O que está causando a avalanche de demissões na indústria de games

Aumentos nos custos de desenvolvimento de jogos e nas taxas de juros contribuem para os cortes.

Créditos: Charindra Salgado/ Maxim Abramov/ Unsplash

Chris Morris 3 minutos de leitura

Nos primeiros dois meses do ano, empresas de games anunciaram planos de demitir mais de oito mil trabalhadores. Esta é uma grande mudança em relação ao crescimento explosivo que a indústria viu durante e imediatamente após a pandemia – e algo que, sem dúvida, gera certa perplexidade.

A Electronic Arts é a mais recente desenvolvedora a anunciar cortes na folha de pagamento, com planos para reduzir sua força de trabalho em 5%, ou cerca de 670 pessoas. A notícia veio logo após o surpreendente anúncio da Sony Interactive Entertainment de cortar 900 empregos em sua unidade de jogos.

Como é de se esperar, os motivos por trás das demissões variam de empresa para empresa. Em alguns casos, é uma questão de expansão excessiva. A holding sueca Embracer Group se tornou um exemplo emblemático da onda de fusões e aquisições, adicionando mais de 100 empresas ao seu portfólio desde 2017.

Hoje, o grupo está vendendo ativos e demitindo funcionários após o fim de uma parceria estratégica de US$ 2 bilhões com o Fundo de Investimento Público da Arábia Saudita. A empresa dispensou quase 1,4 mil pessoas desde junho do ano passado e cancelou mais de duas dezenas de títulos.

A Gearbox, uma das principais desenvolvedoras da Embracer, é amplamente considerada como estando à venda. Além disso, a holding anunciou planos para vender a Saber Interactive, que está desenvolvendo um remake de Star Wars: Knights of the Old Republic, por até US$ 500 milhões para um grupo de investidores privados.

Crédito: Saber Interactive

Outras empresas estão simplesmente pagando pelos próprios erros. A demissão de 1,8 mil funcionários da Unity Software em janeiro ocorreu após o então CEO John Riccitiello anunciar um novo modelo de preços que causou revolta entre os desenvolvedores. A empresa voltou atrás, mas com a confiança abalada, foi forçada a se reestruturar.

No entanto, outro problema está assolando o setor: o rápido aumento nos custos de desenvolvimento de jogos. Antes da pandemia, um título AAA (games com os maiores orçamentos e níveis de promoção) geralmente tinha um orçamento de US$ 50 milhões a US$ 150 milhões. À medida que as tecnologias se tornaram mais avançadas e os jogadores passaram a esperar experiências mais cinematográficas, os custos dispararam.

Um relatório do ano passado da Autoridade de Concorrência e Mercados (CMA, na sigla em inglês) indica que os orçamentos de desenvolvimento de jogos AAA hoje chegam a US$ 200 milhões, com algumas franquias, como Call of Duty, atingindo até US$ 300 milhões. E os custos de marketing podem fazer com que o gasto total dobre.

Call of Duty Modern Warfare 2 (Crédito: Activision)

Uma desenvolvedora não identificada informou à CMA que os custos de uma de suas principais franquias atingiram US$ 660 milhões, com o marketing adicionando mais US$ 550 milhões, o que elevou o custo total para mais de US$ 1 bilhão.

Tudo isso acontece em um momento no qual a indústria enfrenta uma queda no ciclo médio do console. Os principais jogadores, que são aqueles que mais gastam, já possuem os consoles desta geração, enquanto os casuais estão aguardando uma redução de preço.

Além disso, a pandemia interrompeu o cronograma de lançamentos a ponto de títulos aguardados, como Grand Theft Auto VI, serem adiados para o próximo ano. A Sony passará 2024 sem grandes lançamentos de jogos originais.

À medida que os jogadores passaram a esperar experiências mais cinematográficas, os custos de desenvolvimento dispararam.

O problema predominante na indústria de games, no entanto, é o mesmo que impacta o setor de tecnologia como um todo. O aumento nas taxas de juros tornou muito mais difícil para as empresas acessarem financiamento.

Empresas públicas (ou seja, aquelas com ações negociadas na Bolsa de Valores) estão menos dispostas a assumir dívidas, enquanto as privadas viram o capital de risco praticamente secar (a menos, é claro, que estivessem trabalhando na área de inteligência artificial).

Para elas, isso torna as demissões inevitáveis. Já para as empresas públicas, as demandas dos acionistas por crescimento frequentemente resultam em movimentos que visam inflar as ações – e a redução de custos é a saída mais fácil.

Esta é uma tendência que não deve desaparecer no curto prazo. Com poucos grandes títulos no horizonte e mudanças nos modelos de negócios, os cortes e reestruturações devem continuar por vários meses.


SOBRE O AUTOR

Chris Morris é um jornalista com mais de 30 anos de experiência. Saiba mais em chrismorrisjournalist.com. saiba mais