O que aconteceu com a empresa que resolveu banir reuniões?

Crédito: Fast Company Brasil

Stephanie Vozza 5 minutos de leitura

A maioria das pessoas considera as reuniões um mal necessário para a realização do trabalho. Enquanto algumas são claramente uma perda de tempo, outras podem dar oportunidades para as equipes colaborarem e tomarem decisões. Mas o que aconteceria se as reuniões fossem completamente banidas?

É isso que a empresa de mídia online TheSoul Publishing fez quando adotou uma política de “reunião zero”. A razão? Oitenta por cento da força de trabalho global dos 2,1 mil colaboradores da empresa trabalham remotamente e as reuniões presenciais, ao vivo, não eram uma forma eficaz de comunicação.

“Uma vez que um modelo de interação é estabelecido, pode-se construir conexões profissionais profundas e confiança dentro da equipe”

“Gosto de comparar reuniões a grandes conferências”, diz o COO Arthur Mamedov. “Falar na frente de um grupo de pessoas torna-se facilmente uma troca de informações ineficiente. Algumas pessoas podem se distrair no momento. Para outros, as informações podem não ser relevantes. E durante as sessões de perguntas e respostas, o palestrante pode esquecer detalhes importantes. As reuniões podem se transformar em uma atividade passiva que desperdiça o tempo dos participantes.”

Isso é especialmente verdadeiro quando os profissionais estão espalhados por fusos horários. “Você não pode esperar se conectar com as pessoas de uma maneira contínua”, explica Mamedov. “Sempre será fora do horário comercial para um grupo de participantes.”

Se comunicar com um grupo é mais eficiente postando informações online. Deslocar o processo de troca de dados para formatos escritos permite que as pessoas se atualizem em seu próprio ritmo.

COMO BANIR REUNIÕES

Embora pareça simples, implantar uma política de proibição de reuniões exige visão e planejamento, pois a forma como os funcionários se comunicam faz parte da cultura corporativa.

“A cultura corporativa deve estar focada na criação de valor”, orienta o COO. “É fazer coisas ao invés de falar sobre elas. Novamente, isso parece simples, mas é necessário abordar muitos pontos de contato culturais. Os sistemas precisam ser muito claros para apoiar o fluxo de trabalho e princípios de comunicação. Uma vez que um modelo de interação é estabelecido, pode-se construir conexões profissionais profundas e confiança dentro da equipe.”

Por exemplo, a TheSoul Publishing baniu e-mails internos. “Livrar-se de reuniões exige transparência radical, que geralmente é a mais incômoda para as pessoas”, relata ele. “E-mails são o oposto de transparência. As trocas são visíveis apenas dentro do grupo. Qualquer pessoa que precise acessar informações deve ser capaz de obtê-las para garantir que todos estejam sincronizados.”

“Livrar-se de reuniões exige transparência radical, que geralmente é a mais incômoda para as pessoas”

Em vez disso, as informações devem ser compartilhadas em uma plataforma acessível para todos os colaboradores, sendo atualizada instantaneamente quando alguém faz uma postagem. “Não se pode esperar que as pessoas tenham um desempenho em equipe quando não estão na mesma página, mesmo no alto nível para onde nossa organização está se deslocando”, comenta Mamedov.

Dispor de uma equipe que possa trabalhar sob esse modelo começa com o recrutamento. “É preciso contratar pessoas ágeis que provavelmente adotarão essas abordagens e abandonarão a velha maneira de fazer as coisas”, diz o COO. “Quanto mais fora do padrão for sua cultura, mais profundo e demorado será o seu processo de integração.”

Os novos funcionários são ensinados a se comunicar uns com os outros. “Há uma curva de aprendizado e tempo que os novos funcionários digerem antes de mergulhar no processo de trabalho”, ressalta Arthur. “Do contrário, seria desconcertante se a pessoa basicamente não fosse treinada para operar dessa forma. A primeira coisa que faria é provavelmente tentar marcar uma reunião com alguém.”

A EXCEÇÃO

Embora sejam proibidas, Mamedov admite que acontecem reuniões às vezes, mas apenas em casos especiais. “Temos um manual de duas páginas sobre como marcar uma reunião, mas para que isso aconteça é necessário seguir um protocolo muito rígido”, revela.

Primeiro, o funcionário tenta resolver o problema sem uma reunião, usando o software de gerenciamento de projetos da empresa. Se chegar a um ponto em que não possam avançar em uma discussão assíncrona, o funcionário que deseja uma reunião precisa criar um plano e uma agenda para a conversa com antecedência. A solicitação de reunião deve ser feita com pelo menos 24 horas de antecedência.

“Quanto mais fora do padrão for sua cultura, mais profundo e demorado será o seu processo de integração”

“Normalmente, tentamos limitar todas as reuniões a apenas duas pessoas e por 30 minutos no máximo”, explica o COO. Após a reunião, o colaborador que ligou registra o resultado no local onde o trabalho do projeto está armazenado, para que todos possam se beneficiar.

“Se a reunião foi no Zoom, a gravação também é publicada”, diz Mamedov. “Com um processo de preparação tão robusto, as pessoas costumam se esforçar mais para resolver as coisas sem uma reunião. E esse é o objetivo final.”

BENEFÍCIOS DE BANIR REUNIÕES

O objetivo das políticas de “reunião zero” é garantir que todos permaneçam produtivos, utilizem o tempo focado no trabalho e minimizem distrações. O COO da TheSoul Publishing  conta que recebe feedbacks de novos funcionários dizendo que o modelo sem reunião é incomum e um pouco estressante no início, mas assim que entram nele, se sentem liberados porque sua produtividade dispara.

“O trabalho deve trazer alegria, estamos apenas tentando projetar o processo […] para que as pessoas possam se concentrar naquilo que são melhores”

“Para a maioria das funções dentro da empresa, falar e discutir elementos não faz parte da descrição principal de suas funções. Estabelecemos um ambiente onde as pessoas podem gerar valor em um tempo de resposta mais rápido”, afirma. 

Embora pareça um pouco robótico, Mamedov acredita que o elemento humano se mantém. “As pessoas tendem a socializar quando são colegas de trabalho e estabelecem um relacionamento profissional”, diz ele. “Mesmo que tudo o que você está fazendo esteja encadeado, você ainda gosta de conversar com colegas.”

A TheSoul Publishing configurou plataformas sociais, como clubes do livro, onde os colegas de trabalho podem se conectar. De acordo com o COO, o foco é remover as barreiras do trabalho que podem ser frustrantes.

“O trabalho deve trazer alegria, estamos apenas tentando projetar o processo de uma forma que seja alegre e eficiente, para que as pessoas possam se concentrar naquilo que são melhores”, ele conta. “Uma vez que eles começam a fazer mais daquilo em que são bons, eles se tornam mais felizes em geral.”


SOBRE A AUTORA

Stephanie Vozza escreve sobre produtividade e carreira na Fast Company. saiba mais