ESG: se alguém perde, ninguém ganha

É preciso que a cadeia de geração de valor integre todos os públicos da organização para que a equação da prosperidade seja efetiva

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Fernando Brancaccio 4 minutos de leitura

A sigla ESG vem sendo cada dia mais comentada. Muitas empresas correm para se adequar aos critérios estipulados neste novo padrão, com foco em se atualizar e atender às novas demandas do mercado. Embora o tema esteja em alta, ainda cabe uma série de reflexões sobre como aplicá-lo para, efetivamente, transformar a organização pelos efeitos do ESG.

Mas o tópico que merece maior atenção das empresas também soa muitas vezes familiar ou amplamente discutido, sendo necessário um aprofundamento maior: afinal, o “S”, de social, não é sobre colaboradores. Ou melhor, não é só sobre colaboradores.

Conselhos de administração diversos têm se dedicado ao tema governança, o que faz com que o “G” esteja bem coberto. Da mesma forma, o “E” também ganhou sua amplitude, talvez tendo sido o conceito que mais rapidamente “pegou”. Já o “S”, sobre o qual restam muitas dúvidas, carece de maior atenção.

O social presente em ESG, antes de mais nada, engloba todas as pessoas que estão, de forma direta ou indireta, envolvidas com a organização. Nesse contexto, os colaboradores são apenas uma fatia do público interno. Apenas a ponta do iceberg.

Isso porque há muito mais o que considerar do que apenas o time. Existem clientes, parceiros, fornecedores, stakeholders e a comunidade do entorno da organização.

O social precisa ultrapassar a barreira da “diversidade e inclusão”, que muitas vezes marca a discussão interna. O debate precisa integrar também o bem-estar físico e mental e o quanto ele impacta a organização; o quanto a empresa se relaciona com seu público externo e o respeita; em termos de segurança do produto e de dados; em termos de comunicação institucional; em relação a riscos reputacionais. 

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Quando ampliamos o foco externo, é necessário considerar outros componentes estratégicos. Avaliamos a qualidade do produto, as práticas de vendas, o marketing, a produção, a segurança de dados e o jurídico, por exemplo.

Quando consideramos a comunidade vizinha, precisamos pensar sobre quais impactos sociais (além dos ambientais) causamos onde estamos inseridos como empresa e como pessoas.

Também é necessário considerar  como esses impactos, positivos ou não, podem ser mensurados. Porque percepção, maturidade e materialidade ESG é exatamente sobre o impacto gerado, que precisa ser obrigatoriamente mensurado, gerando, ao final, um saldo positivo.

A prática do ESG não é uma iniciativa gratuita, nem financeira nem intencionalmente. É preciso ter claros os objetivos que se pretende alcançar e o por quê.

Quando falamos em benefícios gerados por uma empresa, é interessante ponderar que, se alguém perde, ninguém ganha. Isso significa que, em termos de pessoas, é preciso que a cadeia de geração de valor integre todos os públicos da organização para que a equação da prosperidade seja efetiva. E isso só é possível integrando todas as áreas que, hoje, olham de forma individual para cada letra do ESG.

A miopia do mercado de que o social se restringe apenas ao interno da empresa causa uma séria deturpação do conceito de ESG. É preciso integrar conselho, CEO, COO, CIO, o CMO, o Legal Officer (jurídico), o CHRO (recursos humanos), enfim, todos os executivos e departamentos estratégicos interligados.

Existe uma interligação importante entre o RH, responsável pelo employee experience (EX), que cuida das pessoas (todas elas, não só os colaboradores!), com o customer experience (CX), que olha para o cliente, com a sustentabilidade, que se direciona para o meio externo, e com a governança, que foca em transparência, compliance e diversidade.

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Todas as áreas precisam trabalhar juntas para que a interpretação mude. Quando se olha para a saúde mental e o bem-estar, se olha também para como o produto é ofertado, a entrega ao cliente e os impactos gerados.

Quando um indicador melhora em função das estratégias conectadas a um cenário maior, o impacto é percebido por todos os envolvidos e a relação entre as pessoas tende a ser melhor para a sociedade como um todo. 

De forma adicional, o risco institucional é reduzido. Quando a organização olha efetivamentte para as pessoas, há um “stop loss”: a melhor forma de ganhar dinheiro é parar de perder. São beneficiados os índices de absenteísmo, engajamento e produtividade, para dar apenas alguns exemplos.

A prática do ESG não é uma iniciativa gratuita, nem financeira nem intencionalmente. É preciso ter claros os objetivos que se pretende alcançar e o por quê.

Mais do que isso, é preciso entender o que de fato compõe cada letra da sigla, para que praticá-la não seja apenas cumprir tabela. O círculo virtuoso do ESG precisa comprovar benefícios reais para todos, não apenas para a empresa e seus colaboradores.


SOBRE O AUTOR

Fernando Brancaccio é sócio-fundador da Fairjob, especializada em mensuração e análise de índices de bem-estar dos trabalhadores no am... saiba mais