso, sejam verdadeiras, mas o emissor não tem como saber disso.

É a tentativa de pintar um cenário favorável, sem se importar se o conteúdo é verdadeiro ou falso.

É aí que entra o marketing corporativo – em especial, o discurso em torno da IA. O objetivo da maioria das campanhas de marketing é aumentar as vendas e melhorar a imagem da empresa. Não se trata de fornecer informações precisas e detalhadas sobre o funcionamento real do produto ou os resultados que ele pode alcançar.

Embora existam regulamentações de veracidade na publicidade, na prática, é muito mais fácil fazer declarações parcialmente verdadeiras – mesmo que elas não reflitam o que a empresa realmente pode oferecer. O marketing busca destacar os melhores resultados possíveis de um produto, não os mais comuns.

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Dada a complexidade técnica da IA, dificilmente um anúncio conseguirá dar informações suficientes para que o cliente avalie corretamente a solução. Infelizmente, mesmo apresentações mais detalhadas muitas vezes falham em explicar como uma ferramenta de inteligência artificial realmente funciona, especialmente considerando que até cientistas de dados nem sempre compreendem inteiramente como certos resultados são obtidos.

A boa notícia é que você não precisa ser um engenheiro de dados para avaliar uma IA ou outras ferramentas complexas. Basta saber fazer as perguntas certas. Abaixo, listamos algumas declarações comuns de marketing e as perguntas que você pode fazer:

“Nossa IA faz diagnósticos mais rápidos e precisos que os próprios médicos.”

- Como a velocidade e a precisão foram medidas? Que critérios foram usados para garantir a precisão dos diagnósticos?

- Ela funciona para todos os pacientes e condições ou apenas para alguns grupos específicos? A precisão varia para condições comuns e raras? Há diferenças na precisão em função do gênero ou etnia do paciente?

- Qual foi o tamanho da amostra utilizada? Como garantiram que os resultados são realmente confiáveis?

“Ajudamos a contratar pessoas 20% mais rápido do que os métodos tradicionais.”

- Quais são os métodos “tradicionais” específicos aos quais vocês estão se comparando?

- Qual é o custo para alcançar essa velocidade?

- A técnica resulta em algum tipo de viés em relação a determinados grupos, por exemplo, negros e mulheres?

- Os candidatos contratados estão realmente desempenhando o trabalho tão bem ou melhor que no processo anterior?

“Nosso chatbot de IA resolve os problemas dos clientes de forma mais rápida e fácil.”

- Mais rápido em comparação a quê? Qual é o tempo médio?

- Mais fácil para quem, exatamente? Para a empresa ou para o cliente?

- Quais problemas o chatbot tem dificuldade de resolver? Isso causa frustração nos clientes?

Se o fornecedor não tiver respostas claras para essas perguntas, provavelmente a afirmação não se baseia em dados concretos.

A solução para combater alegações falsas e discursos marketeiros, seja em relação à IA ou no dia a dia, é pensar como um cientista. O método científico é uma das melhores maneiras de atestar o que é verdade – e pode ser usado para separar o que é apenas retórica do que é, de fato, real.

Em 1996, o renomado cientista Carl Sagan escreveu sobre a importância de pensar como um cientista e avaliar criticamente afirmações para combater a desinformação. Trinta anos depois, esse conselho é mais importante do que nunca.


SOBRE O AUTOR

Eric Sydell é cofundador e CEO da Vero AI. saiba mais