Provocação criativa: quando olhamos para 2024, o que não estamos vendo?

No nível de aceleração em que vivemos hoje, dois anos valem por um

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Erlana Castro 4 minutos de leitura

Nesta época do ano, todo mundo fica focado no ano que vem. Estratégia, orçamento, estrutura, desdobramento das metas, pipelines, talentos, desafios e oportunidades. Quem trabalha com criatividade sabe: quando estão todos obsessivamente olhando para um mesmo lado, estão todos – ao mesmo tempo – cegos para os outros lados possíveis.

Suba sua visão em um helicóptero: e se o ano fiscal, ou período de 12 meses, não fosse mais um bom marcador universal para os ciclos de negócios? Como isso mudaria sua estratégia? Seu orçamento? Suas metas? Suas férias?

De uns tempos para cá, adotei o estilo de pensar por ciclos de dois anos. Fica fácil de entender, pois estamos vivenciando isso: 2020 e 2021 foram um ano só para a maioria de nós. O inesperado e imperativo ciclo da Covid-19, marcado por morte, reinvenção e superação.

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Durante esse ciclo, entramos em contato com muitas dimensões e aspectos importantes de nossa vida individual e coletiva. Lembramos de muita coisa. Limites, fragilidade, caos. Também vivenciamos a superação de tudo isso.

Já os anos de 22 e 23 formaram o ciclo de retomada, profundamente marcado por desinformação, conflito, ódio, guerras violentas e pelo despreparo e improviso no enfrentamento ao clima extremo. A esperança da retomada entrou rapidamente em suspensão e deixou um sabor mais para o amargo fechando o período.

Fiz uma rápida enquete com 125 colegas para saber como terminavam este ano e metade se disse exausto/a. Eu empatizo. Cerca de um terço, porém, se disse acelerado/a para 2024. Empatizo também. Por fim, há 12% da amostra que declara terminar 2023 na paz e na tranquilidade.

Estamos todos focados em 12 meses e todos, ao mesmo tempo, cegos para os novos ciclos dos negócios.

Ainda assim, talvez todo mundo sinta uma aceleração acima do normal no ar. Um frisson diferente. Uma semana parece um mês, de tanta coisa que acontece. Por outro lado, voa que você nem vê passar. Nesse nível de aceleração em que vivemos, realmente, dois anos valem por um.

De fato, o nível de complexidade dos problemas que temos para resolver deu um salto. Já de saída, se antes pensávamos segmentos de clientes, agora precisamos pensar todos os stakeholders do negócio, em perspectiva.

Precisamos pensar de modo sistêmico. Reaprender a ponderar o privado e o coletivo. O propósito e o lucro. Investimento e resultado, impacto e performance. Para virar todas essas chaves, dois anos valem por um.

DOIS ANOS VALEM POR UM

Do ponto de vista de liderança, vamos precisar que mais talentos diversos ocupem altas posições no ambiente de negócios e participem das decisões estratégicas e criativas. Precisaremos de tempo para o reskilling geral dos times, para evoluir na gestão, na governança, na equidade e na justiça social.

Tempo para dar um reset na cultura das empresas e, principalmente, para aprendermos a fazer tudo isso colaborando, e não competindo. Dois anos valem por um.

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Do ponto de vista dos desafios climáticos que temos pela frente, igualmente vamos precisar de tempo para mudar a matriz energética e limpar toda a operação. Para rever a pegada de todos os produtos, para descarbonizar o ecossistema de parceiros, viabilizar a circularidade, desenvolver novas tecnologias. Reimaginar os processos de produção do zero e redesenhar tudo da porta para dentro e para fora da empresa. Dois anos não é nada!

Do ponto de vista financeiro, há toda uma mudança de cenário, também de visão, escopo e estratégia: investimentos ESG não podem mais ficar de fora. É a hora também do VC (venture capital) e do CVC (corporate venture capital). Afinal, todo ambiente empresarial brasileiro precisa preparar o setup para rodar no novo, gigante e acelerado “Global Green Business”, onde o Brasil tem a sua última chance de não envelhecer pobre. Dois anos valem por um.

REBRANDING BRAZIL

O último ponto que trago para a mesa, e que eu sinceramente acho que a maioria de nós ainda não se ligou, é a COP30, na Amazônia, marcada para outubro de 2025.

Já parou para pensar que Belém será a capital do mundo por duas semanas? Que a nossa identidade nacional está sendo atualizada, assim como nosso posicionamento no âmbito econômico global?

o nível de complexidade dos problemas que temos para resolver deu um salto. Agora precisamos pensar todos os stakeholders do negócio.

Com muito trabalho, mentes brilhantes e sorte, a COP30 lançará nosso “rebranding Brazil”. Como sua empresa e como você, profissional, gostariam de participar desse momento? Detalhe: não basta grana e não vale greenwashing.

Agora olhe novamente para seu plano de 2024.

Tem orçamento para 2025 nele? Tem os talentos necessários? Tem os parceiros certos? Tem o saber embarcado? Tá com combustível para rodar um ano em dois? Fazer seu turnaround? Dar-se esse tempo?

Quando as pessoas me perguntam “professora, onde vamos errar?”, minha resposta, sem hesitação, é sempre a mesma: vamos errar no timing. Estamos todos focados em 12 meses e todos, ao mesmo tempo, cegos para os novos ciclos dos negócios.

Voltando à provocação inicial: quando olhamos para 2024, o que não estamos vendo?

Não estamos vendo 2025.


SOBRE A AUTORA

Erlana Castro é especialista em estratégia criativa, pesquisadora independente, professora da FDC e coautora do Radar da Antifragilida... saiba mais