5 perguntas para Ricardo Silvestre, CEO da Black Influence

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Redação Fast Company Brasil 5 minutos de leitura

Fundador da principal agência brasileira focada em criadores de conteúdo preto e comunicação antirracista, Ricardo Silvestre tem sempre muito a dizer. O CEO da Black Influence ajudou a construir o mercado de conteúdo e influência no Brasil e, agora, ajuda a publicidade a repensar seus modelos de representação.

Silvestre foi o profissional mais jovem da história a ser indicado ao Prêmio Caboré em 2022, além de ter sido escolhido como uma das 100 pessoas afrodescendentes mais influentes do mundo pelo Most Influential People of African Descent (MIPAD), organização parceira da ONU e da African Union.

A Black Influence tem influenciadores que são vozes potentes e conseguem levantar pautas importantes para o público, como Ellen Valias e Manu Mendes, além de ter participado da estratégia de conteúdo para lançar a série Manhãs de Setembro, da Liniker. 

Nesta entrevista à Fast Company Brasil, Silvestre fala sobre o futuro dos creators e o presente do ESG na mídia.

FC Brasil – Pesquisa da YouPix com a Nielsen mostrou que 84,4% das marcas brasileiras têm intenção de ampliar o investimento em marketing de influência este ano. Qual é o próximo passo para o mercado de creators no Brasil?

Ricardo Silvestre – O marketing de influência no Brasil é enorme, cheio de possibilidades e destaque no mundo todo. Mas ainda é um mercado muito novo. Acredito que os próximos passos sejam a coleta de mais dados sobre isso, para que a gente entenda, em dimensão nacional, as características desse mercado.

se as lideranças seguem alheias à diversidade, não existem de fato mudanças estruturais na máquina do mercado publicitário.

Os dados globais ajudam, mas não espelham a nossa realidade. Mais entendidos das especificidades da influência brasileira, os criadores e as marcas poderão compreender melhor o valor dessa produção de conteúdo. Acredito que isso deva, inclusive, contribuir com a profissionalização desse trabalho.

FC Brasil – Quais são as suas recomendações para conseguir captar a atenção (e a intenção) da audiência em um mundo de excesso de conteúdo?

Ricardo Silvestre – Cada projeto que a Black Influence abraça é meio que um começo do zero. Digo isso porque cada cliente tem uma estratégia exclusiva, pensada especificamente para as suas necessidades.

Minha recomendação é essa: fugir das fórmulas prontas, pensar estratégias personalizadas para os objetivos de cada projeto. Por mais que as trends atraiam atenção, é o diálogo genuíno com públicos específicos e até menores que melhor se converte em consumidores e espectadores.

FC Brasil – A ideia de criar a Black Influence veio depois de um burnout. Como transformou esse episódio na construção de uma das maiores agências de influenciadores do país?

Ricardo Silvestre – A Black nasceu não só do meu processo de burnout, mas também do entendimento de que o mercado publicitário tradicional se importava pouco em se comunicar com pessoas não-brancas, demografia que comporta mais da metade da população brasileira.

as marcas patrocinadoras [do campeonato espanhol] podem se engajar com a luta antirracista por meio de ações efetivas.

A partir disso, começou meu processo de cura – emocional e profissional. Entendi que, por ter essa sensibilidade que os grandes líderes do mercado não tinham, eu poderia ser agente da mudança que julgava necessária na publicidade. E aqui estamos, quatro anos e mais de 500 projetos depois.

FC Brasil – Na semana que vem acontece o Cannes Lions, que elegeu como pauta o tema ESG [sigla em inglês para meio ambiente, social e governança]. Na sua opinião, quanto o mercado publicitário está de fato comprometido com esses pilares?

Ricardo Silvestre – Sendo muito sincero, acho que falta intencionalidade. No Brasil, já enxergo grandes agências se aparelhando para trabalhar questões da diversidade, receber influenciadores e creators negros e promover a comunicação com a população negra. Mas quem chefia essas equipes ainda são pessoas não negras.

Algo parecido ocorre também em relação às pautas LGBTQIAP+, por exemplo. Isso diz muito respeito ao G da questão, a governança. Porque, se as lideranças seguem alheias à diversidade, não existem de fato mudanças estruturais na máquina do mercado publicitário.

FC Brasil – Os ataques contra o jogador brasileiro Vini Jr na Espanha aumentaram a pressão do público para uma atitude dos patrocinadores, que correram para se posicionar. Em vez de apenas reagir, quais medidas as marcas devem adotar para se tornarem antirracistas?

Ricardo Silvestre – O problema do racismo no futebol europeu é constante. Fica muito claro que mudanças efetivas na cultura de torcida do futebol espanhol precisam ser feitas.

O marketing de influência no Brasil é enorme, cheio de possibilidades e destaque no mundo todo, mas ainda é muito novo.

Para além das notas de repúdio, é importante que as marcas patrocinadoras pressionem a La Liga – inclusive mediante risco de finalização de contrato – para que promova essas mudanças, com punições mais severas, agilidade no enquadramento dos agressores e apoio total à vítima.

Além disso, as marcas devem exigir engajamento real da La Liga [entidade que organiza o campeonato espanhol] nessa pauta, promovendo a conscientização dos jogadores, da torcida e de toda a comunidade futebolística, talvez até associada a ações e entidades sociais locais.

Não é inteligente para Santander e Puma, por exemplo, seguirem associadas à La Liga se ela continuar conivente com o racismo que ocorre nos estádios, já que isso demonstra um descompasso enorme com o que hoje entendemos como valor de gestão.

Essas medidas passam pela governança das próprias marcas patrocinadoras, que podem se engajar interna e externamen- te com a luta antirracista, por meio de ações efetivas. Ações que demonstrem apoio a vítimas do racismo e promovam a conscientização dos consumidores para que a discriminação racional na Europa, que é um problema tão latente, mas pouco discutido localmente, entre na pauta pública.


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