Por que ainda se espera que mulheres sejam as “mães” do escritório

À medida que as mulheres sobem na carreira, espera-se que elas passem dos trabalhos de cuidado administrativos para os emocionais e interpessoais

Crédito: Anton Vierietin/ iStock

Sophie Williams 4 minutos de leitura

Os fãs que acompanham o reality show "Keeping Up with the Kardashians" sabem que Kris Jenner se autonomeou "momager", uma função híbrida entre mãe e gestora das vidas pessoais e profissionais de sua família.

No caso de Kris, ela claramente gosta de sua posição de mãe e gerente. Mas o que acontece com as mulheres nos negócios quando o título de mãe, ou de "mãezona do escritório", se torna uma expectativa, em vez de uma escolha?

Você provavelmente já ouviu falar nas "tarefas domésticas do escritório", que englobam tudo, desde atender telefones até fazer as anotações das reuniões ou os pedidos de almoço.

Essas tarefas são essenciais para manter uma empresa funcionando, embora não façam parte formal da descrição do cargo de ninguém. E, geralmente, elas não são levadas em consideração quando se trata de discussões sobre aumentos salariais ou promoções. 

Essas também são tarefas que, como todo mundo sabe, as mulheres assumem com mais frequência, além das suas obrigações profissionais. Pesquisas demonstraram que as mulheres assumem muito mais tarefas domésticas de escritório nas empresas do que os homens – e, geralmente, não é porque elas querem.

TRABALHO EMOCIONALMENTE DESGASTANTE

As mulheres que estão entrando no mercado de trabalho percebem que se espera que elas assumam toda uma série de responsabilidades de cuidado e de atenção não ditas e não reconhecidas, partindo do pressuposto de que ser mulher no ambiente profissional é ser cuidadora.

Mesmo quando olhamos para além dos cargos de nível básico, para as mulheres mais experientes – aquelas que romperam o "teto de vidro" para assumir os cargos mais altos nas empresas –, é frustrante ver que, em geral, nem sempre elas conseguem escapar da expectativa de cuidar dos outros na vida profissional.

Ao contrário de seus colegas homens, as mulheres, mesmo em cargos de alta liderança, ainda são alvo de uma série de expectativas ocultas, que vão além de suas funções. À medida que elas sobem na carreira, a forma como se espera que desempenhem o papel de "mãe" muda, passando do administrativo para o emocional e o interpessoal.

as mulheres assumem muito mais tarefas domésticas de escritório nas empresas do que os homens – e, geralmente, não é porque elas querem.

As mulheres na liderança trabalham duas vezes mais pela diversidade, equidade e inclusão (DEI) do que seus colegas homens, apesar de isso aparentemente não trazer nenhum benefício pessoal ou profissional direto para elas.

As altas executivas também são mais propensas do que os homens a serem ativas como líderes focadas em pessoas, pois dedicam mais tempo a "tomar medidas consistentes para promover o bem-estar dos funcionários”.   

Não há como negar que esse trabalho é valioso, mas consome muito tempo e é emocionalmente desgastante. Essas tarefas adicionais de cuidado e gerenciamento do bem-estar, implicitamente esperadas das líderes, são ignoradas nas negociações sobre remuneração ou reconhecimento. Com tudo isso em vista, não é de se admirar que  43% das mulheres líderes relatem ter sofrido esgotamento no trabalho.

DIVISÃO IGUALITÁRIA DE TAREFAS

Se você é uma mulher trabalhadora, é bem provável que nada disso seja surpresa. Provavelmente, você já vivenciou essa dinâmica de gênero desequilibrada no trabalho e já presenciou o desenrolar das experiências de suas amigas e colegas, com outras pessoas atribuindo essas tarefas menos desejáveis a elas, em vez de se oferecerem para fazê-las.

Mas o que as mulheres podem fazer para sair do papel de "mãe" no trabalho quando isso é imposto a elas?

Uma maneira de se opor a essa expectativa é estar atenta e falar sobre o hábito de atribuir e de assumir esse tipo de tarefa. Se estiver em posição de distribuir as tarefas, certifique-se de que está considerando as mulheres da equipe para mais do que as tarefas de manutenção de menor importância necessárias para manter uma empresa em funcionamento.

Certifique-se de que elas também desempenhem funções que lhes permitirão crescer, desafiar a si mesmas, assumir responsabilidades adicionais e desenvolver novas habilidades. Coloque-as em espaços para interagir com líderes seniores, o que pode levar a aumentos salariais e oportunidades de promoção.

Escolha os homens da sua equipe também para tarefas menos glamourosas, como tomar notas em reuniões ou orientar os novatos na empresa. Se esse trabalho é essencial, deve ser distribuído de forma razoável entre todos os membros do time. 

Por fim, eu pediria às empresas que reavaliassem o valor das habilidades interpessoais no ambiente profissional e reconhecessem a importância dessas características, geralmente pouco valorizadas, mas que são muito importantes para o sucesso.

As altas executivas são mais propensas do que os homens a serem ativas como líderes focadas em pessoas.

Trabalhar com um líder que demonstra empatia permite que as pessoas sejam mais inovadoras, sonhem mais alto e assumam mais riscos na esperança de obter melhores resultados. 

Com isso em vista, as empresas devem começar a se preocupar com os comportamentos e valores que estimulam no ambiente profissional e com a melhor forma de reconhecer e recompensar aqueles que se superam de maneiras que até agora não foram valorizadas.  

Quando esperamos que as mulheres não apenas sejam excelentes profissionalmente nas funções para as quais foram contratadas, mas também assumam funções invisíveis (e não recompensadas) de cuidado com os outros, estamos fazendo com que elas fiquem esgotadas e saiam das empresas que poderiam ter se beneficiado mais com seus talentos.


SOBRE A AUTORA

Sophie Williams é palestrante e autora do livro "The Glass Cliff: Why Women in Power are Undermined and How to Fight Back" (Penhasco d... saiba mais