A IA generativa se espalhou por todo canto – inclusive onde nem precisamos

A inteligência artificial está em todos os lugares. Mas será que as pessoas realmente acham essa tecnologia útil?

Crédito: Google Deepmind

Chris Stokel-Walker 3 minutos de leitura

Vinte meses após o boom da IA generativa, chatbots como o ChatGPT ainda não encontraram um uso realmente revolucionário.E não por falta de tentativa. A inteligência artificial está em todos os lugares, de serviços bancários até drive-thrus de fast food. Segundo o Pew Research Center, um quarto da população dos EUA já usou o ChatGPT.

Mas ainda não está claro se as pessoas realmente acham essa tecnologia útil. Apesar de 25% dos norte-americanos já terem usado o chatbot da OpenAI pelo menos uma vez, apenas um em cada cinco o utiliza no trabalho. O grupo financeiro Goldman Sachs, que há 15 meses previa que a IA generativa aumentaria enormemente o PIB global e a produtividade, agora está menos otimista.

Embora existam algumas aplicações úteis – como ajudar a criar apresentações de PowerPoint modernas e enterrar de vez os cliparts dos anos 1990 –, a maioria das pessoas não está convencida de que um chatbot de IA é realmente necessário, por exemplo, no Facebook Messenger.

Estamos passando pela fase complicada da adoção de uma nova tecnologia, na qual grandes empresas gastam milhões – às vezes bilhões – de dólares para desenvolver suas próprias ferramentas ou investir em outras e precisam justificar todo esse investimento. 

E assim acabamos vendo produtos como a IA do LinkedIn, que sugere perguntas relacionadas às postagens no seu feed; ou o assistente Rufus AI, da Amazon, que incentiva os usuários a fazerem perguntas sobre produtos nos quais nunca demonstraram interesse; ou mesmo o novo assistente de anotações do Zoom, que é tão ruim que provavelmente seria demitido se fosse humano.

“Esse tipo de IA inútil acaba sendo extremamente irritante, porque pode estragar a experiência de visitar um site”, explica Catherine Flick, professora de ética da Universidade de Staffordshire, no Reino Unido. “As empresas estão tentando extrair o máximo possível desses modelos enquanto o hype ainda está alto.”

quanto menos satisfatória for a experiência com essas ferramentas, mais rápido os usuários se cansarão da IA.

Mesmo para startups, há um incentivo financeiro para adotar essa abordagem de IA em tudo. De acordo com a Crunchbase, o financiamento em startups de inteligência artificial dobrou no segundo trimestre.

“Ter IA no nome faz parecer que elas são incrivelmente sofisticadas, apesar de estarem oferecendo basicamente o mesmo que todas as outras”, observa Mike Katell, pesquisador de ética do Instituto Alan Turing.

Colocar inteligência artificial em tudo não afeta apenas a experiência do consumidor, causa um impacto significativo no clima. Ninguém sabe exatamente a extensão do problema – as empresas envolvidas não revelam –, mas dados sugerem que o cenário não é nada positivo. 

Uma estimativa aponta que o impacto ambiental do treinamento (não do uso) do GPT-3 foi de cerca de 500 toneladas de dióxido de carbono. Em 2022, antes do surgimento da IA generativa, a Gartner previu que as ferramentas de inteligência artificial acabariam consumindo mais energia do que toda a força de trabalho humana.

“Dentro da bolha tecnológica, a coisa mais importante do mundo é desenvolver mais IAs”, diz Margaret Mitchell, cientista-chefe de ética da Hugging Face, que cria ferramentas de inteligência artificial de código aberto.

“Fora dela, o fato de, por exemplo, as colheitas estarem morrendo devido às ondas de calor mais extremas já registradas é um pouco mais importante. Ironicamente, colocar IA em tudo piora a questão do aquecimento global. Mas eles têm ar-condicionado nessa bolha.”

    As empresas estão brincando com fogo ao lançar tantos produtos mal-acabados no mercado. “Estão tentando capitalizar ao máximo o fato de que as pessoas ainda não se cansaram totalmente disso”, afirma Flick. “As empresas ainda não sabem o que essa tecnologia realmente significa ou como lidar com ela de forma eficaz.”

    Mas quanto menos satisfatória for a experiência com essas ferramentas, mais rápido os usuários provavelmente se cansarão da IA – e isso pode acontecer muito antes de ela conseguir mostrar todo o seu potencial.


    SOBRE O AUTOR

    Chris Stokel-Walker é um jornalista britânico com trabalhos publicados regularmente em veículos, como Wired, The Economist e Insider saiba mais