Tecnologias inteligentes no varejo de alimentos: há muito espaço para crescer

Crédito: Fast Company Brasil

Fábio Cardo 5 minutos de leitura

As relações comerciais entre as indústrias e fornecedores de alimentos e as redes de varejo sempre seguiram (por décadas, séculos?) práticas bem definidas. Fornecedores oferecendo produtos pelo melhor preço, a partir de quantidades definidas. No lado do varejo, compradores buscando os preços mais baixos possíveis para poder atender as demandas e bolsos dos clientes e obter boa margem de lucro. 

Os inúmeros controles de vendas e de estoques partiam de experiências de cada varejista, para que pudessem planejar a reposição dos produtos e evitar gôndolas vazias e clientes desatendidos. Essa prática vem mudando ao longo dos anos com as novas tecnologias que integram todo o processo de transação dos produtos. No entanto, há um componente essencial nessa equação: o ser humano e suas práticas consolidadas de atuar nos processos manuais de compra e venda.

Há 23 anos, a Neogrid, empresa de tecnologia com muita experiência em varejo, atua no sentido de evangelizar indústrias e redes de varejo para que entendam como a tecnologia pode melhorar os negócios. O planejamento de reposição de produtos nas lojas com apoio de tecnologia não é uma atividade nova, tem décadas de existência. O nó está nos profissionais que ainda relutam na aceitação de dados preditivos baseados em inteligência artificial e big data.

Paulo Lucena, da Neogrid (Crédito: Divulgação)

Paulo Lucena, diretor comercial da empresa, aponta que o mercado tem, há décadas, todas as ferramentas para que as reposições sejam automáticas, prontas para serem executadas a partir de integrações entre os sistemas das lojas de varejo e dos fornecedores. Desta forma, garante que as demandas serão atendidas e o consumidor manterá sua boa experiência com as lojas. 

“Os compradores das redes de varejo que são medidos pela economia gerada no ato da compra, ou seja, melhores descontos, não acatarão o melhor pedido. Sempre buscam o benefício considerando valores e quantidades. Os compradores deveriam ser medidos também por melhor giro de estoques e não somente pela economia na compra”, afirma. 

Ele entende que há predisposição para mudanças em função da pandemia, que desacelerou os giros de estoques por falta de insumos e problemas nos fluxos logísticos. “As vantagens já estão sendo percebidas no varejo, é uma jornada. As empresas têm que evitar perdas e a digitalização dos pedidos é o primeiro passo”, avalia. A companhia identificou a redução de 80% nos erros de pedidos com a adoção dos processos de digitalização. Isso tem impacto na sustentabilidade, na maior lucratividade e na disponibilidade de produto no varejo.

No início da pandemia, a Neogrid teve que trabalhar com turnos para dar conta das solicitações de empresas que optaram pela digitalização de seus processos comerciais. O ecossistema de alimentos gera muita perda devido a erros no processo de venda sem a digitalização de pedidos, o que acaba gerando ônus de sustentabilidade – produtos que se perdem, transporte desnecessário, tempo para refazer processos. Custos ambientais e transtornos para todos. Isso foi percebido por muitas empresas no início de 2020.

O segundo passo tecnológico no processo de melhorar os fluxos de produtos entre fornecedores e varejo é o compartilhamento dos estoques e vendas em loja. Paulo indica que a inteligência deve ser aplicada para melhorar a qualidade dos pedidos, para que as lojas sejam mais inteligentes e para que os varejistas consigam oferecer novos mixes de produtos aos clientes.

INDÚSTRIA NA VANGUARDA

As grandes indústrias de alimentos hoje lideram as iniciativas de automação de pedidos, puxando o varejo. Por meio de estudos e pesquisas, conseguem subsidiar os lojistas com informações que ajudam a programar suas compras. O executivo ressalta que os três maiores varejistas nacionais têm acesso a tecnologias modernas, com camadas de colaboração, e estão na vanguarda. Prestam melhor serviço ao mercado.

A maior rede de varejo alimentar do Brasil, através do seu programa de relacionamento com fornecedores, adotou todo o processo de automação sustentado por soluções da Neogrid. A premissa é a colaboração de informações e o acompanhamento de indicadores.  Os fornecedores que estão no programa tiveram um resultado superior em relação ao outros: aumento de 16% no nível de serviço e redução de 42% na falta de produto na gôndola (ruptura de abastecimento e disponibilidade).

CONFIANÇA DAS REDES DE VAREJO REGIONAIS E ATACADISTAS É FATOR CRÍTICO PARA A MODERNIZAÇÃO DO SUPPLY CHAIN.

As redes de varejo regionais ainda são mais reticentes quanto a adoção de tecnologias que dependem de abrir suas informações. São muito tradicionais e praticam a compra por volume, controlando as quantidades junto a todos os fornecedores. Outro grupo que também ainda não abraçou a automação são os grandes atacadistas, que não veem com bons olhos compartilhar informações com empresas de gestão de tecnologia como a Neogrid.

Há exceções: empresas de alimentos de alto giro e marcas líderes são favorecidas. Com estas, os varejistas aceitam compartilhar dados para garantir o mix de produtos e evitar eventuais desabastecimentos. Têm total aderência para a automação.

Segundo Paulo, a tecnologia ajuda também a otimizar o trabalho dos promotores, reduzindo perdas e ajustando problemas pontuais no ponto de venda. A roteirização inteligente de promotores ajuda a melhorar o giro dos produtos e reduz perdas, principalmente de perecíveis. Para os consumidores, o primeiro benefício é não ter ruptura na aquisição de produtos, pela garantia da disponibilidade.

Um cliente da empresa varejista na Europa inovou e deu um passo à frente, adotando as tecnologias da Neogrid para gerar um selo verde junto a 1.400 fornecedores, que participaram do processo de comprovação da sustentabilidade. Eles foram convidados a apresentar diversos comprovantes sobre a quantidade de embalagens, práticas de descarte pós consumo e processos de produção para poderem receber o selo verde de sustentabilidade. 

Todos os que participaram da iniciativa passaram a ter condições diferenciadas nas relações comerciais com a empresa, com alguns benefícios, descontos e volumes de compras. Além de poderem usar o selo em seus produtos nas gôndolas, comprovando serem sustentáveis. O produto já qualificava o fornecedor. Somou-se a sustentabilidade ao perfil.

Boa dica para as empresas nacionais.


SOBRE O AUTOR

Fábio Cardo é economista de formação, atua em comunicação empresarial e empreendedorismo e é co-publisher do canal FoodTech da Fast Co... saiba mais