Viral e fandom: por que você deveria conhecer a playlist da GenZ

Phonk, trap, agronejo. Novos estilos de música preferidos dos jovens refletem cultura de comunidade e conexão com redes sociais

Créditos: Aliane Schwartzhaupt/ Unsplash/ Cicero Castro/ iStock

Camila de Lira 5 minutos de leitura

Sucessos de artistas como Veigh, Mc Cabelinho, Mc Ryan SP, Kevin, o Cris, Luan Pereira e Ana Castela têm um ponto em comum: o público. Com audiência majoritariamente de jovens com menos de 25 anos, os artistas brasileiros ganham força dentro e fora do país.

Trap, funk bruxaria, phonk, agronejo, brega. A ascensão desses estilos musicais streamings brasileiros reflete dois fenômenos que a geração Z conhece muito bem: a viralização nas redes sociais e a criação de comunidades.

A rede social é ferramenta de experimentação para a geração Z.

Segundo o Spotify Brasil, o trap e o phonk – gêneros que trazem uma variação do hip-hop e do funk – estão em 67% das playlists de membros da geração Z do Brasil. Já o “agronejo”, que mistura funk, brega e sertanejo, é o estilo de quatro dos dez artistas mais escutados no país na plataforma. 

Com músicas curtas, de batida forte e pegada eletrônica, os hits preferidos pela geração Z são perfeitos para viralizar. “O beat agressivo e sintetizado tem alto potencial de viralização”, diz Rodrigo Azevedo, editorial lead do Spotify Brasil.

Os refrões repetitivos e curtos funcionam nos cortes de um minuto do TikTok, além de permitirem as coreografias simples que viralizam na rede. Um exemplo é a música “Desenrola, bate, joga de ladim”, funk do grupo Os Hawaianos.

Em pesquisa feita pela MRC Data, 67% dos usuários do TikTok dizem procurar músicas e artistas depois de escutá-las em vídeos curtos. Há também o lado da viralização, que transforma a audiência em criadora de conteúdo. Afinal, quem está produzindo os vídeos de dança se não o próprio usuário?

A rede social é ferramenta de experimentação para a geração Z”, diz Luiz Menezes, fundador da consultoria Trope.

EM BUSCA DA VERDADE

Feitos por fãs ou apenas por ouvintes, os vídeos criam uma forma de reciprocidade entre quem escuta e quem produz a música. A popularidade do artista se torna a popularidade do criador de conteúdo que usa a canção, em um ciclo rápido. É como se todos passassem a fazer parte da carreira dos artistas preferidos.

A viralização leva os artistas para fora das nossas fronteiras. O hit de phonk de Bibi Babydoll liderou o ranking de mais escutadas na Ucrânia no meio do ano. Tudo graças a uma coreografia que fez sucesso no TikTok. Até mesmo entre os russos a música se tornou uma das mais pesquisadas no aplicativo Shazam.

Outro fator que apoia a viralização é a “autenticidade” – outra palavra-chave, ou melhor, hashtag, para a GenZ. Em 2018, a McKinsey chamou os nascidos entre 1995 e 2010, a primeira geração de nativos digitais, de “true gen”: o grupo que procura pela “verdade” por detrás das experiências e marcas.

Não é incomum que artistas do trap e do funk cantem sobre suas origens periféricas, falando sobre o dia a dia da favela. Um cotidiano nada romantizado, com as festas, as amizades, os amores e as inseguranças.

Muitos se veem representados nessas letras e criam conteúdo sobre as músicas de bom grado. É uma forma de autorrepresentação. “A audiência vê que são pessoas semelhantes a ela, que estão ocupando os espaços”, diz Menezes.

FAM-CAM PARA TODOS

Outro tipo de música que está no top 10 dos jovens brasileiros é o k-pop. O pop coreano de grupos como BTS e Blackpink é exemplo quando o assunto são as comunidades online de fãs, os "fandoms".

O fandom é uma subcultura de fãs que se conectam por causa de um gosto em comum. Na prática, são grandes grupos de pessoas, de países diferentes, dedicadas a “adorar” certos artistas.

O termo costumava ser usado para fãs de obras de ficção que não só amam aquilo que assistem ou leem, como também se engajam em fóruns, escrevem fanfics (histórias de ficção publicadas online), criam fan-arts e chegam até a fazer cosplays.

A forma de demonstrar o amor pelos artistas são as redes sociais. Os fandoms usam fóruns como o Reddit ou perfis no X (ex-Twitter) para compartilhar discussões, fotos e vídeos dos artistas de que gostam.

Mais importante do que o conteúdo criado, esses grupos de fãs também são responsáveis por ações em massa nas plataformas, como quando fazem de tudo para que os novos clipes de seus artistas preferidos cheguem a mais de um milhão de visualizações em poucas horas.

A ação em massa também funciona no momento de cobrar os artistas. “Os fãs pedem esclarecimento, cobram a gravadora e os empresários quando algo ocorre. É uma legião movida por causas, o que gera ainda mais conexão”, comenta Menezes.

No Brasil, o fandom do BTS se movimenta em ações digitais em favor da preservação da Amazônia e de campanhas para que os fãs tirem título de eleitor.

Os fandoms usam fóruns como o Reddit ou perfis no X/ Twitter para compartilhar discussões, fotos e vídeos dos artistas de que gostam.

O ARMY, nome do fandom da banda coreana BTS, é tão poderoso que influenciou a criação de uma plataforma de conteúdo própria para a indústria do k-pop, a Weverse.

A companhia que criou o app e gerencia os artistas, a Hybe, foi nomeada como uma das empresas mais inovadoras da Fast Company no ano passado. Por meio do aplicativo, que chegou a 6,8 milhões de usuários mensais ativos, o BTS manda conteúdos exclusivamente para os fãs. 

Artistas brasileiros também têm os seus fandoms. Fãs da Anitta fizeram campanha para a artista ocupar o primeiro lugar da parada internacional do Spotify, com a música "Envolver". Já a turma da Ludmilla fez mutirão de doação de sangue no Rio de Janeiro para conseguir ingressos mais baratos da turnê Numanice.

A voracidade da geração Z quando se trata de música atrai, e muito, a indústria. “A geração Z é nossa rockstar. São eles que moldam a indústria musical”, afirma Renata Lodi, head de marketing do Spotify para a América Latina.

Para além da receita gerada, a GenZ nos ensina muito sobre os meandros da cultura digital.


SOBRE A AUTORA

Camila de Lira é jornalista formada pela ECA-USP, early adopter de tecnologias (e curiosa nata) e especializada em storytelling para n... saiba mais